A nossa segunda peça é o Orfeu (1607) de Cláudio Monteverdi (1567-1643): foi durante anos considerada a primeira ópera e embora agora se saiba que não foi assim, continua a ser considerada importante. Vários elementos estiveram por base desse novo género musical: o teatro medieval (que por vezes era cantado), as pastorelas e madrigais que eram compostos de forma a contar uma história e um esforço deliberado de tentar imitar o antigo teatro grego; tudo isso deu origem a uma nova forma de arte, no qual um libretista escrevia a estória (nós diríamos o argumento) com as falas que era musicada pelo compositor. Monteverdi adaptou o modelo, incluiu uma verdadeira orquestra e não alguns músicos de acompanhamento (tinha recursos para isso na corte de Mântua), e a sua popularidade adquirida em outros géneros permitiu-lhe fazer mais algumas (já em Veneza). Orfeo conta a estória do mito grego de Orfeo e Eurídice: ela morrera e ele um mestre da música desce aos infernos onde consegue comover Hades (senhor dos infernos) a deixá-la partir embora o senhor dos mortos põem como condição de que ele não olhe para trás a confirmar que ela o segue; ele concorda mas mais tarde por não ouvir os seus passos, não resiste e ela desaparece de vez .
Entretanto o género (que surgira em Florença) foi-se difundindo nos anos seguintes em Roma onde os eclesiásticos patrocinavam o novo estilo. Nesses primeiros anos, as óperas eram pagas por um mecenas que encomendavam a peça para comemorar um acontecimento importante (subida ao trono, casamento, etc) que podia ser aberto ao público ou unicamente representado perante um pequena assembleia; uns anos depois os Venezianos pragmaticamente resolveram o problema dos mecenas, permitindo o acesso do público ao teatro onde seria representada a ópera em troca de um pagamento. As óperas variavam de acordo com as tradições culturais: maior importância à música e subordinação do libreto (que era um mero pretexto para efeitos líricos) ou pelo contrário era realçada a estória, sendo a música apenas um acompanhamento; quando existissem meios, era utilizadas máquinas para fazer efeitos cénicos e encenações que espantassem os espectadores (efeitos especiais como agora se diz).
quarta-feira, março 31, 2004
segunda-feira, março 29, 2004
Veneza-III
Quando chegamos ao séc. XI, Veneza já é uma potência com que é preciso contar no Mediterrâneo; as cruzadas ampliaram enormemente a sua esfera de acção: só Veneza podia dispor de uma frota consistente para transportar homens e víveres (sendo paga com privilégios nos novos estados, ditando a política desses reinos ou recebendo territórios). A IV cruzada, que se pode considerar um terrível crime contra a cultura (uma cruzada desviada para atacar uma cidade cristã que fora um baluarte do cristianismo como pagamento de dívida), representou para Veneza uma fantástica benesse: livraram-se de um rival, apanharam partes do seu império e embelezaram a sua cidade (os cavalos da Basílica de S. Marcos vieram de Constantinopla), dando-lhe o toque oriental e exótico em relação às outras cidades italianas (pronto, a influência já vinha de trás e manteve-se); ficaram também com uma fama de traiçoeiros de que nunca se livraram. Em rivalidade com Génova, espoliaram o novo Império restaurado, contribuindo para a ascensão dos turcos; quando estes transformaram a cidade milenar em Istambul, Veneza começa a preparar a retirada: combatendo a cada passo, vai aumentando o seu território na terra ferma (entre vitórias e derrotas), competindo com outros estado italianos, com o Papado, o Império, a França... Se não consegue fazer a unificação (mas provavelmente nunca esteve nos seus planos), perdendo o seu império comercial e colonial, obtém uma última esplêndida vitória em Lepanto em 1571; provavelmente inútil, e apenas simbólica, pois os turcos estavam a perder o fôlego das conquistas devido a transformações sociais e mentais no seu império que estavam a provocar uma estagnação), mas que deu um enorme alívio e orgulho à Europa da época (pois já não podemos falar de Cristandade). A perca da Cândia em 1669 representa o último estertor do estado marítimo. E no entanto, dois séculos depois, quando as tropas de Napoleão invadem o Veneto, as tropas recrutadas combatem ao grito de “Marco, Marco” e a população recebe silenciosa os anúncios de libertação com a igualdade e liberdade e fraternidade, sinal de que o patriotismo Veneziano mantinha-se. Em 1849, depois de um longo cerco, a recém formada república Veneziana, rendia-se depois de meses de cerco às tropas austríacas; em 1866 entrava para o reino de Itália.
sexta-feira, março 26, 2004
Solução para o despovoamento do interior!
(Foi-me enviado por e-mail)
Do Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo
SENTENÇA PROFERIDA EM 1487 NO PROCESSO CONTRA O PRIOR DE TRANCOSO
(Autos arquivados na Torre do Tombo, armário 5.o,maço 7)
Padre Francisco da Costa, prior de Trancoso, de idade de sessenta e dois anos, será degredado de suas ordens e arrastado pelas ruas públicas nos rabos dos cavalos, esquartejado o seu corpo e postos os quartos, cabeça e mãos em diferentes distritos, pelo crime que foi arguido e que ele mesmo não contrariou, sendo acusado de ter dormido com vinte e nove afilhadas e tendo delas noventa e sete filhas e trinta e sete filhos; de cinco irmãs teve bdezoito filhas; de nove comadres trinta e oito filhos e dezoito filhas; de sete amas teve vinte e nove filhos e cinco filhas; de duas escravas teve vinte e um filhos e sete filhas; dormiu com uma tia, chamada Ana da Cunha, de quem teve três filhas, da própria mãe teve dois filhos.
Total: duzentos e noventa e nove, sendo duzentos e catorze do sexo feminino e oitenta e cinco do sexo masculino, tendo concebido em cinquenta e três mulheres.
Agora vem a melhor:
El-Rei D. João II lhe perdoou a morte e o mandou por em liberdade aos dezassete dias do mês de Março de 1487, com o fundamento de ajudar a povoar aquela região da Beira Alta, tão despovoada ao tempo e guardar no Real Arquivo da Torre do Tombo esta sentença, devassa e mais papéis que formaram o processo.
Jogo musical-I
Bem, cá vai então o divertimento musical. Regularmente, escolherei uma obra musical que (até totalizar 10) considero das mais relevantes do milénio (logo desde o ano 1000 até 2000). Serão músicas que considero importantes para a sua época (critério subjectivo), tanto porque representam o espírito do seu tempo, ou pelo contrário, representarem um corte. O que significa que os compositores “geniais” do costume não estarão representados (Bach, Mozart, Beethoven, Schuman, Verdi, Wagner, etc). Estarão representados diferentes estilos de música e embora metade seja da música dita erudita (por razões cronológicas), a música do séc. XX representará a outra metade, dada as modificações rápidas e variedade de estilos musicais. Deveria colocar fragmentos das peças, mas infelizmente não percebo quase nada de informática e portanto vou (quando encontrar) colocar links com samples das músicas. Chamaram-me (e com pertinência creio eu) a atenção para o facto de metodologicamente ser errado misturar música barroca com rock (digamos Chopin e Elvis Presley) e portanto deveria ser coerente e manter-me só na música erudita. Só que como isto não é um estudo académico, é apenas um blog sem pretensões, creio que posso dar-me ao luxo de estipular as regras do que escrevo.
Bem, começando o primeiro vai ser a Messe de Notre Dame de Guillaume de Machaut (1300-1377). Este foi um clérigo francês; como pessoa instruída, privou de perto com a alta nobreza da época (na corte francesa) onde serviu como funcionário, compôs poemas, canções profanas e religiosas. É considerado o expoente máximo da ars nova (tirado do nome de um tratado do séc. XIV). Este tipo de música era polifónica (o que não era novidade) mas explorava de forma mais aprofundada as suas potencialidades em relação à arte antiga. Ora a missa de Notre Dame, possuía uma preocupação de unidade nas várias partes da missa que a tornava efectivamente uma obra só (e não várias peças “cosidas” umas às outras sem ligação entre si, como continuou a ser em grande parte, e se forem a uma missa actualmente, ainda é). Existem outras subtilezas musicais que tornam a peça fora do vulgar mas deixo-as para os que compreendem de música pois a peça é em sí belíssima .
Bem, começando o primeiro vai ser a Messe de Notre Dame de Guillaume de Machaut (1300-1377). Este foi um clérigo francês; como pessoa instruída, privou de perto com a alta nobreza da época (na corte francesa) onde serviu como funcionário, compôs poemas, canções profanas e religiosas. É considerado o expoente máximo da ars nova (tirado do nome de um tratado do séc. XIV). Este tipo de música era polifónica (o que não era novidade) mas explorava de forma mais aprofundada as suas potencialidades em relação à arte antiga. Ora a missa de Notre Dame, possuía uma preocupação de unidade nas várias partes da missa que a tornava efectivamente uma obra só (e não várias peças “cosidas” umas às outras sem ligação entre si, como continuou a ser em grande parte, e se forem a uma missa actualmente, ainda é). Existem outras subtilezas musicais que tornam a peça fora do vulgar mas deixo-as para os que compreendem de música pois a peça é em sí belíssima .
quarta-feira, março 24, 2004
Veneza-II
A passagem de Atila (d.C. 453) costuma ser apresentado como o elemento catalizador: as populações da zona ter-se-iam refugiado na laguna, estabelecendo-se definitivamente. Temos uma carta de Cassiodoro prefeito do Pretório (séc. VI) dirigido aos tribunos marítimos da zona.
Com as invasões dos lombardos (568), uma nova vaga de habitantes das zonas das zonas de terra firme fixam-se. De fundamental importância é a emigração também do Patriarca de Aquileia para uma das lagunas; manteve-se o hábito de escolher um sucessor na nova residência, embora as autoridades lombardas (e depois francas) nomeassem um novo patriarca para Aquileia: o futuro espaço de Veneza obtinha assim a sua autonomia religiosa, rompendo com as autoridades religiosas “continentais”; o roubo de Alexandria das relíquias de S. Marcos por 2 mercadores Venezianos em 828 fez o resto. Bizâncio entretanto, perdera grande parte das possessões italianas ficando reduzida a algumas cidades; Veneza estava na sua esfera de obediência (os primeiros doges foram exarcas nomeados ou pelo menos reconhecidos pelo Imperador), embora os seus conflitos entre o Império Carolíngio faria esse domínio variar. O domínio sobre a terra ferma, é visto como sendo uma das bases económicas que lhes deu capital que seria rapidamente investido no comércio; ao enfrentarem os piratas eslavos e apoiarem as populações latinas da Dalmácia, acabaram por tornar-se aliados e receber privilégios de Bizâncio (diminuição das taxas, exclusivo de comércio de certas zonas, jurisdição privada), tentando não enfurecer o Sacro-Império (que era o que possuía o domínio terrestre).
Com as invasões dos lombardos (568), uma nova vaga de habitantes das zonas das zonas de terra firme fixam-se. De fundamental importância é a emigração também do Patriarca de Aquileia para uma das lagunas; manteve-se o hábito de escolher um sucessor na nova residência, embora as autoridades lombardas (e depois francas) nomeassem um novo patriarca para Aquileia: o futuro espaço de Veneza obtinha assim a sua autonomia religiosa, rompendo com as autoridades religiosas “continentais”; o roubo de Alexandria das relíquias de S. Marcos por 2 mercadores Venezianos em 828 fez o resto. Bizâncio entretanto, perdera grande parte das possessões italianas ficando reduzida a algumas cidades; Veneza estava na sua esfera de obediência (os primeiros doges foram exarcas nomeados ou pelo menos reconhecidos pelo Imperador), embora os seus conflitos entre o Império Carolíngio faria esse domínio variar. O domínio sobre a terra ferma, é visto como sendo uma das bases económicas que lhes deu capital que seria rapidamente investido no comércio; ao enfrentarem os piratas eslavos e apoiarem as populações latinas da Dalmácia, acabaram por tornar-se aliados e receber privilégios de Bizâncio (diminuição das taxas, exclusivo de comércio de certas zonas, jurisdição privada), tentando não enfurecer o Sacro-Império (que era o que possuía o domínio terrestre).
segunda-feira, março 22, 2004
Temas- Veneza
Durante os próximos meses vou abordar unicamente dois temas, porque creio que são merecedores de tal. O primeiro será a cidade de Veneza, e o segundo um pequeno jogo musical. Veneza verá abordada a sua história, cultura, mas também a imagem que deixou no imaginário ocidental. O jogo musical consistirá na escolha de 10 obras musicais que considero importantes do milénio; explicarei como vai decorrer assim que começar. E hoje começo com Veneza.
A paisagem de Veneza é singular: a cidade parece emergir da água e se lhe acrescentarmos a bruma que paira mesmo em dias de sol, obtemos uma atmosfera verdadeiramente original. Escritores, pintores e cineastas celebraram a sua beleza, e os panfletos turísticos mantém a fama de cidade requintada juntamente com o seu Carnaval. Mas tudo isso tem uma origem material, e é isso que iremos tentar ver.
O local, embora belo, é muito pouco convidativo para a vida humana, sem os meios modernos tecnológicos: pântanos, pouca variedade de recursos (sal, peixe), longe de todos os centros urbanos que interessam; é fácil ver as vantagens que a cidade poderia ter um dia para beneficiar (mas locais assim existem muitos), mas na realidade foi o esforço dos seus habitantes que a tirou do anonimato. Os primitivos habitantes da zona chamavam-se venetos (e deram origem o nome ao Veneto). Esse nome, curiosamente é bastante comum nos indo-europeus: existiu um grupo celta, outro germano e outro eslavo (li uma explicação perfeitamente plausível mas que é só uma hipótese). Ocupados por Roma, foram perfeitamente romanizados, e viram Aquileia tornar-se a cidade mais importante da região no baixo-império (para quem viu o filme “A mulher falcão”, era a cidade do Bispo- termo errado, pois a cidade era sede de patriarcado).
A paisagem de Veneza é singular: a cidade parece emergir da água e se lhe acrescentarmos a bruma que paira mesmo em dias de sol, obtemos uma atmosfera verdadeiramente original. Escritores, pintores e cineastas celebraram a sua beleza, e os panfletos turísticos mantém a fama de cidade requintada juntamente com o seu Carnaval. Mas tudo isso tem uma origem material, e é isso que iremos tentar ver.
O local, embora belo, é muito pouco convidativo para a vida humana, sem os meios modernos tecnológicos: pântanos, pouca variedade de recursos (sal, peixe), longe de todos os centros urbanos que interessam; é fácil ver as vantagens que a cidade poderia ter um dia para beneficiar (mas locais assim existem muitos), mas na realidade foi o esforço dos seus habitantes que a tirou do anonimato. Os primitivos habitantes da zona chamavam-se venetos (e deram origem o nome ao Veneto). Esse nome, curiosamente é bastante comum nos indo-europeus: existiu um grupo celta, outro germano e outro eslavo (li uma explicação perfeitamente plausível mas que é só uma hipótese). Ocupados por Roma, foram perfeitamente romanizados, e viram Aquileia tornar-se a cidade mais importante da região no baixo-império (para quem viu o filme “A mulher falcão”, era a cidade do Bispo- termo errado, pois a cidade era sede de patriarcado).
sábado, março 20, 2004
Jardins & Muralhas à moda do Porto
Acerca do planeamento paisagístico da cidade do Porto, já nos inícios do século XVII a Administração Local e o próprio chefe da guarda da cidade tentaram demover o Rei, na altura Filipe II de Portugal (Felipe III de Espanha), no sentido de não fazer um certo jardim hoje chamado da Cordoaria, com a desculpa que qualquer exército, assaltante ou elemento não desejado na cidade poderiam subir pelas árvores para saltar a muralha. É preciso lembrar que naquele tempo a cidade se estendia apenas à Cordoaria (perto do Tribunal (e Cadeia) da Relação do Porto - Instituto Português de Fotografia) e que a actual Praça da Liberdade (não confundir com Avenida dos Aliados) se chamava Pátio das hortas, por ser onde se situavam as hortas extra-muros. Ter-se-ia de esperar mais de cem anos até aos Almadas abrirem a cidade ao Termo e Arrabaldes, como pode evidenciar a rua homónima.
quinta-feira, março 18, 2004
Novo blog
Bem, juntamente com o Filipe do Respublica e com o Marcos do Arqueoblogo vou passar a colaborar no blog Roma Antiga. Durante uns tempos irei sobretudo "transferir" posts relevantes do Tempore para o Roma Antiga, até ter material novo; logo o Tempore não terá mais coisas sobre Roma (mas sobre Bizâncio sim!).
E queria agradecer ao J do Cruzes Canhoto por ter colocado a lista de links de blogs no fim da página (uma lacuna que há muito teria sido preenchida... se eu soubesse como).
Como vou usar outro nome no Roma antiga, tentem descobrir qual deles sou pelo estilo de escrita!
E queria agradecer ao J do Cruzes Canhoto por ter colocado a lista de links de blogs no fim da página (uma lacuna que há muito teria sido preenchida... se eu soubesse como).
Como vou usar outro nome no Roma antiga, tentem descobrir qual deles sou pelo estilo de escrita!
quarta-feira, março 17, 2004
Germanização
A Polonia na segunda guerra mundial tinha uma elevada percentagem de alemães (e Judeus), que estavam moderadamente integrados: falavam polaco (sabendo um pouco de alemão como os descendentes dos nossos emigrantes em França), eram cidadãos polacos, mas tinham ascendência alemã que os definia como tal. Ora os nazis decidiram "recuperar" esse sangue para a grande nação. A maioria aliás era "mestiça", mas desde que tivessem características arianas podiam ser aproveitados (a percentagem de sangue aceite variava conforme os casos: 50%, 25%, 12%...). Essa gente deveria passar por um processo de "reeducação" antes de ser integrada na alemanha. Se apresentassem obstáculos os seus filhos deveriam ser-lhes retirados e educados por casais alemães estéreis (isto provocou um verdadeiro drama no final da guerra, com gente a tentar recuperar os seus filhos raptados). Terras onde não estivessem alemães mas historicamente tivessem existido povos germânicos deveriam (no caso de apresentar sinais de elementos arianos) passar pelo mesmo processo (estava incluído o nosso Minho devido aos Suevos). Vários dos governantes polacos que se opunham a eles eram de origem alemã (um dos comandantes do exército polaco que lhes fez a vida negra chamava-se... Rommel!). Isso convenceu os nazis de que os líderes de origem ariana de outros países eram o principal obstáculo ao seu domínio (Reino Unido, E.U.A.) e daí a necessidade de os recuperar (no caso dos soviéticos já não perderam muito tempo a tentar racionalizar as coisas desse modo).
Por pura curiosidade: Hitler admirava as capacidades dos soldados franceses (mas achava os oficiais uma calamidade) e Himmler tinha planos de a longo prazo, depois de um processo de "aculturação" incluír a França no Reich de pleno direito, como cidadãos alemães (uma vez retirados os seus elementos decadentes latinos).
Por pura curiosidade: Hitler admirava as capacidades dos soldados franceses (mas achava os oficiais uma calamidade) e Himmler tinha planos de a longo prazo, depois de um processo de "aculturação" incluír a França no Reich de pleno direito, como cidadãos alemães (uma vez retirados os seus elementos decadentes latinos).
sexta-feira, março 12, 2004
Links
No blog do alex temos um link relacionado com um post que fiz recentemente sobre a Madame de Pompadour. É um pretexto para falar da vida da corte no período final do absolutismo de uma forma muito "doce": música, festas, palácios, roupas luxuosas, quadros e jóias e uma homenagem a Pompadour. Como se de um filme se tratasse.
quinta-feira, março 11, 2004
Hooch
Há uns anos atrás vi uma curta-metragem (creio que no programa onda-curta, ou então a minha memória está a pregar-me partidas) chamada "O Mestre Flamengo". Era uma estória simples e despretenciosa mas com uma notável ironia, que vertia a paixão de uma jovem por um quadro na national gallery (e que mais tarde conseguia entra no quadro- ok, dito assim pode parecer ridículo, mas há filmes que só podem ser devidamente apreciados se vistos). Este era "uma mulher a beber com dois homens e uma criada" de Peter Hooch. Embora apreciado, é considerado nitidamente inferior a Vermeer seu contemporâneo. Pessoalmente também prefiro Vermeer, mas acho que Hooch tem alguns quadros que são verdadeiras obras-primas, e este é um deles.
quarta-feira, março 10, 2004
Os Franciscanos
Segunda uma lenda apócrifa, S. Francisco ter-se-ia deslocado a Portugal em 1214 e fundado a primeira comunidade Franciscana. Mais provavelmente, teria sido no final dessa década que teriam vindo Franciscanos espanhóis. O prestígio e forma de vida asseguraram-lhes um êxito rápido: vivendo pobremente, instalando-se nas cidades ou arredores e misturando-se com o povo mais pobre formavam um forte contraste com os membros das ordens tradicionais (beneditinos) ou com o clero secular (bispos, cabido). Ora este que também vivia nas cidades não viu com bons olhos os novos rivais: sendo preferidos, recebiam as esmolas, as doações testamentárias, os pagamentos pelas missas, etc, etc. Daí terem os Franciscanos sido atacados e excomungados em diversas cidades onde se tentaram instalar, sendo acusados de serem ladrões, vadios e heréticos disfarçados. Sendo o apoio do Papa e do Rei muito longínquo, o seu principal auxílio veio dos burgueses e populações locais que por devoção sincera e como forma de contrariar os seus senhores, prestou o seu apoio. Com o passar dos anos, a situação foi-se resolvendo: esferas de competência foram estabelecidas e uma situação de entendimento foi-se acordando. Mas os próprios Franciscanos tinham mudado. Sucessivas dispensas papais, tinham-nos liberto das exigências do fundador (que aliás já tinham sido “suavizadas” na regra com o estabelecimento da Ordem) tornando-se em mais uma ordem abastada e levando a criar um reportório de estórias com frades gordos. No entanto alguns quiseram manter-se fiéis ao espírito original da ordem, recusando o fausto. No séc. XIV os menoritas (quem leu o nome da Rosa reconhece bem o nome) acabaram por ter de lutar pelo seu “direito” à pobreza, sendo apelidados de heréticos sofrendo perseguições e protecção conforme os interesses políticos (originando ou misturando-se por vezes com grupos à margem da ortodoxia). No séc. XV receberam o nome de observantes (em contraste com os conventuais). Mais grupos iriam surgir em seguida.
segunda-feira, março 08, 2004
sexta-feira, março 05, 2004
Haiti
Quem anda mais atento aos noticiários já deve ter ouvido as queixas do ex-presidente do Haiti, Jean-Bertrand Aristide, sobre a forma pouco cortez como os Estados Unidos o terão "despachado" do país.
Se Aristide foi ou não metido à força num avião, a meio da noite, não faço ideia - embora possa quase jurar que vi um sorrisinho trocista na boca de Donald Rumsfeld quando ele negou que os EUA tivessem obrigado o homem a ir embora.
Há, no entanto, uma coisa que posso garantir: os americanos estão muito habituados a lidar de uma forma...hum...digamos, pouco simpática com os líderes do Haiti.
Para exemplificar, vou só relatar uma das muitas histórias dos quase vinte anos (1915-34) em que os EUA controlaram directamente o país. Se ela aconteceu exactamente assim ou não, é secundário. O que interessa aqui é que ela ilustra a forma "desinibida" como os marines orientavam os assuntos locais.
Logo no início da presença militar norte-americana, em 1915, Washington quis dar uma cobertura legal à ocupação do Haiti. Fez-se (no Departamento de Estado, claro está) um tratado entre os dois países, que concedia aos EUA controlo sobre as finanças, as alfândegas e a polícia haitianas. Ou seja, tudo o que importava. O acordo era válido por dez anos, e renovável por outros dez, se qualquer uma das partes assim o desejasse. Como se já não fosse suficientemente seguro, ainda dava aos americanos o direito de intervirem militarmente em caso de incumprimento.
Ora, o problema com estes tratados é que têm de ser assinados pelas duas partes. E, neste caso concreto, o então presidente do Haiti, Philippe Dartiguenave, não estava com muita vontade de assinar. O senhor em causa até tinha sido escolhido a dedo (os marines tinham "supervisionado" a votação na Assembleia Nacional, e nem sequer se deram ao trabalho de esconder as baionetas), mas ele lá deve ter achado que o que é demais, é demais...
Bem, mas, como se costuma dizer, «a espada é mais forte do que a pena». O major Smedley Butler, um marine que já era uma lenda viva entre os seus camaradas, foi enviado para obter a necessária assinatura. O que aconteceu a seguir, ninguém sabe ao certo. Sabe-se que o tratado voltou assinado e que começou a correr a lenda de que Butler tinha obtido a rubrica na casa-de-banho. Passo a explicar: chegando ao palácio presidencial, o marine descobriu que Dartiguenave se tinha escondido na dita instalação sanitária. Plantou-se à porta, mas nada. O presidente recusava-se a sair. Smedley Butler, que nunca foi homem de se deter com nada, saiu, pôs uma escada na parede, subiu e entrou na casa-de-banho pela janela. Apanhou o presidente sentado na sanita (mas com as calças em cima), ordenou-lhe que assinasse o tratado, e ele assinou - que remédio...
A história é chocante, mas é indiscutível que o período em que os americanos estiveram no Haiti foi talvez o menos mau dos duzentos anos de independência que o país já tem. Não é políticamente correcto dizer-se isto, mas o Haiti é um país falhado. Foram duzentos anos a oscilar entre o caos e as ditaduras sangrentas. Será mero acaso que, na presente crise, não há uma única voz a levantar-se contra a presença militar norte-americana? Aristide subiu ao poder graças ao apoio americano, mas os guerrilheiros passeiam-se nas ruas com camisolas e lenços onde aparece a bandeira dos EUA.
Não defendo um regresso ao colonialismo, mas não será uma boa altura para pensar num outro rumo (pelo menos temporário) para este e outros paises em situação semelhante? Não seria melhor colocá-los sob responsabilidade directa das Nações Unidas, transformando-os numa espécie de protectorado da Humanidade?
Se Aristide foi ou não metido à força num avião, a meio da noite, não faço ideia - embora possa quase jurar que vi um sorrisinho trocista na boca de Donald Rumsfeld quando ele negou que os EUA tivessem obrigado o homem a ir embora.
Há, no entanto, uma coisa que posso garantir: os americanos estão muito habituados a lidar de uma forma...hum...digamos, pouco simpática com os líderes do Haiti.
Para exemplificar, vou só relatar uma das muitas histórias dos quase vinte anos (1915-34) em que os EUA controlaram directamente o país. Se ela aconteceu exactamente assim ou não, é secundário. O que interessa aqui é que ela ilustra a forma "desinibida" como os marines orientavam os assuntos locais.
Logo no início da presença militar norte-americana, em 1915, Washington quis dar uma cobertura legal à ocupação do Haiti. Fez-se (no Departamento de Estado, claro está) um tratado entre os dois países, que concedia aos EUA controlo sobre as finanças, as alfândegas e a polícia haitianas. Ou seja, tudo o que importava. O acordo era válido por dez anos, e renovável por outros dez, se qualquer uma das partes assim o desejasse. Como se já não fosse suficientemente seguro, ainda dava aos americanos o direito de intervirem militarmente em caso de incumprimento.
Ora, o problema com estes tratados é que têm de ser assinados pelas duas partes. E, neste caso concreto, o então presidente do Haiti, Philippe Dartiguenave, não estava com muita vontade de assinar. O senhor em causa até tinha sido escolhido a dedo (os marines tinham "supervisionado" a votação na Assembleia Nacional, e nem sequer se deram ao trabalho de esconder as baionetas), mas ele lá deve ter achado que o que é demais, é demais...
Bem, mas, como se costuma dizer, «a espada é mais forte do que a pena». O major Smedley Butler, um marine que já era uma lenda viva entre os seus camaradas, foi enviado para obter a necessária assinatura. O que aconteceu a seguir, ninguém sabe ao certo. Sabe-se que o tratado voltou assinado e que começou a correr a lenda de que Butler tinha obtido a rubrica na casa-de-banho. Passo a explicar: chegando ao palácio presidencial, o marine descobriu que Dartiguenave se tinha escondido na dita instalação sanitária. Plantou-se à porta, mas nada. O presidente recusava-se a sair. Smedley Butler, que nunca foi homem de se deter com nada, saiu, pôs uma escada na parede, subiu e entrou na casa-de-banho pela janela. Apanhou o presidente sentado na sanita (mas com as calças em cima), ordenou-lhe que assinasse o tratado, e ele assinou - que remédio...
A história é chocante, mas é indiscutível que o período em que os americanos estiveram no Haiti foi talvez o menos mau dos duzentos anos de independência que o país já tem. Não é políticamente correcto dizer-se isto, mas o Haiti é um país falhado. Foram duzentos anos a oscilar entre o caos e as ditaduras sangrentas. Será mero acaso que, na presente crise, não há uma única voz a levantar-se contra a presença militar norte-americana? Aristide subiu ao poder graças ao apoio americano, mas os guerrilheiros passeiam-se nas ruas com camisolas e lenços onde aparece a bandeira dos EUA.
Não defendo um regresso ao colonialismo, mas não será uma boa altura para pensar num outro rumo (pelo menos temporário) para este e outros paises em situação semelhante? Não seria melhor colocá-los sob responsabilidade directa das Nações Unidas, transformando-os numa espécie de protectorado da Humanidade?
Invenções
Estava-se no reinado do Imperador Vespasiano (A.D. 69-79), quando um engenheiro criou uma um guindaste que conseguia fazer o trabalho de 10 homens. O imperador louvou-o, deu-lhe um prémio, comprou os planos e mandou destruír a invenção, pois isso levaria a que os homens ficassem sem o seu ganha-pão.
Este episódio é fulcral para mostrar o que era considerado a manutenção do status quo: não significava só ajudar os senadores a ficarem no senado, mas que a plebe e escravos tivessem trabalho. Mas em troca da paz social, a longo prazo condenava-se a sociedade à estagnação, e quando se desse uma sucessão de crises, a morte.
Mais uma nota curiosa: quando estava no seu leito de morte, Vespasiano disse que estava a sentir tornar-se um deus. Por aqui vemos que exceptuando alguns megalómanos, os imperadores com bom senso não acreditavam na sua natureza divina (passado uns meses ele foi deificado).
Este episódio é fulcral para mostrar o que era considerado a manutenção do status quo: não significava só ajudar os senadores a ficarem no senado, mas que a plebe e escravos tivessem trabalho. Mas em troca da paz social, a longo prazo condenava-se a sociedade à estagnação, e quando se desse uma sucessão de crises, a morte.
Mais uma nota curiosa: quando estava no seu leito de morte, Vespasiano disse que estava a sentir tornar-se um deus. Por aqui vemos que exceptuando alguns megalómanos, os imperadores com bom senso não acreditavam na sua natureza divina (passado uns meses ele foi deificado).
quinta-feira, março 04, 2004
A colonização alemã na africa oriental-II
As diferentes companhias dedicaram-se rapidamente à exploração dos territórios, mas a sua administração passou para as mãos do funcionalismo imperial, dadas as revoltas de indígenas. Das mais terríveis retemos duas: a dos Masai em 1889 e a dos Maji-Maji em 1905. A revolta dos Masai começou por arrogância mútua; habituados a serem o povo hegemónico no Quénia e Tanzânia exigiam mostras de submissão por quem passasse no seu território executando quem não o fazia. Uma expedição alemã provocou-os propositadamente levando-os à revolta; os masai foram derrotados em campo aberto e passaram a fazer raids até ao fim da guerra. A dos Maji-Maji foi conduzida por um conjunto de feiticeiros que conseguiram convencer várias tribos de que tinham feitiços que paravam as balas alemãs; morreram dezenas de milhares de africanos (que atacavam em massa, ao contrário dos Masai que se aproximavam agachados para evitar as balas); as forças alemãs com pouco mais de um milhar de homens (mas bem equipados e armados) saem vitoriosas.
Com a primeira guerra, as colónias alemãs são conquistadas rapidamente excepto em Africa: o general Von Lettow-Vorbeck com poucos milhares de homens manteve as forças aliadas à distância (que em termos teóricos ultrapassavam a centena de milhar), até se dar a inevitável rendição.
Com a primeira guerra, as colónias alemãs são conquistadas rapidamente excepto em Africa: o general Von Lettow-Vorbeck com poucos milhares de homens manteve as forças aliadas à distância (que em termos teóricos ultrapassavam a centena de milhar), até se dar a inevitável rendição.
terça-feira, março 02, 2004
A colonização alemã na africa oriental-I
Esta é normalmente pouco conhecida: tirando alguns filmes de aventuras dos anos 60 e referências em Corto Maltese, o papel colonial alemão é esquecido dado as colónias terem sido perdidas em 1914-18; de uma forma resumida tentarei apresentar alguns pontos.
Em meados do séc. XIX as principais potências em Africa continuavam a ser as tradicionais: Portugal, Reino Unido, França. A Libéria e o Egipto eram os únicos países independentes (este cada vez menos); nações como a Espanha e a Bélgica iam aos poucos talhando o seu império, quando na segunda metade do século, a recém-formada Alemanha decidiu tentar a sorte.
Em 1884 foi fundada a sociedade da Africa oriental por particulares. Foram organizadas diversas expedições na costa de Zanzibar resultando numa colónia com vários entrepostos. Apesar de serem feitos alguns acordos com tribos locais, os mercadores muçulmanos de escravos fizeram os possíveis para lançar os indígenas contra os recém-chegados.
Nesse mesmo ano (uns meses depois do começo da aventura), dá-se a conferência de Berlim que pretende regularizar as partilhas do território africano: como consequências importantes temos o conceito de que nenhum país pode estabelecer entrepostos onde outro país já existe, e a não legitimação automática do direito de expansão para o interior a partir de colónias litorais (este ponto seria importante no caso português quando se deu a questão do mapa cor-de-rosa).
Se Bismarck não era à partida muito favorável a uma expansão de territórios (dispersava-se os recursos e corria-se o risco de entrar em conflito com outros países), a pressão de alguns meios levou-o a mudar de posição (é de notar a forte emigração para os E.U.A. e Brasil nesse período superior a um milhão de pessoas).
Em meados do séc. XIX as principais potências em Africa continuavam a ser as tradicionais: Portugal, Reino Unido, França. A Libéria e o Egipto eram os únicos países independentes (este cada vez menos); nações como a Espanha e a Bélgica iam aos poucos talhando o seu império, quando na segunda metade do século, a recém-formada Alemanha decidiu tentar a sorte.
Em 1884 foi fundada a sociedade da Africa oriental por particulares. Foram organizadas diversas expedições na costa de Zanzibar resultando numa colónia com vários entrepostos. Apesar de serem feitos alguns acordos com tribos locais, os mercadores muçulmanos de escravos fizeram os possíveis para lançar os indígenas contra os recém-chegados.
Nesse mesmo ano (uns meses depois do começo da aventura), dá-se a conferência de Berlim que pretende regularizar as partilhas do território africano: como consequências importantes temos o conceito de que nenhum país pode estabelecer entrepostos onde outro país já existe, e a não legitimação automática do direito de expansão para o interior a partir de colónias litorais (este ponto seria importante no caso português quando se deu a questão do mapa cor-de-rosa).
Se Bismarck não era à partida muito favorável a uma expansão de territórios (dispersava-se os recursos e corria-se o risco de entrar em conflito com outros países), a pressão de alguns meios levou-o a mudar de posição (é de notar a forte emigração para os E.U.A. e Brasil nesse período superior a um milhão de pessoas).
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