terça-feira, outubro 25, 2005

Béria-VI


Com o projecto da bomba nuclear, Béria estava aparentemente no auge do seu poder. Entre ele e Estaline, não existia nenhuma adversário poderoso, o que o tornava a segunda figura mais poderosa efectivamente (mesmo que não no estado soviético ou na aparência do poder - nas fotografias ele aprece sempre em 4 lugar ou ainda numa posição mais discreta). Ora o mecanismo que ele tão bem utilizara contra outros, começava a virar-se contra ele: Estaline começou a suspeitar dele. Mas ou por medo, ou porque precisasse dele, Estaline não o mandou prender. Começou lentamente a retirar-lhe cargos, a afastar os sequazes de Béria de cargos-chave, a utilizar outras figuras. Manobrando habilmente, Béria conseguiu eliminar alguns adversários. Mas o cerco aproximava-se. A perseguição que foi efectuada contra numerosos judeus detentores de cargos políticos, atingiu Béria que os protegera (por oposição a Krutschev que os detestava).
No seu último ano de vida, Estaline ainda estava mais paranóico (1953): mandou prender os diferentes médicos que o tratavam há vários anos (e aparentemente preparava-se para efectuar uma purga nessa profissão com o pretexto de conspiração a soldo dos estrangeiros), e mandou executar o seu guarda-costas de há 20 anos. Curiosamente, parece que ia efectuar também uma purga dentro do partido comunista e para tal ia usar Béria (talvez por isso o tivesse poupado).
Ora numa bela manhã, Estaline morreu. Ainda se ignora os pormenores dado existirem versões contraditórias, mas parece que os seus guarda-costas ao fim de algumas horas da madrugada suspeitaram que algo não estava bem, entraram, viram-no caído e em vez de chamar um médico, chamaram os superiores hierárquicos. O tempo de se juntarem todos, decidir o que fazer, até se decidirem a chamar um médico, levou a que Estaline (que sofrera uma hemorragia cerebral) estivesse sem cuidados médicos. Se alguns pretendem que os líderes estavam a ver se ele morria (deixando a natureza seguisse o seu curso), outros dizem que teria sido medo genuíno e incapacidade de reagir perante o que fazer com o Chefe que os paralisou. Quando se aperceberam que estava a morrer, começaram imediatamente a fazer contactos e procurar apoios. Morto Estaline, podia começar a luta pelo poder.

quarta-feira, outubro 19, 2005

Ptolomeu VIII Evergeta II (145-116)


Foi um dos soberanos da dinastia Lágida (da mesma dinastia que a famosa Cleópatra). Era filho de Ptolomeu V e irmão de Ptolomeu VI; associado ao trono do seu irmão, conspirou e destronou o seu irmão, mas tornou-se tão impopular que acabou por ser por seu turno destronado. Quando o seu irmão morreu, sucedeu-lhe, casou com a viúva Cleópatra II (que por acaso era irmã dos dois). Rapidamente Ptolomeu VII matou o filho da sua irmã (que era sobrinho pelos dois lado). Teve um filho da sua irmã, casou com uma filha dela (Cleópatra III), mas rapidamente uma revolta liderada pela irmã levou ao seu exílio; ordenou então que o filho que tivera com a irmã (ainda com uns 12 anos) fosse cortado aos bocados e enviado à irmã. De depois de uma série de complicações, pedidos de ajuda aos romanos, o casal teve de se reconciliar e viverem os 3 juntos (Ptolomeu VIII, Cleópatra II e a III).
Grande número de intelectuais da biblioteca de Alexandria e os judeus que tinham sido beneficiados pelo seu irmão tiveram de fugir (executando grande número dos que ficaram). Ordenou que várias manifestações da população de Alexandria fossem reprimidas; ordenou também a execução dos partidários do seu irmão ou que suspeitasse de deslealdade.
Terminados os anos de guerra e confusão, esforçou-se por administrar o país, e repor a normalidade com a irmã (mantendo as execuções de suspeitos). As suas medidas na economia parecem ter dado algum resultado. A população indígena apreciava-o (nos conflitos com a irmã ficaram sempre do lado dele), pois fez leis para os proteger dos abusos dos funcionários embora os greco-macedónios o detestassem. Mas o caos em que mergulhou o país nos primeiros anos e a sua vida privada, deixaram uma visão negativa para os historiadores.

sexta-feira, outubro 14, 2005

Béria-V


Quando terminou a guerra, Estaline decidiu que a URSS não poderia ficar atrás do poder nuclear dos EUA. Apesar de ter sido efectuada já alguma investigação, decidiu-se dar-lhe prioridade máxima, e para líder do projecto, foi escolhido Béria. O chefe da polícia política já provara a sua eficiência, e tivera experiência de lidar com grupos de cientistas (Tupolev o célebre construtor de aviões esteve preso num campo de cientistas do NKVD) e poderia “derrubar” quaisquer entraves administrativos que surgissem do aparelho burocrático. E de facto, assim sucedeu. Embora não tivesse formação académica na área, ele acompanhou sempre o projecto, lendo relatórios, e tratando da logística, pressionando/protegendo os cientistas conforme as necessidades, arranjando materiais e informações através da rede de espiões nos EUA. Se alguns cientistas se ressentiam (embora nunca se queixando abertamente) das intervenções de Béria, outros consideravam-no a uma luz favorável: era um indivíduo inteligente que procurava realmente resolver os problemas, inteirava-se dos dossiers, e dava-lhes as melhores condições de trabalho possíveis usando a sua autoridade. O resultado foi um primeiro teste bem sucedido em 1949, quando os norte-americanos pensavam que tal só seria possível lá para meados da década seguinte. Mantendo a supervisão dos projectos, Béria não pôde observar a primeira bomba de hidrogénio, dado que foi executado antes.

quinta-feira, outubro 13, 2005

Madame du Barry


Ao ver no fim-de-semana passado o filme “A inglesa e o duque” apeteceu-me fazer um post sobre a última favorita de Luís XV.
Luís XV foi-se democratizando com o tempo: no princípio do reinado escolhera como amantes, aristocratas da corte, depois teve Madame de Pompadour, oriunda da burguesia (o que provocara escândalo), e finalmente teve Madame du Barry, oriunda do povo. Du Barry que fora uma ex-prostituta e amante de diversos homens ricos fora introduzida à corte e rapidamente se tornou a favorita do monarca. O escândalo foi enorme: a sua origem social, a sua má reputação, linguagem livre, atiraram-lhe o ódio de todos. Teve uma rivalidade com Maria Antonieta (que sendo de sangue real não se dignava a falar-lhe), o que levou à divisão da corte e imensas intrigas, que contribuíram para aumentar o desagrado popular para com a corte real. Du Barry nunca tentou ter real influência no país, limitava-se a pedir festas, palácios e jóias ao seu real amante. Por muito mal visto que isso fosse, na prática acabava por ser muito mais inofensivo para as finanças francesas do que qualquer guerra.
A morte do seu amante, levou ao seu exílio. Mas com as riquezas adquiridas pôde manter um bom nível de vida. Com o rebentar da revolução francesa, usou a sua riqueza para apoiar exilados e a causa monárquica; numa viagem a França, foi presa e guilhotinada. Assim terminava um dos “símbolos” do antigo regime.

quarta-feira, outubro 12, 2005

Béria-IV

Depois da campanha da Polonha, os serviços secretos soviéticos foram recebendo sucessivos avisos de espiões seus e de outras potências dos planos alemães de invasão. Ora Béria tendo transmitido essas informações ao aperceber-se de que Estaline não lhes dava crédito decidiu fazer o mesmo: independentemente da sua opinião sobre o assunto, deve ter concluído que não valia a pena desagradar ao chefe e passou a esconder essas informações ou a desvaloriza-las (elas chegavam por outras vias a Estaline que as refutava com Béria a concordar com ele). Revelou-se a melhor decisão a nível pessoal, pois com a invasão todos os que tinham concordado com Estaline foram sendo recompensados, não sucedendo o mesmo às “Cassandras”. Béria entretanto mandou a prisão de e deportação de centenas de milhares de pessoas pertencentes a etnias que eram suspeitas (algumas nem o eram, mas Béria arranjava provas para mostrar o seu valor). Esses deportados eram transportados em comboios de gado, por vezes sem alimentos, aquecimento ou instalações sanitárias com paragens ocasionais para retirarem os mortos, durado semanas as viagens, sendo depois deixados em descampados onde teriam de recomeçar a vida: boa parte morreria quer nas viagens quer depois no Inverno.
O império do NKVD entretanto iria crescer: divisões eram criadas para policiamento das zonas libertadas, campos de internamento, e com o medo de Estaline do exército, o NKVD vigiava atentamente possíveis derrotismos no exército (ajudados pelos comissários). Béria pessoalmente intervinha em frentes de combate, passando por cima da autoridade dos militares, criando confusão. Para além disso, ajudou na mobilização da população no esforço de guerra.

sexta-feira, outubro 07, 2005

Béria-III




Na década de 20. Béria foi com habilidade livrando-se sucessivamente dos seus superiores e rivais na Geórgia, escrevendo relatórios e acumulando provas contra eles por incompetência ou falta de firmeza revolucionária, acabando por se tornar num líder local, e colocando os seus amigos em todos os cargos de confiança. Aproveitava também as visitas de Estaline à Geórgia para se tornar seu íntimo e da sua família. Quando se decidiu acabar com os Kulaks (proprietários fundiários), como estes eram praticamente inexistentes mas tinham de ser cumpridas quotas de prisioneiros, qualquer pessoa com um talhão de terra era incluída nessa categoria; Béria aproveitou-se da renitência dos seus superiores em prender e deportar os camponeses para os denunciar.
Ora a leitura do capítulo sobre as purgas dos anos 30 é surreal para se compreender o funcionamento do sistema soviético. Estaline substituiu o chefe do NKVD (futura KJB) e começaram-se a descobrir numerosos inimigos internos (dentro do partido comunista) a soldo de potências estrangeiras sendo boa parte deles, velhos membros do partido comunista que sempre tinham sido fiéis. Por alto, deu-se uma “renovação” em cerca de 10% do partido e a esmagadora maioria dos oficiais a partir de coronel. A explicação actualmente encontrada, é de que Estaline teria procurado eliminar todas as figuras que tinham alguma independência e que poderiam opor-se ao seu domínio absoluto (para além de uma paranóia inerente). Para tal, contou com a colaboração de pessoal mais jovem, e de segundo plano que colaborou activamente na eliminação dos seus superiores ascendendo aos cargos; numa segunda vaga, também foram eliminados, para acentuar o clima de terror, e não ficarem com a ideia de que o chefe dependia deles. Parece-me que o assunto é um pouco mais complexo (nomeadamente a desorganização na economia que a eliminação dos quadros superiores provocou, deve ter levado à necessidade de arranjar bodes expiatórios).
E Béria no meio de isto tudo? Ajudou a denunciar traidores (normalmente adversários seus ou pessoal com quem tinha velhas contas a ajustar), mas as purgas afectaram-no pois quase foi executado e viu vários dos seus apoiantes a caírem (não tendo a paranóia de Estaline, criara uma clientela na Geórgia que lhe era fiel e a quem cumulava privilégios).
Ordenou que fosse escrita um a biografia de Estaline que exaltava o seu papel na sua juventude (teria organizado ainda no seminário manifestações, sabotagens e jornais), absolutamente inventada; ao aperceber-se que outras biografias e histórias da URSS anteriores não “provavam” esses factos, mandou prender os historiadores traidores. Aliás, mandou mais tarde fuzilar os colaboradores que tinham escrito esse livro de história, dado que poderiam por em causa a autoria de Béria. Boa parte dos intelectuais e artistas Georgianos acabaria por ser presa também.
Quando depois de uma série de purgas, foi necessário substituir o chefe da NKVD (que foi eliminado depois de conduzir as purgas, deixando de ser necessário), Béria foi chamado a Moscovo e substituí-o. Ora parece que de modo geral, a melhoria foi para melhor (de acordo com a lógica soviética). Béria mandou executar toda a cúpula da NKVD (se o chefe fora um traidor, os subordinados logicamente também o eram), como era natural, mas abrandou o terror (que já não era tão necessário). Os presos deixavam de ser espancados muitas vezes até à morte e depois convencidos a assinar a confissão e (como fora a regra), e passavam a ser instados a assinar, dado que seriam condenados de qualquer modo (a menos que Béria tivesse assuntos pessoais a resolver, o que era em casos pontuais e aí ele poderia ser verdadeiramente selvagem). Começou a haver alguma preocupação em alimentar os presos de forma conveniente (mesmo assim, morriam todos os anos milhares de presos pelas más condições) e em aproveitá-los de forma eficaz para trabalhos úteis ao país. Construindo-se barragens, pontes, estradas e explorando fontes de riqueza, (petróleo, carvão), Béria pôde mostrar brilhantes resultados económicos a Estaline e construir um pequeno império particular. Os subordinados de Béria gostavam dele, dado que ele lhes garantia a segurança e condições de vida.
A menina ao colo de Béria, é a filha da figura com o cachimbo; a foto foi tirada ainda nos anos 30, antes da ascenção de Béria ao NKVD.

terça-feira, outubro 04, 2005

Falta de memória...

...É o nosso grande mal. É extraordinário como a homenagem de ontem do Presidente da República aos prisioneiros do Tarrafal passou completamente despercebida. Em qualquer país que vivesse um bocadinho melhor consigo próprio este acontecimento teria sido transformado, no mínimo, num dia de reflexão nacional. A cerimónia teria sido transmitida nas televisões em directo, teria havido solenidade e emoção. Não é todos os dias que se lembra um dos episódios mais negros da história contemporânea portuguesa, e seria bom que as gerações mais novas soubessem que Portugal também teve o seu campo de concentração.

O que vimos foi a tristeza envergonhada do costume: uns discursos, umas coroas de flores, e acabou. Espero que isto, para os sobreviventes que estiveram presentes, tenha parecido melhor do que me pareceu a mim. Com o passar dos anos (e já lá vão quase 70 desde a abertura do campo), não é previsível que haja muitas mais oportunidades para homenagear os antigos prisioneiros.

Nestas alturas, a comunicação social está sempre à mão para servir de bode expiatório do nosso desconforto com a nossa própria História. Mas não tenhamos ilusões: se estes acontecimentos são quase ignorados, não é porque os jornalistas não lhes dão importância; nós, enquanto povo, é que os usamos apenas como descarga da nossa má consciência; não os assumimos, queremos que passem depressa; frequentemente, tornam-se em exercícios fúteis e indignos.

Como outros já o disseram, Portugal tem História a mais, e o pior é que vivemos mal com ela. Continuamos a misturar a política e a ideologia com tudo o resto. Preferimos continuar divididos onde devíamos estar unidos. Não gostamos de nós próprios, e quando não gostamos de nós próprios a História e as pessoas que a fizeram são maltratadas.