segunda-feira, janeiro 30, 2006

O último samurai

Vi ontem a maior parte desse filme ontem. Gostei muito como filme de samurais e de aventura romântica. Do ponto de vista histórico, mistura muitas coisas.
De facto, quando o Japão seguiu a via da modernização houve uma série de revoltas de samurais e daymios e que não queriam perder os seus privilégios; a mais grave foi em 1877. O imperador e o governo esmagaram essas revoltas que colocavam o progresso em causa; pretendendo o Japão tornar-se uma potência, não era com o código do bushido que se venceria as modernas armas de fogo. Mas para além dessas mudanças, existem outras mais subtis: no novo sistema, nunca mais poderia um samurai decapitar um camponês, porque este lhe dera um encontrão ao passar na rua; mesmo existindo hierarquias acentuadas, alguns direitos básico, igualavam todos os novos cidadãos.

sexta-feira, janeiro 27, 2006

Mozart


Embora não tenha tempo para escrever, não posso deixar de assinalar o nascimento de Mozart.

terça-feira, janeiro 24, 2006

O nome da Rosa




O filme é bom, o livro é muito melhor. Vou tentar descrever o livro. Um velho monge beneditino (Adso de Melk) de finais do séc. XIV relata um acontecimento terrível que assistiu quando era jovem.
50 anos antes, sendo um noviço, viajou com um frade franciscano inglês. Este que fora inquisidor, é chamado pelo abade de um mosteiro beneditino do norte de Itália para resolver um problema. Este mosteiro, tem uma biblioteca famosa, onde se copiam e conservam manuscritos antigos (mas não recentes), mas que é vedada a entrada. O irmão Baskerville (o nome do frade) é informado que foi encontrado um jovem que poderá ter sido assassinado (ou cometido suicídio). Nos dias seguintes mais morte vão-se sucedendo, e progressivamente, vamos descobrindo que as mortes estão relacionadas com um manuscrito que seria nada mais, nada menos do que o 2º livro da poética de Aristóteles (já falei dele aqui). Porquê os homicídios? De uma forma muito resumida, porque legitimava o riso. Quanto aos crimes, o quem, é fácil de adivinhar, o como é bastante engenhoso. São apresentadas inúmeras obras na maioria da alta idade média (quantas delas já desaparecidas e outras inventadas por Ecco). Os livros tem um valor que ultrapassa em muito o facto de serem um mero suporte de transmissão de conhecimento, não devendo ser permitidos o seu livro acesso aos comuns, dado o perigo de má interpretação.
Ao mesmo tempo assistimos a todos os conflitos internos da igreja da época. Vemos as divisões que se davam nas ordens religiosas que tinham diferenças que poderíamos chamar de ideológicas (beneditinos mais aristocráticos mas representando um mundo que estava a ficar para trás, os dominicanos apresentados comos os maus devido à sua ortodoxia e zelo de perseguir os que se desviassem, os franciscanos mais abertos ao mundo mas com imensas divisões que levariam à criação de novas ordens religiosas e vários heréticos), os conflitos entre o Papado e o império e a sombra da inquisição, as várias heresias.
Para além da trama policial (que serve para qualquer época), fica um background e uma atmosfera que retratam muito bem a época.
Temos uma gama de personagens todas bem caracterizadas (Malaquias o alemão, Jorge o hispânico e Salvatore um herético convertido à simpática vida dos beneditinos antes de ser apanhado- “excelência reverendíssima, io stupido”). O inquisidor (Bernardo de Gui) existiu efectivamente).
O filme teve de cortar com todos os pormenores que dão valor ao livro, mas apesar de tudo, consegue fazer um bom trabalho de salvar o que pode. O melhor filme de idade média que vi.

segunda-feira, janeiro 23, 2006

A Maldição de Marialva

Tive oportunidade de ver ontem na RTP Memória o filme "A Maldição de Marialva", de António Macedo, que sendo talvez o único filme português que recria a Idade Média (apesar de ser sobre o fantástico, baseado no conto de Alexandre Herculano, A Dama de Pés de Cabra, com demónios, bruxas e um alquimista), consegue prender pela caractetização que faz do que seria um burgo no Portucale do sec. X, ao qual não falta até um maometano pedinte, que para matar a sede acaa por beber vinho, enquanto ouve os cristãos a gozarem com por ter bebido "o sangue de Cristo" (Tens fome? Come porco.)
Desde o vestuário, a linguagem, os nomes, a música, o retrato das actividades quotidianas, tudo contribui para que este filme seja do agrado dos amantes desta época.

Já agora, será que é possível adquiri-lo em DVD?

quinta-feira, janeiro 19, 2006

Música



Há uns dias atrás estive a ouvir um cd de música do séc. XVII das Provincias Unidas (vulgo, Holanda) países baixos. A maior parte peças era para virginal e alaúde. Não existia uma corte e aristocracia palaciana, o que dava um carácter diferente à sua música; a música era tocada dentro das casas por um dos membros da família (pertencentes à burguesia ou pequena aristocracia) como forma de distração ao serão, não podendo ser muito complicadas, dado que não eram interpretadas por músicos profissionais; os modelos eram habitualmente italianos ou ingleses.

terça-feira, janeiro 17, 2006

O Papa desenterrado




Formoso nasceu em Itália em princípios do séc. IX. Seguiu uma carreira clerical e como numerosos sacerdotes serviu reis como diplomata (por curiosidade: era bispo não residente do Porto, que estava em mãos muçulmanas). Entrou em conflito com o papa João VIII e foi excomungado e foi destituído das suas funções (nomeadamente como bispo). Mas foi perdoado, retomou os seus cargos e acabou por ser eleito Papa; morreu em 896. Ora a partir daqui é que a sua “vida” se torna interessante. Em 897, um dos seus sucessores (Estêvão) decidiu organizar um sínodo, mandou desenterrar o cadáver de Formoso, vesti-lo com as vestes Pontifícias e julga-lo. Foi considerado culpado das acusações, destituído, mutilado, atirado ao rio e todos os seus actos considerados inválidos, incluindo a consagração e nomeação de bispos e por aí além (de padres nomeados por esses bispos, dos sacramentos feitos por estes, etc). O resultado foi uma tremenda desorganização da Igreja (dado que se considerava nulos todos os actos recentes). Isto provocou uma reacção que levou à prisão e assassínio do Papa Estêvão. Depois de uma série de peripécias, um Papa acabou por considerar válidos todos os actos de Formoso, anular o seu julgamento e deposição (colocando um ponto final à situação de confusão que se dera). Todo o episódio foi considerado uma aberração, e serviria de base para a doutrina da Igreja de não anular actos de pessoas consagradas. Mas alguns séculos depois, a Igreja voltaria a efectuar julgamentos de pessoas acusadas de heresia já falecidas.

terça-feira, janeiro 10, 2006

Guilherme o marechal



Guilherme o marechal representou para muitos o epíteto do cavaleiro perfeito.
Era o filho mais novo de um nobre de alguma importância com cargos na casa real de Inglaterra. Mas sendo o benjamim, a herança familiar estava-lhe vedada. Foi criado por um tio materno (que era mais importante) e depois de ser tornado cavaleiro e equipado, foi deixado por sua conta. Começou a participar em torneios para ganhar a vida. Nos torneios na época (conhecidos por “melee”), duas equipas participavam e combatiam (evitando matar embora por vezes sucedessem os acidentes) por nações às ordens de um capitão; o objectivo era derrubar os adversários para capturá-los e pedir resgate. Venceu centenas de combates, nunca sendo derrotado; era procurado e requisitado para os torneios. Recebeu mesmo um pequeno feudo em França, e o convite por vários grandes senhores com pensão perpétua. Ganhou muito dinheiro, mas esse era todo gasto: ter as melhores montadas, armas, homens a acompanhar, pagar (como era costume) a arautos e escudeiros nos torneios e sustentar toda a comitiva o ano inteiro segundo um padrão de vida aristocrático ficava caro. Foi nomeado tutor do príncipe, e quando este morreu, manteve-se ao serviço do rei Henrique II. Combateu contra os seus filhos (Ricardo coração de Leão e João sem Terra). Quando Ricardo ascendeu ao trono, esqueceu os ressentimentos, e deu-lhe como noiva a 2ª mais rica herdeira de Inglaterra. Para Guilherme terminaram as preocupações pelo seu futuro (já tinha mais de 40 anos e só um pequeno feudo); por curiosidade, acabou por casar o filho mais velho com uma filha de João sem Terra. Guilherme sempre defendeu o soberano quem quer que ele fosse, contra os revoltosos (mesmo que fossem os herdeiros do trono): assim foi com Henrique II, Ricardo I, João sem Terra e Henrique III. Quando João estava a morrer entregou-lhe a custódia do filho menor, dado que deixava o reino em estado aflitivo: uma guerra contra a França (que invadiu a Inglaterra imediatamente) e os nobres em revolta. Guilherme conseguiu vencer em repetidos combates, negociando uma paz que levou à submissão dos nobres e retirada dos franceses. Conseguiu acalmar a situação (confirmou a magna carta), mas quando estava a agonizar (1219), nomeou o legado papal como regente, dada a sua desconfiança para com qualquer membro da nobreza ou clero.
Georges Duby tinha um bom livro sobre esta figura, tendo-se baseado num poema épico encomendado pelo filho de Guilherme (também chamado Guilherme).

quarta-feira, janeiro 04, 2006

Aguirre o conquistador




Vi o filme há uns anos atrás e lembro-me que me espantou a princípio: actores alemães a representarem conquistadores espanhóis? Mas acabei por gostar muito do filme; mais tarde li uma crónica do séc. XVI de um seu companheiro (creio que se chamava Eldorado o livro) e vou começar por esta, dado que retrata parte da vida de Aguirre.
Lopo de Aguirre nasceu no reino de Espanha em 1510 e era filho de um nobre. Partiu como outros para o novo mundo em busca de riquezas, que tinham feito a fama de Pizarro e Cortês. Ora se essas são as duas expedições mais conhecidas, numerosas outras existiram. Grupos de aventureiros procuravam descobrir novos impérios e atingir o El Dorado. Aguirre participou em várias expedições. Também se meteu em problemas e esteve foragido depois de um assassinato. Conseguiu um perdão da coroa e voluntariou-se (1560) numa outra expedição pelo rio amazonas, liderada por Pedro de Ursua. No ano seguinte (ainda na expedição) participou numa conspiração que substituiu Ursua por Fernando de Guzmão; Aguirre livrou-se dele mais tarde e tomou a liderança. Decidiu então proclamar-se senhor da América do sul e escreveu uma extraordinária carta a Carlos V dizendo-lhe para não se meter no território que era o seu por direito de conquista e esforço de tantos anos. Os seus seguidores mantinham-se fiéis devido à sua crueldade e pronta execução de potenciais traidores. Quando entrou em contacto com as tropas da Coroa, tudo se esborou, os seus seguidores abandonaram-no e depois de conseguir matar a filha, foi morto.
O filme (Aguirre, a ira de Deus) acompanha unicamente a última expedição, embora contenha elementos retirados de outras expedições e contenha alterações em relação à história. Vemos Aguirre que é uma personagem relativamente menor, crescer de importância, as conspirações e a progressiva loucura de Aguirre. No final do filme, vemos os sobreviventes deitados em jangadas à deriva (sem sabermos se estão vivos ou mortos) com Aguirre a gritar as suas futuras conquistas e que criará uma nova estirpe com a sua filha, enquanto uma série de macacos estão nas jangadas indiferentes aos seus gritos. A maneira como a selva é filmada é opressiva: é um inimigo do homem que não devia lá estar e que parte para a morte. E as representações são excelentes, com bons retratos psicológicos.