Ontem vi o 1º episódio de “O anel dos Nibelungos” na RTP. Vou fazer uma rápida contextualização antes de falar da série. O poema medieval tem por base alguns factos verídicos (as invasões de Atila, a destruição da Burgundia, a rivalidade entre Brunhilde e Fredegonda rainhas dos Francos), adulterados por séculos de oralidade, e misturando personagens e factos. Manteve-se popular até ao renascimento; foi recuperada com o romantismo alemão e a soberba tetralogia de Wagner. Fizeram-se alguns filmes neste século, e serviu em parte de inspiração a Tolkien para a sua trilogia e o Hobbit. Infelizmente ainda não li a obra (só conheço mesmo a tetralogia de Wagner, por isso não posso avaliar o grau de fidelidade ao poema, embora seja bastante semelhante às óperas Siegfried e deduzo o crepúsculo dos Deuses, mediante algumas contorções).
Bem, parece-me que a série faz cedências aos tempos modernos como é habitual. O Siegfried é muito simpático e domável faltando-lhe a postura de herói; acho que o seu maior defeito é que não se destaca como ser superior no meio de medíocres (dado que neste caso ele não é superior aos outros na actuação). Os cenários são típicos dos anos 90, “medieval sujo” que se tornou normal depois de “Braveheart”. Estamos longe das armaduras brilhantes de “Excalibur” (o equipamento consiste em armaduras de escamas e cotas de malha, o que de facto se usava na época). As referências à religião são fugazes e não fazem juízos de moral (ninguém é bom ou mau por ser cristão ou pagão). Os combates são uma mistura de Erol Flyn e jovens heróis de Shaolin: muitas acrobacias e combates com 2 espadas.
Não é nenhuma obra-prima, é unicamente um entretenimento.
terça-feira, dezembro 21, 2004
sexta-feira, dezembro 17, 2004
Jogo Musical-VIII
O género musical de hoje vai ser a música tradicional popular (ou folk, ou música do mundo, ou étnica, ou o que o lhe quiserem chamar). E a banda escolhida foram os Chieftains (ainda hesitei entre Ravi Shankara e Kimmo Pohjonen, mas só se pode escolher um...).
É talvez a banda de música tradicional mais conhecida e de maior duração. Se é certo que o interesse da música popular era muito anterior (vários autores eruditos aí tinham bebido fontes de inspiração, mas depois de passar pelas transformações exigidas na sua conversão para música de câmara ou orquestra, de popular pouco tinha...). Surgiu em 1962 fundado por Paddy Moloney, e editaram o seu primeiro álbum no ano seguinte. Tocavam um reportório tradicional irlandês, usando instrumentos tradicionais (na época tornara-se moda usar instrumentos modernos), embora desenvolvessem temas originais. O sucesso da sua participação na banda sonora do filme de 1975 de Kubrik “Barry Lyndon”, ajudou a consolidar a sua reputação. Tocando em digressões e editando mais álbuns, tocavam também com outros músicos e bandas (ou com participações especiais); começaram também a tocar com músicos de outros países e de tradições bem diversas da sua (incluindo música pop). Ainda actuam actualmente (já estiveram em Portugal, infelizmente não consegui o bilhete para o inter-céltico do Porto).
Um tema? É complicado porque as músicas sendo bonitas, e de sonoridade agradável, raramente se destacam entre elas. Talvez o Women of Ireland (por curiosidade, no princípio dos anos 90 um cantor pop cantou esse tema com imenso sucesso).
É talvez a banda de música tradicional mais conhecida e de maior duração. Se é certo que o interesse da música popular era muito anterior (vários autores eruditos aí tinham bebido fontes de inspiração, mas depois de passar pelas transformações exigidas na sua conversão para música de câmara ou orquestra, de popular pouco tinha...). Surgiu em 1962 fundado por Paddy Moloney, e editaram o seu primeiro álbum no ano seguinte. Tocavam um reportório tradicional irlandês, usando instrumentos tradicionais (na época tornara-se moda usar instrumentos modernos), embora desenvolvessem temas originais. O sucesso da sua participação na banda sonora do filme de 1975 de Kubrik “Barry Lyndon”, ajudou a consolidar a sua reputação. Tocando em digressões e editando mais álbuns, tocavam também com outros músicos e bandas (ou com participações especiais); começaram também a tocar com músicos de outros países e de tradições bem diversas da sua (incluindo música pop). Ainda actuam actualmente (já estiveram em Portugal, infelizmente não consegui o bilhete para o inter-céltico do Porto).
Um tema? É complicado porque as músicas sendo bonitas, e de sonoridade agradável, raramente se destacam entre elas. Talvez o Women of Ireland (por curiosidade, no princípio dos anos 90 um cantor pop cantou esse tema com imenso sucesso).
quinta-feira, dezembro 09, 2004
Alexandre
A propósito de Alexandre, Plutarco conta algumas anedotas interessantes. Depois de uma vitória contra Dário III, este ofereceu a Alexandre a parte do seu império que ia até ao Eufrates, o casamento com uma filha e uma enorme quantia . Parménion, um dos melhores generais de Alexandre disse que “se fosse Alexandre aceitaria”; este respondeu que “se fosse Parménion também aceitaria”. Noutra história, encontrou o filósofo Diógenes que estava a viver num baril; quando lhe perguntou se desejava alguma coisa, Diógenes respondeu-lhe que só queria que Alexandre saísse da frente pois estava a tapar-lhe o sol (Diógenes tinha como únicas possessões uns farrapos e um cantil; quando viu uma criança beber água fazendo uma concha com as mãos, partiu o cantil por o considerar um luxo inútil).
segunda-feira, novembro 29, 2004
A guerra do Peloponeso-IV
A partir daí, as coisas complicaram-se para Atenas: os espartanos obtiveram fundos da corte persa que lhes permitiu obter uma frota e se bem que não derrotassem definitivamente Atenas, esta ficava em situação muito mais complicada. Para complicar mais as coisas, Alcibíades estava também na corte persa intrigando; conseguiu convencer os seus concidadãos de que era o homem certo para terminar a guerra, desde que fosse chamado e se extinguisse a democracia. A eclesia concordou, mas o grupo de oligarcas (o conselho dos 400) que a substituiu recusou-se a chamar Alcibíades. As tropas atenienses fora revoltaram-se e consideraram-se as únicas representantes legítimas de Atenas (por defenderam a democracia). Uma série de derrotas levou o regresso da democracia, e paradoxalmente de Alcibíades.
O conflito com Esparta continuava na mesma: as vitórias e derrotas sucediam-se sem haver um claro vencedor, embora se acentuasse o esgotamento de ambos os contentores. Os espartanos depois de uma derrota ofereceram a paz mantendo o status quo, mas os atenienses confiantes na sua frota e muralhas voltaram a recusar. A destruição total da frota ateniense num ataque surpresa dos peloponésios (Egos-Potamos em 405) ditou a sorte da guerra. Uns meses de cerco depois (cercada por terra e mar), Atenas privada de abastecimento pedia a paz. Atendendo à sua vitória, Esparta foi muito moderada: exigiu apenas a demolição das muralhas, a redução da frota, o abandono da maioria das possessões e o fim da liga de Delos (certos aliados pretendiam mesmo a destruição da cidade).
Como epílogo, digamos que Esparta rapidamente perdeu a moderação que usara até então (não propriamente a sua população que era indiferente aos negócios exteriores, mas um reduzido grupo que dirigia essa política), levando a que pouco depois fosse odiada.
Em Atenas, foi imposta uma constituição radical oligarca que impôs um regime de terror (execuções sumárias de democratas e mesmo de moderados); conseguiram convencer o satrápa persa onde Alcibíades estava exilado a executar este. Rapidamente este regime foi derrubado, e uma década depois, Atenas era novamente uma potência disputando a hegemonia a Esparta e Tebas, até o advento da Macedónia.
O conflito com Esparta continuava na mesma: as vitórias e derrotas sucediam-se sem haver um claro vencedor, embora se acentuasse o esgotamento de ambos os contentores. Os espartanos depois de uma derrota ofereceram a paz mantendo o status quo, mas os atenienses confiantes na sua frota e muralhas voltaram a recusar. A destruição total da frota ateniense num ataque surpresa dos peloponésios (Egos-Potamos em 405) ditou a sorte da guerra. Uns meses de cerco depois (cercada por terra e mar), Atenas privada de abastecimento pedia a paz. Atendendo à sua vitória, Esparta foi muito moderada: exigiu apenas a demolição das muralhas, a redução da frota, o abandono da maioria das possessões e o fim da liga de Delos (certos aliados pretendiam mesmo a destruição da cidade).
Como epílogo, digamos que Esparta rapidamente perdeu a moderação que usara até então (não propriamente a sua população que era indiferente aos negócios exteriores, mas um reduzido grupo que dirigia essa política), levando a que pouco depois fosse odiada.
Em Atenas, foi imposta uma constituição radical oligarca que impôs um regime de terror (execuções sumárias de democratas e mesmo de moderados); conseguiram convencer o satrápa persa onde Alcibíades estava exilado a executar este. Rapidamente este regime foi derrubado, e uma década depois, Atenas era novamente uma potência disputando a hegemonia a Esparta e Tebas, até o advento da Macedónia.
quinta-feira, novembro 25, 2004
A guerra do Peloponeso-III
Não vou fazer uma cronologia da guerra, que seria algo aborrecido (e de qualquer modo é fácil de consultar para quem se interessar), mas apontar alguns dos acontecimentos que me parecem mais interessantes.
Os anos seguintes viram pequenas batalhas sucederem-se sem que se atingisse qualquer resultado conclusivo: embora Esparta possuísse um exército melhor e tivesse invadido por diversas vezes a Ática, sem material de assédio, era impossível derrubar as muralhas de Atenas, e não valia a pena esperar que a cidade se rendesse pela fome, dado que era reabastecida pelo mar (onde possuía uma vantagem incontestada). Cada um dos blocos tentou então enfraquecer o adversário, fazendo expedições contra os aliados dos inimigos, envolvendo mesmo reinos não gregos (Trácia, Macedónia). Como não se chegava a resultados conclusivos, nas duas potências, os “partidos pró-paz” acabaram por conseguir impor os seus pontos de vista e fazer-se um tratado (421).
Embora existissem alguns descontentes, a paz foi transformada numa aliança. Infelizmente iria intervir uma personagem que modificaria o curso dos acontecimentos: Alcibíades. Personagem controversa, são-lhe reconhecidas diversas qualidades: bom estratega, comunicador nato, bem relacionado (era parente de Péricles e discípulo de Sócrates) adulado pela multidão. Infelizmente era também dotado de uma ambição sem limites, o exemplo acabado do demagogo.
Para se garantir um lugar num império Ateniense precisava de uma guerra vitoriosa: conseguiu que fosse anulada a paz com Esparta e lançou depois o seu país numa expedição contra a Siracusa e a Sicília (a sua ocupação dar-lhe-ia os recursos para acabar com Esparta). Um escândalo religioso levou ao seu afastamento da liderança da expedição e condenação à morte. O seu sucessor depois de uma série de derrotas morreu no comando assim como boa parte do exército (o resto rendeu-se).
P.S. Em resposta à dúvida do R.S., a edição que tenho da obra "A guerra do Peloponeso", em 2 volumes é da Flammarion, e comprei (passo a publicidade) na "Leitura".
Os anos seguintes viram pequenas batalhas sucederem-se sem que se atingisse qualquer resultado conclusivo: embora Esparta possuísse um exército melhor e tivesse invadido por diversas vezes a Ática, sem material de assédio, era impossível derrubar as muralhas de Atenas, e não valia a pena esperar que a cidade se rendesse pela fome, dado que era reabastecida pelo mar (onde possuía uma vantagem incontestada). Cada um dos blocos tentou então enfraquecer o adversário, fazendo expedições contra os aliados dos inimigos, envolvendo mesmo reinos não gregos (Trácia, Macedónia). Como não se chegava a resultados conclusivos, nas duas potências, os “partidos pró-paz” acabaram por conseguir impor os seus pontos de vista e fazer-se um tratado (421).
Embora existissem alguns descontentes, a paz foi transformada numa aliança. Infelizmente iria intervir uma personagem que modificaria o curso dos acontecimentos: Alcibíades. Personagem controversa, são-lhe reconhecidas diversas qualidades: bom estratega, comunicador nato, bem relacionado (era parente de Péricles e discípulo de Sócrates) adulado pela multidão. Infelizmente era também dotado de uma ambição sem limites, o exemplo acabado do demagogo.
Para se garantir um lugar num império Ateniense precisava de uma guerra vitoriosa: conseguiu que fosse anulada a paz com Esparta e lançou depois o seu país numa expedição contra a Siracusa e a Sicília (a sua ocupação dar-lhe-ia os recursos para acabar com Esparta). Um escândalo religioso levou ao seu afastamento da liderança da expedição e condenação à morte. O seu sucessor depois de uma série de derrotas morreu no comando assim como boa parte do exército (o resto rendeu-se).
P.S. Em resposta à dúvida do R.S., a edição que tenho da obra "A guerra do Peloponeso", em 2 volumes é da Flammarion, e comprei (passo a publicidade) na "Leitura".
quarta-feira, novembro 17, 2004
A guerra do Peloponeso-II
Em 435 (a.C.) a cidade de Epidamno estava a ser atacada por ilírios (um povo bárbaro nas costas do Adriático, na antiga Jugoslávia), quando pediu ajuda à sua metrópole Corcira; esta recusou-se e então pediu ajuda a Corinto (esta era metrópole de Corcira). Havendo uma rivalidade entre Corinto e Corcira, Corinto aproveitou a ocasião e enviou uma esquadra, mas Corcira achou que Corinto estava a meter-se em território alheio e atacou essa esquadra e venceu. Corinto decidiu retaliar, e Corcira pediu ajuda a Atenas; esta não o podia fazer dado que tinha uma trégua com a liga do Peloponeso que a impedia de atacar membros da liga em favor de neutrais mas decidiu não perder a oportunidade e esta enviou uma esquadra: deu-se um combate e depois de muita confusão e um empate na prática, tentaram-se negociações; mais uma batalha noutro ponto (o que mostrava o valor que se estava a dar à trégua), os espartanos tentaram uma última vez obter a paz, mas debalde: o maior conflito helénico estava a começar.
segunda-feira, novembro 15, 2004
A guerra do Peloponeso-I
Comecei a ler a “História da guerra do Peloponeso”; ainda vou no princípio (os coríntios estão na assembleia a tentar convencer os espartanos a declarar guerra aos atenienses), mas parece-me um bom pretexto para escrever.
A guerra começou como muitas outras com um insignificante incidente, tendo raízes profundas.
Atenas criara em consequência das guerras médicas uma aliança defensiva, a liga de Delos (ou confederação ateniense). Cada cidade deveria fornecer tropas, barcos e dinheiro de acordo com as suas possibilidades, tendo cada uma direito a voto; com o passar dos tempos (dado que Atenas mantinha um política agressiva), as cidades desinteressaram-se de arriscar homens e passaram a pagar unicamente dinheiro, ficando Atenas com a direcção total da liga, sem se incomodar em consultar os seus aliados que passavam progressivamente à condição de súbditos; Atenas passou também a imiscuir-se nos assuntos internos das cidades (chegando ao ponto da justiça ser administrada por juízes seus) e impondo o seu regime (democracia), o que levaria a imensos conflitos. Curiosamente, a autoritária Esparta, era muito mais tolerante: os membros da sua liga (liga do Peloponeso), podiam ter o regime que bem entendiam que Esparta não se ralava com isso, cada cidade fornecia tropas e dinheiro, mas dado que as guerras eram unicamente defensivas, estas não eram de facto consideradas um peso.
Para quem não sabe, Atenas possuía um regime democrático (de acordo com os critérios da época, que são os que interessam): filho de pai e mãe ateniense, independentemente da riqueza possuía a cidadania, o que lhe possibilitava concorrer a qualquer cargo. Estavam excluídos escravos, mulheres e estrangeiros (metecos). Serviço militar obrigatório para homens livres, Uma assembleia (eclesia), de que qualquer cidadão podia fazer parte, juízes, estrategas (conduziam política externa), arcontes (assuntos religiosos que tinham imenso prestígios). Uma população com aristocratas, comerciantes, artesãos, pequenos proprietários (Platão era nobre parente de Péricles, Sócrates era escultor).
Esparta pelo contrário tinha um regime estranho: dois reis com a direcção militar e religiosa, éforos (que possuíam o que chamaríamos o poder executivo em tempo de paz, e daí serem avessos à guerra que favoreciam os reis) e uma assembleia. A população era composta por cidadãos que tinham uma educação extremamente rigorosa e austera levando a resistência à dor ao limite (a famosa educação espartana), mas com um número de cidadãos cada vez mais em declínio (baixa natalidade, movimento social que levava à concentração das terras em favor de uns poucos e faziam perder outros as suas terras) chamados os “iguais”, os “periecos”- cidadãos que tinham perdido as suas terras ficando sem o seu estatuto, e os famosos ilotas- descendentes dos antigos habitantes da região tendo um estatuto terrível (qualquer igual os podia matar como exercício de treino- em compensação os espartanos tinham um pavor das suas revoltas).
A guerra começou como muitas outras com um insignificante incidente, tendo raízes profundas.
Atenas criara em consequência das guerras médicas uma aliança defensiva, a liga de Delos (ou confederação ateniense). Cada cidade deveria fornecer tropas, barcos e dinheiro de acordo com as suas possibilidades, tendo cada uma direito a voto; com o passar dos tempos (dado que Atenas mantinha um política agressiva), as cidades desinteressaram-se de arriscar homens e passaram a pagar unicamente dinheiro, ficando Atenas com a direcção total da liga, sem se incomodar em consultar os seus aliados que passavam progressivamente à condição de súbditos; Atenas passou também a imiscuir-se nos assuntos internos das cidades (chegando ao ponto da justiça ser administrada por juízes seus) e impondo o seu regime (democracia), o que levaria a imensos conflitos. Curiosamente, a autoritária Esparta, era muito mais tolerante: os membros da sua liga (liga do Peloponeso), podiam ter o regime que bem entendiam que Esparta não se ralava com isso, cada cidade fornecia tropas e dinheiro, mas dado que as guerras eram unicamente defensivas, estas não eram de facto consideradas um peso.
Para quem não sabe, Atenas possuía um regime democrático (de acordo com os critérios da época, que são os que interessam): filho de pai e mãe ateniense, independentemente da riqueza possuía a cidadania, o que lhe possibilitava concorrer a qualquer cargo. Estavam excluídos escravos, mulheres e estrangeiros (metecos). Serviço militar obrigatório para homens livres, Uma assembleia (eclesia), de que qualquer cidadão podia fazer parte, juízes, estrategas (conduziam política externa), arcontes (assuntos religiosos que tinham imenso prestígios). Uma população com aristocratas, comerciantes, artesãos, pequenos proprietários (Platão era nobre parente de Péricles, Sócrates era escultor).
Esparta pelo contrário tinha um regime estranho: dois reis com a direcção militar e religiosa, éforos (que possuíam o que chamaríamos o poder executivo em tempo de paz, e daí serem avessos à guerra que favoreciam os reis) e uma assembleia. A população era composta por cidadãos que tinham uma educação extremamente rigorosa e austera levando a resistência à dor ao limite (a famosa educação espartana), mas com um número de cidadãos cada vez mais em declínio (baixa natalidade, movimento social que levava à concentração das terras em favor de uns poucos e faziam perder outros as suas terras) chamados os “iguais”, os “periecos”- cidadãos que tinham perdido as suas terras ficando sem o seu estatuto, e os famosos ilotas- descendentes dos antigos habitantes da região tendo um estatuto terrível (qualquer igual os podia matar como exercício de treino- em compensação os espartanos tinham um pavor das suas revoltas).
quarta-feira, novembro 10, 2004
Evolução de coçar a cabeça
Uma pesquisa sobre o ADN de piolhos efectuada pelas Universidades do Utah e da Florida revela que exitem dois tipos piolhos humanos geneticamente distintos, que podem fornecer pistas sobre a árvore geneológica da evolução humana. O primeiro tipo de piolho, encontrado em todo o mundo evolui nos nossos antepassados Sapiens, enquanto que o segundo, actualmente só encontrado no continete americano, evolui noutra espécie Homo, que os pesquisadores acreditam ser o Homo Erectus. A análise às mutações do ADN dos piolhos revelou que estes dois tipos divergiram à cerca de 1.18 milhões de anos. Ora, como os humanos divergiram por volta do mesmo tempo, 1.2 milhões de anos, isto parece indicar que cada variedade de piolho infestou uma espécie diferente de humanos. Estas diferenças só fazem sentido se este dois grupos não interagissem por um periodo não inferior a um milhão de anos, para que não existisse qualquer miscisginação e para as diferenças serem tão visíveis. Assim os melhores grupos de hospedeiros seriam a linhage, que saiu de África mais cedo, evoluíndo para o H. erectus, e o que ficou para trás, evoluindo eventualmente para o H. sapiens.
O cientistas pensam que os piolhos que gantes se alimentavam exclusivamente em Homo erectus saltaram para os Homo Sapiens em contactos ocorridos na Ásia entre 25 mil a 30 mil anos atrás. Segundo eles, os H. erectus poderiam estar extintos, mas os seus piolhos não estavam, pelo que os piolhos tiveram de passar para o H. Sapiens antes do H. Erectus se extingir, já que os piolhos não sobrevivem mais de 24 horas fora do corpo do hóspede. Quanto à forma de propagação entre Sapiens e Erectus, estes poderão ter sido através de lutas, troca de roupas, actos de canibalismo ou mesmo por procriação.
No entanto, um especialista na área de pesquisa de ADN, pensa que o ADN mitocondrial dos piolhos divergiu à 300 mil anos, data muito diferente da pesquisa anterior, defendendo que a nossa espécie nunca contactaram com Homo Erectus. Segundo ele, o Pediculus humanus (piolho corporal) é um dos agentes patogénicos mais facilmente tramissíveis, pelo que poderia transmitir-se entre espécies diferentes sem contacto directo, tal como acontece com os piolhos avícolas.
No entanto novas respostas relativas a contactos entre sapiens-erectus devem surgir devido ao futuro estudo de piolhos púbicos, que se transmitem normalmente por via de contactos sexuais, o trará luz à questão dos possíveis contactos sexuais entre estas duas éspecies do género Homo.
(Jornal Público)
O cientistas pensam que os piolhos que gantes se alimentavam exclusivamente em Homo erectus saltaram para os Homo Sapiens em contactos ocorridos na Ásia entre 25 mil a 30 mil anos atrás. Segundo eles, os H. erectus poderiam estar extintos, mas os seus piolhos não estavam, pelo que os piolhos tiveram de passar para o H. Sapiens antes do H. Erectus se extingir, já que os piolhos não sobrevivem mais de 24 horas fora do corpo do hóspede. Quanto à forma de propagação entre Sapiens e Erectus, estes poderão ter sido através de lutas, troca de roupas, actos de canibalismo ou mesmo por procriação.
No entanto, um especialista na área de pesquisa de ADN, pensa que o ADN mitocondrial dos piolhos divergiu à 300 mil anos, data muito diferente da pesquisa anterior, defendendo que a nossa espécie nunca contactaram com Homo Erectus. Segundo ele, o Pediculus humanus (piolho corporal) é um dos agentes patogénicos mais facilmente tramissíveis, pelo que poderia transmitir-se entre espécies diferentes sem contacto directo, tal como acontece com os piolhos avícolas.
No entanto novas respostas relativas a contactos entre sapiens-erectus devem surgir devido ao futuro estudo de piolhos púbicos, que se transmitem normalmente por via de contactos sexuais, o trará luz à questão dos possíveis contactos sexuais entre estas duas éspecies do género Homo.
(Jornal Público)
quarta-feira, novembro 03, 2004
Notícias de Portugal
Hoje vou passar para um tema completamente diferente do que habitualmente abordo: o Portugal contemporâneo.
Recentemente conversei com uma pessoa mais velha oriunda do campo, e fiquei tão interessado na descrição que me fez do seu mundo, que não resisti a escrever alguns dos temas da conversa.
Essa pessoa pertencia a uma família de caseiros. O seu avô fora um jornaleiro (trabalhava as terras de outrem em troca de um salário por dia de trabalho); o pai, depois de imensos anos conseguiu comprar uma junta de bois, algumas alfaias agrícolas e deste modo tornar-se um caseiro. Para quem não sabe o que significa, os caseiros eram pessoas que combinavam cultivar uma terra de um proprietário por um determinado período (1, 2, ou mais anos), em troca de uma renda (que para determinados produtos era em quantidade fixa, para outras era percentual).
Numa das propriedades, o Sr. X (chamemos-lhe assim) a principal produção era de milho e deviam entregar 9000 litros de milho; mais uma determinada quantidade de cebolas, frutas, e metade do vinho; caso não conseguissem atingir a quantidade acordada, teriam de comprar milho para entregar. E se a colheita corresse bem? Bem, a resposta deixou-me espantado: o regedor (uma espécie de funcionário local) observava a quantidade que sobrava ao caseiro (depois de ter sido pago ao proprietário o estipulado) e podia retirar o excesso em proveito do governo (o argumento invocado, é que era utilizado em favor dos mais pobres, mas quando lhe perguntei se alguma vez recebeu alguma coisa em maus anos, e tiveram de facto maus anos passando fome, deu-me uma resposta negativa), deixando unicamente aquilo que seria suficiente para o seu sustento e da sua família (ainda gostava de saber se isso era um imposto, ou uma requisição-o que era mais provável dado que a quantidade dependia da vontade do regedor, embora pareça roubo puro e simples a coberto de qualquer esquema legal).
Ora os caseiros também não eram idiotas, e o que faziam era esconder o excesso, deixando apenas à mostra o suficiente para comerem para mostrar como o ano era mau; o regedor partia sempre do princípio de que estavam a mentir e retirava uma parte do que estava à mostra. De qualquer modo, a parte que já era entregue ao proprietário era muito elevada, e apenas dava para manter o que tinham, sendo impossível sonhar com adquirir uma propriedade própria (de qualquer modo, a sua sorte era muito mais invejável que a dos jornaleiros, dado que estes só recebiam quando trabalhavam, e nas épocas mortas nada tinham). Os caseiros eram obrigados a contratar jornaleiros em determinadas alturas (como nas colheitas); os diferentes caseiros acordavam entre si quando os jornaleiros trabalhavam em que propriedade (para evitar que sendo muitos poucos em cada terreno, não se efectuasse o trabalho a tempo). Quando era terminada a tarefa, no último dia efectuava-se uma festa, em que quem tivesse um instrumento tocava, e os outros dançavam e cantavam. Era uma vida difícil (trabalhando de sol-a-sol), mas o Sr. X disse-me que preferia essa vida, pois era mais alegre que a vida e trabalho de cidade.
Se descobrir mais coisas interessantes (e tenho a certeza que sim) irei coloca-las aqui.
Recentemente conversei com uma pessoa mais velha oriunda do campo, e fiquei tão interessado na descrição que me fez do seu mundo, que não resisti a escrever alguns dos temas da conversa.
Essa pessoa pertencia a uma família de caseiros. O seu avô fora um jornaleiro (trabalhava as terras de outrem em troca de um salário por dia de trabalho); o pai, depois de imensos anos conseguiu comprar uma junta de bois, algumas alfaias agrícolas e deste modo tornar-se um caseiro. Para quem não sabe o que significa, os caseiros eram pessoas que combinavam cultivar uma terra de um proprietário por um determinado período (1, 2, ou mais anos), em troca de uma renda (que para determinados produtos era em quantidade fixa, para outras era percentual).
Numa das propriedades, o Sr. X (chamemos-lhe assim) a principal produção era de milho e deviam entregar 9000 litros de milho; mais uma determinada quantidade de cebolas, frutas, e metade do vinho; caso não conseguissem atingir a quantidade acordada, teriam de comprar milho para entregar. E se a colheita corresse bem? Bem, a resposta deixou-me espantado: o regedor (uma espécie de funcionário local) observava a quantidade que sobrava ao caseiro (depois de ter sido pago ao proprietário o estipulado) e podia retirar o excesso em proveito do governo (o argumento invocado, é que era utilizado em favor dos mais pobres, mas quando lhe perguntei se alguma vez recebeu alguma coisa em maus anos, e tiveram de facto maus anos passando fome, deu-me uma resposta negativa), deixando unicamente aquilo que seria suficiente para o seu sustento e da sua família (ainda gostava de saber se isso era um imposto, ou uma requisição-o que era mais provável dado que a quantidade dependia da vontade do regedor, embora pareça roubo puro e simples a coberto de qualquer esquema legal).
Ora os caseiros também não eram idiotas, e o que faziam era esconder o excesso, deixando apenas à mostra o suficiente para comerem para mostrar como o ano era mau; o regedor partia sempre do princípio de que estavam a mentir e retirava uma parte do que estava à mostra. De qualquer modo, a parte que já era entregue ao proprietário era muito elevada, e apenas dava para manter o que tinham, sendo impossível sonhar com adquirir uma propriedade própria (de qualquer modo, a sua sorte era muito mais invejável que a dos jornaleiros, dado que estes só recebiam quando trabalhavam, e nas épocas mortas nada tinham). Os caseiros eram obrigados a contratar jornaleiros em determinadas alturas (como nas colheitas); os diferentes caseiros acordavam entre si quando os jornaleiros trabalhavam em que propriedade (para evitar que sendo muitos poucos em cada terreno, não se efectuasse o trabalho a tempo). Quando era terminada a tarefa, no último dia efectuava-se uma festa, em que quem tivesse um instrumento tocava, e os outros dançavam e cantavam. Era uma vida difícil (trabalhando de sol-a-sol), mas o Sr. X disse-me que preferia essa vida, pois era mais alegre que a vida e trabalho de cidade.
Se descobrir mais coisas interessantes (e tenho a certeza que sim) irei coloca-las aqui.
quinta-feira, outubro 28, 2004
Última hora!
Parece que foram encontrados fósseis de hominídeos numa ilha da indonésia com características muito arcaicas (entre o austrolopiteco e homo erectus), com... 13.000 anos. Se estes Homo floresiensis de facto existiram é uma descoberta fantástica: que uma população pré-humana tivesse aguentado até a um tempo tão recente (parece que existem na ilha estórias de uma população de símios com caracteristicas de bipedismo que ainda lá andam, mas seria demasiada coincidência, ou podem apenas ser uma espécie de macacos desconhecidos). Tenho de apanhar um exemplar da nature: vi uma fotografia de um cranio num site, mas nos dias de hoje, isso pouco significa.
segunda-feira, outubro 25, 2004
Jogo Musical-VII
Para novo género musical, escolhi o Tango. Intérprete: Carlos Gardel (1890-1935). Música: Mi noche triste.
O Tango é um estilo que tal como outros da América, é de discutível origem. Provavelmente baseado em temas cantados pelos imigrantes italianos na argentina, misturado com música creoula, era tocado em bares frequentados por marinheiros, dançado nos bordeis até se espalhar pelas ruas populares. Quando as elites aceitaram-no, já era a música nacional. O tango fala de amor, da perda do objecto amado, do desgosto. Com o tempo surgiram diferentes tipos de tango, internacionalizou-se, de instrumental passou também a ser cantado, foi transformado em dança de salão respeitável (tal como a valsa, a salsa e quase tudo o que se dança fora de uma discoteca).
Carlos Gardel era filho de emigrantes franceses. Começou a cantar em bares músicas populares, até que decidiu cantar temas de tango (que até então como disse eram apenas instrumentais). Com “Mi noche triste” em 1917 obteve um sucesso retumbante por toda a América latina, que se prolongou nas décadas de 20 e 30, participando mesmo em filmes; morreu no auge da fama num acidente de avião (quem pensa que as mortes trágicas de ídolos da música foram inventados pelas estrelas do rock nos anos 50, poderia apanhar uma grande desilusão).
Infelizmente não consegui arranjar um "sample" dessa música (embora já a tenha ouvido) e portanto terão de contentar com outros êxitos.
http://www.amazon.com/exec/obidos/tg/detail/-/B000001H8X/qid=1098719344/sr=1-21/ref=sr_1_21/002-0574681-6592811?v=glance&s=music
O Tango é um estilo que tal como outros da América, é de discutível origem. Provavelmente baseado em temas cantados pelos imigrantes italianos na argentina, misturado com música creoula, era tocado em bares frequentados por marinheiros, dançado nos bordeis até se espalhar pelas ruas populares. Quando as elites aceitaram-no, já era a música nacional. O tango fala de amor, da perda do objecto amado, do desgosto. Com o tempo surgiram diferentes tipos de tango, internacionalizou-se, de instrumental passou também a ser cantado, foi transformado em dança de salão respeitável (tal como a valsa, a salsa e quase tudo o que se dança fora de uma discoteca).
Carlos Gardel era filho de emigrantes franceses. Começou a cantar em bares músicas populares, até que decidiu cantar temas de tango (que até então como disse eram apenas instrumentais). Com “Mi noche triste” em 1917 obteve um sucesso retumbante por toda a América latina, que se prolongou nas décadas de 20 e 30, participando mesmo em filmes; morreu no auge da fama num acidente de avião (quem pensa que as mortes trágicas de ídolos da música foram inventados pelas estrelas do rock nos anos 50, poderia apanhar uma grande desilusão).
Infelizmente não consegui arranjar um "sample" dessa música (embora já a tenha ouvido) e portanto terão de contentar com outros êxitos.
http://www.amazon.com/exec/obidos/tg/detail/-/B000001H8X/qid=1098719344/sr=1-21/ref=sr_1_21/002-0574681-6592811?v=glance&s=music
terça-feira, outubro 19, 2004
Boa educação
No século XIII, um manual anglo-normando de etiqueta dizia que sempre que um nobre fazia amor com uma camponesa devia usar uma quantidade moderada de força: assim, ela poderia argumentar que fora violada (e evitar ser corrida de casa pelo marido ou pais); claro que se partia do princípio que ela concordava e este subterfúgio apenas servia para manter as aparências (violações a sério não eram sequer consideradas no manual).
terça-feira, outubro 12, 2004
Reconstituições
Encontrei este site e não podia deixar de colocar o link; mesmo que não tenham forma de garantir a autenticidade, soa bem http://www.oeaw.ac.at/kal/sh/ .
segunda-feira, outubro 11, 2004
Justiça Poética
Na Grécia clássica, existia uma história sobre os riscos de ser-se mercador de escravos. Uma criança que fora castrada e vendida para a corte Persa tornou-se um poderoso funcionário. Ora um dia, foi-lhe apresentado um homem que cometera um delito contra a lei: era nem mais nem menos do que o homem que o comprara, castrara e vendera. Como castigo, o eunuco mandou-o castrar assim como a todos os seus filhos. A profissão de mercador de escravos era legal, mas de facto não era muito bem vista (e ainda pior castrar crianças).
quinta-feira, outubro 07, 2004
Kepler
Este fim-de-semana estive a ler umas coisas sobre Kepler (1571-1630). Levou uma vida conturbada (também o séc. XVII não foi uma época fácil). Estudou na universidade, deu aulas (embora tivesse poucos alunos), trabalhou com o mais famoso astrólogo da época (Tycho) que também se dedicava à observação astronómica, mas por ser protestante, acabou mais tarde por ter de abandonar a corte imperial, com o progressivo endurecimento face aos protestantes. A mãe que ganhava a vida a fazer umas mezinhas quase que ia sendo queimada por bruxaria; uma falha no procedimento legal da aplicação da tortura foi o que a salvou. Dedicando-se à astronomia e usando a matemática, acabou por recusar o sistema preconizado por Ptolomeu (uns bons 1500 anos antes) utilizando o de Copérnico, criando as 3 leis de Kepler. No final da vida ganhava a vida a fazer horóscopos a Wallenstein, o melhor estratega católico na época da guerra dos 30 anos.
sexta-feira, outubro 01, 2004
Perseguições-II
Para equilibrar as coisas, vou referir um caso que se passou nos E.U.A. (também na II Guerra Mundial). Com o ataque de Pearl Harbour, boa parte da comunidade Japonesa, ou de origem Japonesa foi "internada" em campos para evitar possíveis actos de sabotagem. Poderiamos dizer que foi um reflexo natural da guerra contra o Eixo se não fosse o caso da comunidade Italo-Americana e Germano-Americana não terem sido incomodados; afirmou-se que foi um acto nítido de racismo, mas provavelmente a explicação é outra: a alemanha e itália declararam guerra segundo as regras enquanto que o Japão atacou de uma forma considerada traiçoeira e ao destruir a frota feriu o amor-próprio americano; os nipo-japoneses teriam sido deste modo o bode expiatório. Dado que muitos tinham carreiras construídas (como médicos ou comerciantes), estar durante anos presos, arruínou-lhes as carreiras.
segunda-feira, setembro 27, 2004
Perseguições
Nas vésperas da II Guerra Mundial, Estaline interrogava-se sobre o possível perigo que representaria a comunidade alemã na URSS de quase um milhão de pessoas, no caso de uma invasão nazi. Béria (chefe do NKVD, futura KGB) decidiu colocá-los à prova: enviou perto de 6000 agentes disfarçados de espiões alemães. Só menos de 10, não foram denunciados; concluí-se que a comunidade alemã representava um perigo e decidiu-se deportá-los. para a sibéria. Estando aí, achou-se que eles não representavam perigo e foram deixados no meio da tundra (sem alimentos ou abrigos- existem de facto coisas piores do que ser internado num campo de concentração). Boa parte deles morreu no primeiro inverno. Os sobreviventes dos descendentes estão actulamente a emigrar para a Suiça alemã (o único país que lhes reconhece o estatuto de etnia germânica). Para a próxima, conto uma estória sobre os E.U.A. para equilibrar as coisas.
terça-feira, setembro 21, 2004
Coreia do Norte
Estes últimos tempos têm sido muito atarefados, e por isso não tenho tido tempo para escrever. No entanto, fiz uma leitura este fim-de-semana que não podia deixar de referir, apesar de abordar assuntos que não aprecio muito (história contemporânea). Em casa dos meus pais, tenho em 6 volumes, uma série de discursos de Kim-Il-Sung; este fim-de-semana aproveitei para ler uma parte de um deles (referente ao ano de 1976).
Um dos discursos que mais me chamou à atenção, foi proferido perante um comité de representantes de agricultores (o nome oficial é diferente). O discurso começa com uma parte retórica (o capitalismo está a cair, o socialismo está cada vez mais forte, as massas oprimidas por todo o mundo irão levantar-se contra os exploradores, etc, etc). Depois temos uma parte referente à situação económica nacional (mais retórica: nunca se viveu tão bem na correia do norte, os resultados económicos são excelentes, etc). Finalmente temos a análise da situação que de facto interessa: neste caso, as dificuldades sentidas na agricultura. Aqui, temos uma análise fria e relativamente realista da situação. Em várias províncias, as colheitas de arroz e milho (o livro é uma tradução espanhola, e creio que o cereal era de facto este) tinham sido inferiores ao esperado. As justificações são várias: excepcional mau ano agrícola, mas sobretudo descoordenação entre vários ministérios, departamentos e organismos. Eu contei os que foram referidos: 5 pelo menos (um para planificar o ano agrícola, outro para fornecer máquinas, outro para adubos, e não me lembro dos outros). Kim-Il-Sung queixava-se também de que os funcionários do ministério da agricultura planificavam as estimativas das colheitas, as necessidades de material, e todos os pormenores, sem se preocupar em falar com os camponeses (ou melhor, com os chefes das cooperativas), o que dava mau resultado; eram demasiado burocráticos, não se conseguindo coordenar entre si (os funcionários); para dar resposta às necessidades em tempo útil da agricultura quando viam que era necessária mão-de-obra extra para outras actividades, desviavam-na da agricultura, atrasando o transplante do arroz (deitando assim a colheita a perder), ou transferindo operários para essa tarefa (sem lhes dar informação de como efectuar os trabalhos piorando a situação) desorganizando outros serviços, sem se preocupar em saber quantas pessoas eram necessárias. A substituição de máquinas e peças era também bastante complicada, dada a escassez de materiais do país e a desorganização dos serviços. No entanto (por motivos ideológicos provavelmente), nunca reconheceu, que as falhas de produtividades da agricultura poderiam ser remediadas, centralizando todos os assuntos relacionados com a agricultura num único ministério (e organismos por si dependentes), em vez de os ter partilhados por vários, já que deixar que fossem os próprios camponeses tratassem dos seus assuntos estava fora de questão. À medida que for lendo sobre outros assuntos, irei escrever mais.
Um dos discursos que mais me chamou à atenção, foi proferido perante um comité de representantes de agricultores (o nome oficial é diferente). O discurso começa com uma parte retórica (o capitalismo está a cair, o socialismo está cada vez mais forte, as massas oprimidas por todo o mundo irão levantar-se contra os exploradores, etc, etc). Depois temos uma parte referente à situação económica nacional (mais retórica: nunca se viveu tão bem na correia do norte, os resultados económicos são excelentes, etc). Finalmente temos a análise da situação que de facto interessa: neste caso, as dificuldades sentidas na agricultura. Aqui, temos uma análise fria e relativamente realista da situação. Em várias províncias, as colheitas de arroz e milho (o livro é uma tradução espanhola, e creio que o cereal era de facto este) tinham sido inferiores ao esperado. As justificações são várias: excepcional mau ano agrícola, mas sobretudo descoordenação entre vários ministérios, departamentos e organismos. Eu contei os que foram referidos: 5 pelo menos (um para planificar o ano agrícola, outro para fornecer máquinas, outro para adubos, e não me lembro dos outros). Kim-Il-Sung queixava-se também de que os funcionários do ministério da agricultura planificavam as estimativas das colheitas, as necessidades de material, e todos os pormenores, sem se preocupar em falar com os camponeses (ou melhor, com os chefes das cooperativas), o que dava mau resultado; eram demasiado burocráticos, não se conseguindo coordenar entre si (os funcionários); para dar resposta às necessidades em tempo útil da agricultura quando viam que era necessária mão-de-obra extra para outras actividades, desviavam-na da agricultura, atrasando o transplante do arroz (deitando assim a colheita a perder), ou transferindo operários para essa tarefa (sem lhes dar informação de como efectuar os trabalhos piorando a situação) desorganizando outros serviços, sem se preocupar em saber quantas pessoas eram necessárias. A substituição de máquinas e peças era também bastante complicada, dada a escassez de materiais do país e a desorganização dos serviços. No entanto (por motivos ideológicos provavelmente), nunca reconheceu, que as falhas de produtividades da agricultura poderiam ser remediadas, centralizando todos os assuntos relacionados com a agricultura num único ministério (e organismos por si dependentes), em vez de os ter partilhados por vários, já que deixar que fossem os próprios camponeses tratassem dos seus assuntos estava fora de questão. À medida que for lendo sobre outros assuntos, irei escrever mais.
segunda-feira, setembro 13, 2004
11 de Setembro
Foi nessa data em 1609 que foi ordenada a expulsão dos mouriscos de Valência, seguindo-se depois por toda a Espanha (o decreto original para expulsão é um pouco anterior).
Quando em 1492 Granada foi conquistada pelos reis Católicos (Fernando e Isabel, os futuros patrocinadores de Cristóvão Colombo), aos muçulmanos fora-lhes garantido num tratado o direito a manter a sua religião, hábitos e costumes. No entanto rapidamente os seus direitos começaram a ser cerceados o que os levou a revoltarem-se; tal foi o pretexto para lhes retirarem tudo o que fora acordado, exigindo-se-lhes a conversão. De facto, o que se pretendia na península ibérica era ter um reino, um povo e uma religião; a existência de minorias estragava esse panorama (Portugal também, mas isso é outra história). Continuaram a praticar a religião em segredo e os períodos de perseguição (com a inquisição) e revoltas (isso levou Guilherme de Orange a aperceber-se de que se um punhado de camponeses conseguia pôr em xeque a poderosa Espanha, as terras da Flandres muito mais ricas deveriam ter boas hipóteses de se tornar independentes), alternavam com uma relativa tolerância (eles viviam no sul e as suas terras pertenciam a membros da grande nobreza que os apreciavam pela sua capacidade de trabalho e por isso os protegiam). Depois de um endurecimento de posições (eram acusados de ajudar a pirataria muçulmana e outras traições), acabaram por receber ordem de expulsão. Assim terminava uma presença que se iniciara em 711, e o sonho do Al-Andalus.
Quando em 1492 Granada foi conquistada pelos reis Católicos (Fernando e Isabel, os futuros patrocinadores de Cristóvão Colombo), aos muçulmanos fora-lhes garantido num tratado o direito a manter a sua religião, hábitos e costumes. No entanto rapidamente os seus direitos começaram a ser cerceados o que os levou a revoltarem-se; tal foi o pretexto para lhes retirarem tudo o que fora acordado, exigindo-se-lhes a conversão. De facto, o que se pretendia na península ibérica era ter um reino, um povo e uma religião; a existência de minorias estragava esse panorama (Portugal também, mas isso é outra história). Continuaram a praticar a religião em segredo e os períodos de perseguição (com a inquisição) e revoltas (isso levou Guilherme de Orange a aperceber-se de que se um punhado de camponeses conseguia pôr em xeque a poderosa Espanha, as terras da Flandres muito mais ricas deveriam ter boas hipóteses de se tornar independentes), alternavam com uma relativa tolerância (eles viviam no sul e as suas terras pertenciam a membros da grande nobreza que os apreciavam pela sua capacidade de trabalho e por isso os protegiam). Depois de um endurecimento de posições (eram acusados de ajudar a pirataria muçulmana e outras traições), acabaram por receber ordem de expulsão. Assim terminava uma presença que se iniciara em 711, e o sonho do Al-Andalus.
sexta-feira, setembro 10, 2004
Akhenaton-II
Mandou construir a cidade Akhetaten, do nome da divindade (conhecida actualmente como Tel-El-Amarna, o seu nome árabe) para se afastar do clero tradicional e honrar o seu deus. A arte egípcia tornou-se de algum modo mais realista (o retrato de Nefertiti, as deformações e deficiências das pessoas não eram escondidas nos retratos). Mas enquanto mantinha o seu zelo religioso, esquecia-se do mundo temporal: os territórios dos pequenos potentados ao serviço do Egipto iam sendo conquistados pelos Hititas. Sabemos da situação, porque uma extensa correspondência diplomática do Egipto conservou-se numa parte do palácio (a língua usada era o acádico e eram gravadas em tabuinhas). Eis o excerto de uma carta:
“Eu escrevi repetidamente por tropas, mas nenhumas me foram concedidas, e o rei não ouviu as palavras do seu servo. E enviei um mensageiro para o palácio mas ele voltou de mãos vazias- ele não trouxe tropas”.
Ao fim de alguns anos morreu de forma algo controversa (ainda se está para descobrir a sua múmia, apesar de alguns arqueólogos dizerem que ela foi encontrada), sendo sucedido por Tutenkamon (sim, o do túmulo da maldição: provavelmente era um meio irmão de Akhenaton que casou com uma filha deste, morrendo aos 18 anos). A religião tradicional foi restabelecida, o palácio abandonado e a Akhetaten destruída (o que paradoxalmente salvou-a, pois ficaram os alicerces e materiais que teriam sido destruídos, caso se continuasse a construir por cima), e o nome de Akhenaton foi martelado das inscrições e votado à maldição. No entanto, o seu acto revolucionário (fanático ou inovador conforme as preferências), tornou-o relativamente popular perante o auditório moderno, fazendo-se filmes e mesmo uma ópera sobre ele.
“Eu escrevi repetidamente por tropas, mas nenhumas me foram concedidas, e o rei não ouviu as palavras do seu servo. E enviei um mensageiro para o palácio mas ele voltou de mãos vazias- ele não trouxe tropas”.
Ao fim de alguns anos morreu de forma algo controversa (ainda se está para descobrir a sua múmia, apesar de alguns arqueólogos dizerem que ela foi encontrada), sendo sucedido por Tutenkamon (sim, o do túmulo da maldição: provavelmente era um meio irmão de Akhenaton que casou com uma filha deste, morrendo aos 18 anos). A religião tradicional foi restabelecida, o palácio abandonado e a Akhetaten destruída (o que paradoxalmente salvou-a, pois ficaram os alicerces e materiais que teriam sido destruídos, caso se continuasse a construir por cima), e o nome de Akhenaton foi martelado das inscrições e votado à maldição. No entanto, o seu acto revolucionário (fanático ou inovador conforme as preferências), tornou-o relativamente popular perante o auditório moderno, fazendo-se filmes e mesmo uma ópera sobre ele.
terça-feira, setembro 07, 2004
Akhenaton-I
Recentemente ofereceram-me em CD a ópera “Akhnaten” de Philip Glass; parece-me um bom pretexto para fazer um post.
Amenófis IV pertencia aquilo que se considera a XVIII dinastia (um sistema bastante artificial mas prático de divisão). Essa dinastia levara o Egipto ao zénite do seu poder depois da dominação dos Hicsos (um povo vindo da Ásia). Boa parte do médio oriente estava sob a sua influência, estabelecendo pequenos reis que enviavam tributos e forneciam tropas; para sul, o Sudão era explorado nas riquezas (ouro, lápis-lazuli); também eram efectuadas trocas comerciais com toda a bacia do mediterrâneo. Enfim, foi uma excelente época para o país do Nilo. As velhas divindades continuavam a ser honradas, embora se destacasse Ámon e sobretudo o seu clero na riqueza.
Quando o novo faraó (Amenófis IV) subiu ao trono, decidiu alterar a tradição: de ora em diante, só se adoraria uma divindade, Aton (o termo significara até então o disco solar físico- o sol- por oposição à divindade que era Ámon); mudou o seu nome para Akhenaton (o servidor de Aton), considerando que as restantes divindades eram falsas, e proibindo o seu culto (estabelecendo-se assim a primeira religião monoteísta, pelo menos aparentemente). Akhenaton seria o seu profeta e divulgador na terra, não se considerando uma divindade (os faraós até então tinham sido considerados deuses, mesmo que menores em relação a outros do panteão).
Amenófis IV pertencia aquilo que se considera a XVIII dinastia (um sistema bastante artificial mas prático de divisão). Essa dinastia levara o Egipto ao zénite do seu poder depois da dominação dos Hicsos (um povo vindo da Ásia). Boa parte do médio oriente estava sob a sua influência, estabelecendo pequenos reis que enviavam tributos e forneciam tropas; para sul, o Sudão era explorado nas riquezas (ouro, lápis-lazuli); também eram efectuadas trocas comerciais com toda a bacia do mediterrâneo. Enfim, foi uma excelente época para o país do Nilo. As velhas divindades continuavam a ser honradas, embora se destacasse Ámon e sobretudo o seu clero na riqueza.
Quando o novo faraó (Amenófis IV) subiu ao trono, decidiu alterar a tradição: de ora em diante, só se adoraria uma divindade, Aton (o termo significara até então o disco solar físico- o sol- por oposição à divindade que era Ámon); mudou o seu nome para Akhenaton (o servidor de Aton), considerando que as restantes divindades eram falsas, e proibindo o seu culto (estabelecendo-se assim a primeira religião monoteísta, pelo menos aparentemente). Akhenaton seria o seu profeta e divulgador na terra, não se considerando uma divindade (os faraós até então tinham sido considerados deuses, mesmo que menores em relação a outros do panteão).
sexta-feira, setembro 03, 2004
Os princípios de um exército-IV
Quando se compara todo amadorismo com o lado alemão, fica-se espantado por terem vencido. Os alemães combatiam como equipas, sem rivalidades entre as várias armas. Utilizavam os recursos de forma parcimoniosa, procurando explorar o terreno, fraquezas observadas, fazendo muitas manobras de envolvimento (evitando os ataques frontais, tão custosos em vidas humanas).
É certo que o autor lhes aponta imensas falhas, apesar de reconhecer a sua superioridade táctica e estratégica. Por exemplo, em Kasserine um destacamento blindado alemão que perfurara as linhas aliadas durante a noite, avançou cautelosamente embora não existissem tropas em frente de modo que quando de manhã retomaram a marcha a toda a velocidade já se tinha formado uma linha de defesa, que conseguiu atrasa-los; segundo o autor a exploração dessa brecha durante a noite teria permitido varrer as linhas aliadas num buraco de uma centena de kilómetros que poderia ter provocado (seguindo o resto do exército alemão) o desmoronamento de toda a frente (dado que os tanques americanos tinham acabado de ser destruídos e se estava a dar um movimento de pânico e de retirada das tropas por moto próprio, para não dizer deserção e fuga pura e simples). Ora para mim essa visão tem vários problemas: primeiro, os alemães não sabiam que o adversário fugira, e andar a toda a velocidade de noite sem fazer reconhecimentos pode dar mau resultado; depois, os alemães tinham de ser necessariamente cautelosos, pois as suas perdas eram muito difíceis de substituir, enquanto os aliados podiam-se dar ao luxo de perder unidades e equipamento sem problemas, que existia sempre mais há disposição (e se não era assim, agiam dessa maneira). E mesmo que o destacamento tivesse avançado, os aliados teriam colocado qualquer coisa no caminho, nem que fossem os cozinheiros e pessoal administrativo armados de pistolas como sucedeu em outras ocasiões, além de sofrerem de limitações de combustível e abastecimentos que não lhes permitiriam dar “passeios” de centenas de km à sua vontade. Além de que os ingleses do VIII exército não estavam assim tão longe, e Montgomery não teria perdido uma ocasião dessas para “brilhar” salvando os americanos. Kasserine foi um brilhante feito das armas alemãs em si mesmo, e esperar que os comandantes façam tudo correcto sem terem as informações necessárias é um pouco abusivo (mesmo que o adversário faça tudo mal, como foi o caso).
O maior problema do eixo, foi fruto do regime nazi: tinham um comando repartido ente 3 figuras, entre Rommel, Kesselring e Von Armin, cada um com a seu esfera de domínio, obrigando-os constantemente a debater entre si pela conduta a seguir. Embora fossem os três extremamente competentes (os dois primeiros sendo comandantes de primeiro plano), isso fazia-os perder tempo em vez de agirem imediatamente (e muitas vezes tendo as suas mensagens interceptadas pelos aliados graças à máquina Enigma). Isso foi ideia de Hitler que gostava de repartir os comandos, em vez de os unificar. As limitações que tinham de recursos (e sobretudo de reforços), obrigava-os a ser (como já referi) extremamente cautelosos, não arriscando mais do que o necessário (mesmo assim, eram mais audaciosos que os aliados).
É certo que o autor lhes aponta imensas falhas, apesar de reconhecer a sua superioridade táctica e estratégica. Por exemplo, em Kasserine um destacamento blindado alemão que perfurara as linhas aliadas durante a noite, avançou cautelosamente embora não existissem tropas em frente de modo que quando de manhã retomaram a marcha a toda a velocidade já se tinha formado uma linha de defesa, que conseguiu atrasa-los; segundo o autor a exploração dessa brecha durante a noite teria permitido varrer as linhas aliadas num buraco de uma centena de kilómetros que poderia ter provocado (seguindo o resto do exército alemão) o desmoronamento de toda a frente (dado que os tanques americanos tinham acabado de ser destruídos e se estava a dar um movimento de pânico e de retirada das tropas por moto próprio, para não dizer deserção e fuga pura e simples). Ora para mim essa visão tem vários problemas: primeiro, os alemães não sabiam que o adversário fugira, e andar a toda a velocidade de noite sem fazer reconhecimentos pode dar mau resultado; depois, os alemães tinham de ser necessariamente cautelosos, pois as suas perdas eram muito difíceis de substituir, enquanto os aliados podiam-se dar ao luxo de perder unidades e equipamento sem problemas, que existia sempre mais há disposição (e se não era assim, agiam dessa maneira). E mesmo que o destacamento tivesse avançado, os aliados teriam colocado qualquer coisa no caminho, nem que fossem os cozinheiros e pessoal administrativo armados de pistolas como sucedeu em outras ocasiões, além de sofrerem de limitações de combustível e abastecimentos que não lhes permitiriam dar “passeios” de centenas de km à sua vontade. Além de que os ingleses do VIII exército não estavam assim tão longe, e Montgomery não teria perdido uma ocasião dessas para “brilhar” salvando os americanos. Kasserine foi um brilhante feito das armas alemãs em si mesmo, e esperar que os comandantes façam tudo correcto sem terem as informações necessárias é um pouco abusivo (mesmo que o adversário faça tudo mal, como foi o caso).
O maior problema do eixo, foi fruto do regime nazi: tinham um comando repartido ente 3 figuras, entre Rommel, Kesselring e Von Armin, cada um com a seu esfera de domínio, obrigando-os constantemente a debater entre si pela conduta a seguir. Embora fossem os três extremamente competentes (os dois primeiros sendo comandantes de primeiro plano), isso fazia-os perder tempo em vez de agirem imediatamente (e muitas vezes tendo as suas mensagens interceptadas pelos aliados graças à máquina Enigma). Isso foi ideia de Hitler que gostava de repartir os comandos, em vez de os unificar. As limitações que tinham de recursos (e sobretudo de reforços), obrigava-os a ser (como já referi) extremamente cautelosos, não arriscando mais do que o necessário (mesmo assim, eram mais audaciosos que os aliados).
segunda-feira, agosto 30, 2004
Os princípios de um exército-III
A relação com os aliados era bastante conflituosa. O caso dos franceses é caricato.
Os franceses de Vichy depois de uma resistência acabaram por se passar para o seu lado. O general Gamelin, que nada representava para além de ele próprio (dado que as F.F.L. obedeciam a De Gaulle e os antigos seguidores de Vichy iam por Darlan), foi considerado como parceiro na coligação, mas ele exigiu “apenas” o lugar de comandante das forças aliadas dada a sua qualidade de general francês (que o colocava acima dos ingleses ou americanos). Inexplicavelmente, isso deu imensas dores de cabeça aos aliados, dado que eram estes que os equipavam e lhes forneciam as bases. Curiosamente, vemos já as sementes de conflitos futuros em germe: os franceses ao recuperar os seus territórios coloniais, trataram de se vingar dos colonos italianos e sobretudo dos árabes, com fuzilamentos de populações, prisões arbitrárias e detenção em campos de concentração de forma a chocar os seus aliados (que não eram propriamente meninos de coro por essa época). Por outro lado, os alemães tinham feito uma intensa propaganda, associando os americanos com os Judeus, dizendo que estes procuravam destruir a religião e cultura muçulmana.
Os ingleses consideravam que os americanos eram infantis, pouco competentes na arte da guerra e maus soldados, acabando por boicotar as suas iniciativas.
Os franceses de Vichy depois de uma resistência acabaram por se passar para o seu lado. O general Gamelin, que nada representava para além de ele próprio (dado que as F.F.L. obedeciam a De Gaulle e os antigos seguidores de Vichy iam por Darlan), foi considerado como parceiro na coligação, mas ele exigiu “apenas” o lugar de comandante das forças aliadas dada a sua qualidade de general francês (que o colocava acima dos ingleses ou americanos). Inexplicavelmente, isso deu imensas dores de cabeça aos aliados, dado que eram estes que os equipavam e lhes forneciam as bases. Curiosamente, vemos já as sementes de conflitos futuros em germe: os franceses ao recuperar os seus territórios coloniais, trataram de se vingar dos colonos italianos e sobretudo dos árabes, com fuzilamentos de populações, prisões arbitrárias e detenção em campos de concentração de forma a chocar os seus aliados (que não eram propriamente meninos de coro por essa época). Por outro lado, os alemães tinham feito uma intensa propaganda, associando os americanos com os Judeus, dizendo que estes procuravam destruir a religião e cultura muçulmana.
Os ingleses consideravam que os americanos eram infantis, pouco competentes na arte da guerra e maus soldados, acabando por boicotar as suas iniciativas.
terça-feira, agosto 24, 2004
A Sul II
Um dos grandes rivais de Scott na exploração antártica foi outro britânico, Ernest Shackleton. É precisamente de uma das viagens deste que trata grande parte do livro que mecionei no post anterior: "Endurance", de F. M. Worsley.
O título da obra é igual ao nome do navio que levou a expedição até à Antártida. Worsley era precisamente o comandante da embarcação e um dos homens em que Shackleton mais confiava.
O objectivo da viagem, que começou um dia depois do início da 1ª Guerra Mundial, era fazer a travessia do continente gelado com recurso a trenós puxados por cães. Todavia, quando o "Endurance" procurava chegar junto do melhor ponto para desembarcar a expedição, o gelo fechou-se e prendeu o navio para sempre.
O que se passou a seguir foi uma das aventuras mais duras, perigosas e extraordinárias alguma vez enfrentadas por um grupo de seres humanos.
Durante um ano, Shackleton e os seus homens esperaram que aparecesse uma abertura que lhes permitisse continuar viagem. Tal nunca aconteceu e o gelo acabou mesmo por esmagar o navio e afundá-lo. Shackleton já tinha previsto que isso ia acontecer, pelo que foi possível salvar praticamente todo o material necessário e três barcos salva-vidas.
Com o afundamento do "Endurance", não restou outra solução senão arrastar tudo isso, à força de braços, durante muitos quilómetros. Com as placas de gelo em que se deslocavam a quebrarem-se constantemente, foi com algum alívio que finalmente lançaram as embarcações ao mar. Com poucos alimentos (até aí tinham sobrevivido comendo pinguim e foca), os 28 membros da expedição rumaram à ilha do Elefante, o pedaço de terra firme mais próximo. O tempo e o mar estavam horríveis, mas nada comparável com que alguns deles iam enfrentar a seguir.
Shackleton sabia que ficar na ilha do Elefante era a morte certa. Nenhum barco se atrevia a navegar por aquelas paragens. Não iria haver socorro. A única solução era pegar num dos dois barquitos que tinham trazido e tentar alcançar território habitado. Assim, depois de algum tempo de preparação, Shackleton, Worsley e mais quatro outros membros da expedição embarcaram no "James Caird" e rumaram em direcção à colónia baleeira do Geórgia do Sul, a cerca de 1200 quilómetros de distância. Levavam comida só para três semanas, porque sabiam que se não chegassem ao seu destino nesse espaço de tempo não tinham qualquer hipótese de sobreviver. Os restantes membros da expedição ficaram na ilha do Elefante, à espera que os outros trouxessem a tão esperada missão de salvamento.
As semanas seguintes no "James Caird" foram de um sofrimento atroz e de um heroísmo gigantesco. Praticamente toda a viagem foi feita no meio de tempestades ciclónicas (as do Antártico são as mais intensas dos sete mares). Todos os tripulantes estiveram encharcados desde o primeiro ao último dia - e isto com temperaturas de muitos graus negativos. Como cama tinham as pedras que serviam de lastro ao barco.
Nestas condições, a sobrevivência só se tornou possível porque, por incrível que pareça, mesmo assim conseguiam cozinhar a bordo. Com um pequeno fogão alimentado a gordura de foca, preparavam uma mistela de vários componentes e aqueciam bebidas. Cedo se habituaram a tomar tudo a escaldar, e provavelmente foi isso que lhes salvou a vida.
Outro dos problemas gravíssimos que tiveram que enfrentar e vencer foi a orientação. Ver o sol ou o horizonte, só por milagre; com os balanços, Worsley só conseguia manter-se de pé para fazer as medições astronómicas com a ajuda de dois homens, e mesmo assim só correndo o grande risco de todos serem cuspidos para o mar. Ao todo, nessas duas terríveis semanas, o capitão do "Endurance" só conseguiu fazer quatro medições - e nenhuma delas dava a miníma garantia de ser correcta.
Por tudo isto, não admira que a viagem do "James Caird" até à Geórgia do Sul seja considerada um dos maiores feitos de navegação da era moderna. Só um grande marinheiro como Worsley conseguiria guiar por estimativa uma "casca de noz" por 1200 quilómetros do mais tempestuoso mar da Terra. Ao fim de 14 dias de tormento incalculável, o pequeno barco conseguiu alcançar a costa da ilha, mas as provações ainda não estavam terminadas.
Apesar da enorme proeza que tinha sido chegar até ali, a acostagem tinha acontecido do lado oposto da ilha àquele onde se situava a estação baleeira. Voltar a embarcar no "James Caird" era suicídio, pelo que Shackleton decidiu fazer a travessia da Geórgia do Sul a pé. Ele, Worsley e outro homem partiram, deixando para trás os elementos mais enfraquecidos. Nunca antes algum homem tinha feito tal viagem. O interior da ilha era preenchido inteiramente por glaciares e enormes montanhas geladas, tão inóspitas que nunca ninguém se tinha atrevido a explorá-las.
Durante quase dois dias os três homens caminharam praticamente sem parar. Descansar mais do que alguns minutos era a morte certa. O vento fortíssimo e a temperatura glacial condenavam rapidamente quem parasse.
Finalmente, ao fim de meses e meses de martírio, Shackleton, Worsley e Crean conseguiram alcançar a salvação na estação baleeira da baía de Stromness. Bateram à porta do administrador local, e este, apesar de já os ter acolhido numa anterior paragem, não os reconheceu. Há mais de um ano que nenhum deles tomava banho ou mudava de roupa.
Salvar os outros três homens que tinham ficado no outro lado da ilha foi relativamente fácil. Muito mais complicado foi resgatar os membros da expedição que estavam á espera na ilha do Elefante. Só passados muitos meses e três tentativas falhadas devido ao gelo, é que Shackleton conseguiu finalmente salvar todos os membros da missão. Apesar do enorme sofrimento por que todos tinham passado, nem um único homem sob o comando directo de Shackleton morreu.
Mesmo com todas estas as provações, o apelo do Antártico era demasiado forte para estes homens. Em 1922, muitos deles voltaram a acompanhar o seu líder em mais uma expedição. Mais uma vez escalaram a Geórgia do Sul, e foi aí que Sir Ernest Shackleton faleceu aos 48 anos de idade.
Foi também aí, por vontade da sua mulher, que foi sepultado. Afinal, pensou ela, era muito mais apropriado que a sua última morada fosse tão perto quanto possível da parte do mundo que ele mais amava: o Antártico.
O título da obra é igual ao nome do navio que levou a expedição até à Antártida. Worsley era precisamente o comandante da embarcação e um dos homens em que Shackleton mais confiava.
O objectivo da viagem, que começou um dia depois do início da 1ª Guerra Mundial, era fazer a travessia do continente gelado com recurso a trenós puxados por cães. Todavia, quando o "Endurance" procurava chegar junto do melhor ponto para desembarcar a expedição, o gelo fechou-se e prendeu o navio para sempre.
O que se passou a seguir foi uma das aventuras mais duras, perigosas e extraordinárias alguma vez enfrentadas por um grupo de seres humanos.
Durante um ano, Shackleton e os seus homens esperaram que aparecesse uma abertura que lhes permitisse continuar viagem. Tal nunca aconteceu e o gelo acabou mesmo por esmagar o navio e afundá-lo. Shackleton já tinha previsto que isso ia acontecer, pelo que foi possível salvar praticamente todo o material necessário e três barcos salva-vidas.
Com o afundamento do "Endurance", não restou outra solução senão arrastar tudo isso, à força de braços, durante muitos quilómetros. Com as placas de gelo em que se deslocavam a quebrarem-se constantemente, foi com algum alívio que finalmente lançaram as embarcações ao mar. Com poucos alimentos (até aí tinham sobrevivido comendo pinguim e foca), os 28 membros da expedição rumaram à ilha do Elefante, o pedaço de terra firme mais próximo. O tempo e o mar estavam horríveis, mas nada comparável com que alguns deles iam enfrentar a seguir.
Shackleton sabia que ficar na ilha do Elefante era a morte certa. Nenhum barco se atrevia a navegar por aquelas paragens. Não iria haver socorro. A única solução era pegar num dos dois barquitos que tinham trazido e tentar alcançar território habitado. Assim, depois de algum tempo de preparação, Shackleton, Worsley e mais quatro outros membros da expedição embarcaram no "James Caird" e rumaram em direcção à colónia baleeira do Geórgia do Sul, a cerca de 1200 quilómetros de distância. Levavam comida só para três semanas, porque sabiam que se não chegassem ao seu destino nesse espaço de tempo não tinham qualquer hipótese de sobreviver. Os restantes membros da expedição ficaram na ilha do Elefante, à espera que os outros trouxessem a tão esperada missão de salvamento.
As semanas seguintes no "James Caird" foram de um sofrimento atroz e de um heroísmo gigantesco. Praticamente toda a viagem foi feita no meio de tempestades ciclónicas (as do Antártico são as mais intensas dos sete mares). Todos os tripulantes estiveram encharcados desde o primeiro ao último dia - e isto com temperaturas de muitos graus negativos. Como cama tinham as pedras que serviam de lastro ao barco.
Nestas condições, a sobrevivência só se tornou possível porque, por incrível que pareça, mesmo assim conseguiam cozinhar a bordo. Com um pequeno fogão alimentado a gordura de foca, preparavam uma mistela de vários componentes e aqueciam bebidas. Cedo se habituaram a tomar tudo a escaldar, e provavelmente foi isso que lhes salvou a vida.
Outro dos problemas gravíssimos que tiveram que enfrentar e vencer foi a orientação. Ver o sol ou o horizonte, só por milagre; com os balanços, Worsley só conseguia manter-se de pé para fazer as medições astronómicas com a ajuda de dois homens, e mesmo assim só correndo o grande risco de todos serem cuspidos para o mar. Ao todo, nessas duas terríveis semanas, o capitão do "Endurance" só conseguiu fazer quatro medições - e nenhuma delas dava a miníma garantia de ser correcta.
Por tudo isto, não admira que a viagem do "James Caird" até à Geórgia do Sul seja considerada um dos maiores feitos de navegação da era moderna. Só um grande marinheiro como Worsley conseguiria guiar por estimativa uma "casca de noz" por 1200 quilómetros do mais tempestuoso mar da Terra. Ao fim de 14 dias de tormento incalculável, o pequeno barco conseguiu alcançar a costa da ilha, mas as provações ainda não estavam terminadas.
Apesar da enorme proeza que tinha sido chegar até ali, a acostagem tinha acontecido do lado oposto da ilha àquele onde se situava a estação baleeira. Voltar a embarcar no "James Caird" era suicídio, pelo que Shackleton decidiu fazer a travessia da Geórgia do Sul a pé. Ele, Worsley e outro homem partiram, deixando para trás os elementos mais enfraquecidos. Nunca antes algum homem tinha feito tal viagem. O interior da ilha era preenchido inteiramente por glaciares e enormes montanhas geladas, tão inóspitas que nunca ninguém se tinha atrevido a explorá-las.
Durante quase dois dias os três homens caminharam praticamente sem parar. Descansar mais do que alguns minutos era a morte certa. O vento fortíssimo e a temperatura glacial condenavam rapidamente quem parasse.
Finalmente, ao fim de meses e meses de martírio, Shackleton, Worsley e Crean conseguiram alcançar a salvação na estação baleeira da baía de Stromness. Bateram à porta do administrador local, e este, apesar de já os ter acolhido numa anterior paragem, não os reconheceu. Há mais de um ano que nenhum deles tomava banho ou mudava de roupa.
Salvar os outros três homens que tinham ficado no outro lado da ilha foi relativamente fácil. Muito mais complicado foi resgatar os membros da expedição que estavam á espera na ilha do Elefante. Só passados muitos meses e três tentativas falhadas devido ao gelo, é que Shackleton conseguiu finalmente salvar todos os membros da missão. Apesar do enorme sofrimento por que todos tinham passado, nem um único homem sob o comando directo de Shackleton morreu.
Mesmo com todas estas as provações, o apelo do Antártico era demasiado forte para estes homens. Em 1922, muitos deles voltaram a acompanhar o seu líder em mais uma expedição. Mais uma vez escalaram a Geórgia do Sul, e foi aí que Sir Ernest Shackleton faleceu aos 48 anos de idade.
Foi também aí, por vontade da sua mulher, que foi sepultado. Afinal, pensou ela, era muito mais apropriado que a sua última morada fosse tão perto quanto possível da parte do mundo que ele mais amava: o Antártico.
segunda-feira, agosto 23, 2004
A Sul I
Liberto de outros compromissos literários, consegui finalmente acabar de ler um magnífico livro sobre a exploração antártica - "Endurance", de F.M. Worsley.
Já lá vão uns largos anos que me deixei enfeitiçar por tudo o que tem a ver com o Pólo Sul. A responsabilidade vai inteirinha para uma magnífica série de televisão sobre a fatídica viagem do capitão Robert Scott ao pólo. Foi emitida na RTP, ainda no tempo do monopólio, e o título original era "The Last Place on Earth" (já não me recordo da designação portuguesa).
A série mostra de forma extremamente realista a competição tremenda entre as expedições lideradas pelo britânico Scott e o norueguês Roald Amundsen pela chegada em primeiro lugar ao Pólo Sul. Ambas partiram em 1910 e ambas chegaram ao seu objectivo em 1912. Amundsen e os seus homens voltaram em triunfo; Scott e os seus companheiros na etapa final até ao pólo morreram no deserto gelado da Antártida, vítimas da exaustão, dos elementos e do escorbuto.
Apesar dos noruegueses terem sido os primeiros seres humanos a alcançar o Pólo Sul geográfico (o magnético é outra história), Scott acabou por se tornar uma figura mais conhecida e celebrada que Amundsen. Isso tem muito a ver com o facto de ele ser britânico (e, logo, mais mediático), mas também com o seu destino trágico.
Quando depois de um esforço sobrehumano os britânicos alcançam finalmente ao pólo, eles descobrem que os seus adversários já lá tinham chegado cerca de um mês antes. Desiludidos e exaustos, Scott e os seus homens acabam por perecer já no regresso, a poucos quilómetros do depósito de comida que os salvaria.
Em circuntâncias normais, tudo isto teria ficado desconhecido para sempre e a história de Scott não teria hoje a importância que tem. Só que a tenda onde os infelizes exploradores acabaram por morrer congelados foi descoberta por uma equipa de salvamento, e o diário de Scott e doze cartas escritas por ele poucas horas antes de morrer foram recuperadas. Apesar de muitos peritos na exploração antártica terem, desde então, atribuído boa parte da responsabilidade da tragédia a Scott, palavras como estas garantiram-lhe o estatuto de herói nacional e a imortalidade:
..."but for my own sake I do not regret this journey, which has shown that Englishmen can endure hardships, help one another, and meet death with as great a fortitude as ever in the past. We took risks, we knew we took them; things have come out against us, and therefore we have no cause for complaint, but bow to the will of providence, determined still to do our best to the last...Had we lived, I should have had a tale to tell of the hardihood, endurance, and courage of my companions which would have stirred the heart of every Englishman. These rough notes and our dead bodies must tell the tale, but surely, surely, a great rich country like ours will see that those who are dependent on us are properly provided for".
Já lá vão uns largos anos que me deixei enfeitiçar por tudo o que tem a ver com o Pólo Sul. A responsabilidade vai inteirinha para uma magnífica série de televisão sobre a fatídica viagem do capitão Robert Scott ao pólo. Foi emitida na RTP, ainda no tempo do monopólio, e o título original era "The Last Place on Earth" (já não me recordo da designação portuguesa).
A série mostra de forma extremamente realista a competição tremenda entre as expedições lideradas pelo britânico Scott e o norueguês Roald Amundsen pela chegada em primeiro lugar ao Pólo Sul. Ambas partiram em 1910 e ambas chegaram ao seu objectivo em 1912. Amundsen e os seus homens voltaram em triunfo; Scott e os seus companheiros na etapa final até ao pólo morreram no deserto gelado da Antártida, vítimas da exaustão, dos elementos e do escorbuto.
Apesar dos noruegueses terem sido os primeiros seres humanos a alcançar o Pólo Sul geográfico (o magnético é outra história), Scott acabou por se tornar uma figura mais conhecida e celebrada que Amundsen. Isso tem muito a ver com o facto de ele ser britânico (e, logo, mais mediático), mas também com o seu destino trágico.
Quando depois de um esforço sobrehumano os britânicos alcançam finalmente ao pólo, eles descobrem que os seus adversários já lá tinham chegado cerca de um mês antes. Desiludidos e exaustos, Scott e os seus homens acabam por perecer já no regresso, a poucos quilómetros do depósito de comida que os salvaria.
Em circuntâncias normais, tudo isto teria ficado desconhecido para sempre e a história de Scott não teria hoje a importância que tem. Só que a tenda onde os infelizes exploradores acabaram por morrer congelados foi descoberta por uma equipa de salvamento, e o diário de Scott e doze cartas escritas por ele poucas horas antes de morrer foram recuperadas. Apesar de muitos peritos na exploração antártica terem, desde então, atribuído boa parte da responsabilidade da tragédia a Scott, palavras como estas garantiram-lhe o estatuto de herói nacional e a imortalidade:
..."but for my own sake I do not regret this journey, which has shown that Englishmen can endure hardships, help one another, and meet death with as great a fortitude as ever in the past. We took risks, we knew we took them; things have come out against us, and therefore we have no cause for complaint, but bow to the will of providence, determined still to do our best to the last...Had we lived, I should have had a tale to tell of the hardihood, endurance, and courage of my companions which would have stirred the heart of every Englishman. These rough notes and our dead bodies must tell the tale, but surely, surely, a great rich country like ours will see that those who are dependent on us are properly provided for".
quinta-feira, agosto 19, 2004
Os princípios de um exército -II
Analisando agora a capacidade combativa dos U.S.A.
A nível táctico a situação era má. O máximo que os soldados recebiam de treino físico eram três meses, a maior parte das vezes sem munição real, mas rapidamente com as necessidades, nem isso passaram a receber; pouca predesposição para combater e uma relutância em combater os alemães a quem não conseguiam odiar. Desorganização nos desembarques, enviando tropas com munições trocadas (as bazucas quando foram enviadas, ficaram em regimentos de guarnição na retaguarda sem sequer lhes explicarem para que serviam, enquanto outros soldados enfrentavam os panzer em Kasserine com espingardas), equipamentos desmontados que só iam com parte das peças (e o resto ia para outro lado qualquer). Incapacidade de montar ataques coordenados entre tanques, aviação, infantaria e artilharia (e que normalmente resultavam em banhos de sangue contra os alemães). Persistência em lançar ataques frontais em posições entricheiradas; ataques feitos sem reconhecimentos primeiro ou bombardeamentos.
À medida que a campanha foi progredindo, ao lidar com populações civis, deram-se casos de indisciplina flagrande (morte de árabes por prática de tiro ao alvo, violação de mulheres); se as ordens eram de castigar de forma rigorosa tais actos, muitos oficiais davam livre pulso a esses actos para ver se as tropas endureciam (numa expediçaõ de rangers contra italianos, foi dada a ordem de só fazer 10 prisioneiros, devendo os outros ser abatidos; no regresso descobriram que tinham feito 11 por engano e mataram o 11º).
A nível das altas esferas as coisas eram piores. Os oficiais não tinham experiência de guerra, ou esta reportava-se à 1ª guerra. A descoordenação e incapacidade de compreender os princípios da guerra moderna por muitos, resultavam em derrotas consecutivas.
O pior de tudo era a relação entre ingleses e americanos: estes desprezavam-se mutuamente e raramente se apoiavam, mesmo com unidades vizinhas a ser esmagadas pelos alemães (aliás não o faziam mesmo com os da própria nacionalidade).
Ora como é que os americanos conseguiram vencer a campanha? Porque à medida que o tempo foi passando, os oficiais que se notavam como incompetentes eram enviados para casa, enquanto que os outros que se destacavam pela positiva foram sendo promovidos (Paton, Bradley). E sobretudo revelaram uma boa capacidade de aprendizagem; sem atingir a mestria dos alemães, conseguiam com o tempo evitar erros básicos que os ingleses nunca se libertaram, apesar de alguns bons comandantes.
A nível táctico a situação era má. O máximo que os soldados recebiam de treino físico eram três meses, a maior parte das vezes sem munição real, mas rapidamente com as necessidades, nem isso passaram a receber; pouca predesposição para combater e uma relutância em combater os alemães a quem não conseguiam odiar. Desorganização nos desembarques, enviando tropas com munições trocadas (as bazucas quando foram enviadas, ficaram em regimentos de guarnição na retaguarda sem sequer lhes explicarem para que serviam, enquanto outros soldados enfrentavam os panzer em Kasserine com espingardas), equipamentos desmontados que só iam com parte das peças (e o resto ia para outro lado qualquer). Incapacidade de montar ataques coordenados entre tanques, aviação, infantaria e artilharia (e que normalmente resultavam em banhos de sangue contra os alemães). Persistência em lançar ataques frontais em posições entricheiradas; ataques feitos sem reconhecimentos primeiro ou bombardeamentos.
À medida que a campanha foi progredindo, ao lidar com populações civis, deram-se casos de indisciplina flagrande (morte de árabes por prática de tiro ao alvo, violação de mulheres); se as ordens eram de castigar de forma rigorosa tais actos, muitos oficiais davam livre pulso a esses actos para ver se as tropas endureciam (numa expediçaõ de rangers contra italianos, foi dada a ordem de só fazer 10 prisioneiros, devendo os outros ser abatidos; no regresso descobriram que tinham feito 11 por engano e mataram o 11º).
A nível das altas esferas as coisas eram piores. Os oficiais não tinham experiência de guerra, ou esta reportava-se à 1ª guerra. A descoordenação e incapacidade de compreender os princípios da guerra moderna por muitos, resultavam em derrotas consecutivas.
O pior de tudo era a relação entre ingleses e americanos: estes desprezavam-se mutuamente e raramente se apoiavam, mesmo com unidades vizinhas a ser esmagadas pelos alemães (aliás não o faziam mesmo com os da própria nacionalidade).
Ora como é que os americanos conseguiram vencer a campanha? Porque à medida que o tempo foi passando, os oficiais que se notavam como incompetentes eram enviados para casa, enquanto que os outros que se destacavam pela positiva foram sendo promovidos (Paton, Bradley). E sobretudo revelaram uma boa capacidade de aprendizagem; sem atingir a mestria dos alemães, conseguiam com o tempo evitar erros básicos que os ingleses nunca se libertaram, apesar de alguns bons comandantes.
terça-feira, agosto 17, 2004
Os princípios de um exército-I
Este post é longo e portanto vai ter de ser repartido em várias partes (umas 4 ou 5).
Li recentemente nas férias um livro chamado “An army at dawm”; ganhou o prémio Pulitzer e foi escrito por Rick Atkinson. Não gosto muito do estilo de escrita (muito patriótico), mas é de facto uma mina de informações sobre a entrada do exército americano na segunda grande guerra.
O livro aborda a campanha africana, desde os desembarques em Marrocos e Argélia em 1942, até à capitulação alemã na Tunísia em Maio de 1943.
Fica-se siderado com a falta de preparação dos norte-americanos. A economia teve de ser reconvertida para as necessidades de guerra, mas os militares não sabiam exactamente o que era necessário; eram utilizados dados referentes à primeira guerra.
Diga-se em boa verdade que os americanos queriam desembarcar imediatamente em França para apoiar os soviéticos que estavam à mercê da grande ofensiva de Verão de Hitler em 1942 (e os americanos tinham a noção de que se a URSS caísse, a guerra seria interminável) e também para poder seguir para seguir directamente para a Alemanha vencendo a guerra de forma rápida; simplesmente os ingleses (que tinham interesses diferentes), argumentavam que um ataque directo em França seria um suicídio dada a força alemã nesse período e argumentavam com dados estatísticos sobre a relação de forças contrapondo um ataque contra uma zona periférica como o norte de africa que enfraqueceria o eixo, enquanto que os americanos ainda muito inexperientes nas reuniões apenas se defendiam com o uso de bom senso. Eram duas estratégias provenientes de culturas e recursos diferentes: os ingleses que estavama há séculos habituados a lançar ataques indirectos até enfraquecer o adversário, evitando um confronto decisivo e os americanos que carregavam imediatamente possuíndo recursos quase inesgotáveis que lhes permitia vencer pela superioridade de meios de forma vassaladora. Os ingleses venceram, e provavelmente foi o melhor que podia ter sucedido, pois como veremos a seguir, nem com meios os americanos conseguiam no princípio derrotar os alemães.
Li recentemente nas férias um livro chamado “An army at dawm”; ganhou o prémio Pulitzer e foi escrito por Rick Atkinson. Não gosto muito do estilo de escrita (muito patriótico), mas é de facto uma mina de informações sobre a entrada do exército americano na segunda grande guerra.
O livro aborda a campanha africana, desde os desembarques em Marrocos e Argélia em 1942, até à capitulação alemã na Tunísia em Maio de 1943.
Fica-se siderado com a falta de preparação dos norte-americanos. A economia teve de ser reconvertida para as necessidades de guerra, mas os militares não sabiam exactamente o que era necessário; eram utilizados dados referentes à primeira guerra.
Diga-se em boa verdade que os americanos queriam desembarcar imediatamente em França para apoiar os soviéticos que estavam à mercê da grande ofensiva de Verão de Hitler em 1942 (e os americanos tinham a noção de que se a URSS caísse, a guerra seria interminável) e também para poder seguir para seguir directamente para a Alemanha vencendo a guerra de forma rápida; simplesmente os ingleses (que tinham interesses diferentes), argumentavam que um ataque directo em França seria um suicídio dada a força alemã nesse período e argumentavam com dados estatísticos sobre a relação de forças contrapondo um ataque contra uma zona periférica como o norte de africa que enfraqueceria o eixo, enquanto que os americanos ainda muito inexperientes nas reuniões apenas se defendiam com o uso de bom senso. Eram duas estratégias provenientes de culturas e recursos diferentes: os ingleses que estavama há séculos habituados a lançar ataques indirectos até enfraquecer o adversário, evitando um confronto decisivo e os americanos que carregavam imediatamente possuíndo recursos quase inesgotáveis que lhes permitia vencer pela superioridade de meios de forma vassaladora. Os ingleses venceram, e provavelmente foi o melhor que podia ter sucedido, pois como veremos a seguir, nem com meios os americanos conseguiam no princípio derrotar os alemães.
quinta-feira, agosto 12, 2004
Jogo Musical -VI
Retomo o passatempo do top-10 de obras musicais.
Terminei com a música dita erudita e sigo com outros estilos (todos eles do séc. XX, obviamente).
O estilo que escolhi foi o Jazz; como percebo pouco, tive de ler e perguntar a pessoas entendidas. Pedi um álbum que fosse considerado como representativo e um marco; embora protestassem que não fazia sentido escolher só um dada a diversidade e riqueza nesse género musical, acabou por sair um nome (podia ter sido outro qualquer); Miles Davis (1926-1991) e “Kind of Blue”. Emprestaram-me um exemplar e informei-me sobre o autor, portanto não esperem uma opinião de verdadeiro conhecedor, dado que não o sou.
Começou como trompetista, dedicando-se também à composição e adaptação de obras e improvisação de outros autores ao seu estilo. Na década de 60 e 70 começa a incorporar elementos electrónicos na sua música tornando-se mais experimentalista.
O álbum é muito elogiado pela sua interpretação e diversidade (sonoridade única, riqueza de timbre- eu sei que sem se ouvir, estes elogios tornam-se apenas lugares comuns sem sentido). Pessoalmente acho a música suave e até agradável como fundo sonoro e uma boa introdução ao jazz, mas sou incapaz de a apreciar muito para além disso; questão de treino suponho. http://www.amazon.com/exec/obidos/tg/detail/-/B000002ADT/002-2839632-0884022?v=glance
Terminei com a música dita erudita e sigo com outros estilos (todos eles do séc. XX, obviamente).
O estilo que escolhi foi o Jazz; como percebo pouco, tive de ler e perguntar a pessoas entendidas. Pedi um álbum que fosse considerado como representativo e um marco; embora protestassem que não fazia sentido escolher só um dada a diversidade e riqueza nesse género musical, acabou por sair um nome (podia ter sido outro qualquer); Miles Davis (1926-1991) e “Kind of Blue”. Emprestaram-me um exemplar e informei-me sobre o autor, portanto não esperem uma opinião de verdadeiro conhecedor, dado que não o sou.
Começou como trompetista, dedicando-se também à composição e adaptação de obras e improvisação de outros autores ao seu estilo. Na década de 60 e 70 começa a incorporar elementos electrónicos na sua música tornando-se mais experimentalista.
O álbum é muito elogiado pela sua interpretação e diversidade (sonoridade única, riqueza de timbre- eu sei que sem se ouvir, estes elogios tornam-se apenas lugares comuns sem sentido). Pessoalmente acho a música suave e até agradável como fundo sonoro e uma boa introdução ao jazz, mas sou incapaz de a apreciar muito para além disso; questão de treino suponho. http://www.amazon.com/exec/obidos/tg/detail/-/B000002ADT/002-2839632-0884022?v=glance
segunda-feira, agosto 09, 2004
Regresso
Voltei das férias. De entre vários locais, estive em S. Maria da Feira. Assisti a um torneio, visitei o castelo, (que tinha figurantes e mobiliário), lancei dardos (tenho jeito para a coisa), disparei flechas (aí sou uma miséria), vi saltimbancos, músicos, aves de rapina, muitas tendas com todo o tipo de produtos (desde sangria a amuletos como é costume), comi bem e vi imensa gente: parecia um S. João no Porto. Realmente, quando as coisas da cultura são bem organizadas, atraem as pessoas e são populares. Só que é preciso meios e muito, muito trabalho. Único pormenor negativo, foi a não realização do casamento no dia acordado (quarta-feira): é que houve uma falha de energia o que inviabilizou os sistemas de som e luz (irónico, não é?).
E de leituras? Bem, hoje falo só de um livro “A história de Genji” (Genji Monogatari). Foi escrito no Japão em princípios do séc. XI (apogeu do período Heian), por uma mulher membro da corte imperial. É conhecida por Murasaki (o nome de uma personagem do livro já que se ignora o seu real nome), sabe-se que pertencia a um ramo menor da família Fujiwara (toda poderosa na época).
A sociedade nada tem de parecido com a que nos é familiar dos filmes de samurais. É uma sociedade palaciana, que se dedica à poesia, música e outros prazeres da vida. Quem domina o país são os Kuge, aristocratas imperiais, descendentes longínquos de um imperador, ou dos clãs que a ele se aliaram quando se deu a centralização. Estão divididos em vários graus de nobreza (pode-se ser nobre de 1º, 2º, 3º, ou mais ordens); desempenha-se um cargo de acordo com a sua hierarquia, embora o favor imperial e as influências possam favorecer um indivíduo ou uma linhagem... até certo ponto. Mesmo para se ser uma humilde concubina (já não falo de esposa) de personagens ilustres, não estava ao alcance de qualquer uma (as restantes esposas, concubinas e sobretudo as que dessem herdeiros podiam dificultar a escolha do interessado, dado que um filho de uma concubina de humilde proveniência -leia-se, nobreza pobre ou rural que um século depois seriam samurais- tinha os mesmo direitos se reconhecido ao filho de uma primeira esposa. A poligamia era de facto algo complicada.
Os que desempenham cargos administrativos, governadores e militares são vistos com um desprezo mal disfarçado: se deixam as mulheres na corte, elas enganam-nos (depois de oferecer uma certa resistência claro), se vão acompanhados, as mulheres são lamentadas por irem para o desterro em territórios longínquos fora dos encantos da capital). Os maridos são assim descritos como boçais, gordos, velhos.
O herói é um filho do imperador (e de uma mulher de baixa extracção, isto é baixa nobreza e não de uma poderosa família): os seus passatempos são tentar conquistar belas mulheres por quem se vai interessando (algumas casadas), arranjar esquemas para entrar nos seus aposentos sem ser apanhado (numa das aventuras, ele é rejeitado, e para se consolar dorme com o irmão mais novo dela que é uma criança ainda, até nova tentativa). As personagens descritas são muito sensíveis, entrando em melancolia, depressão e morte com desgostos amorosos. À medida que o tempo vai passando, é descrito a mudança nas flores, o chilrear dos pássaros, o evoluir das estações.
Completamente oposto assim ao “Heike Monogatari”, que descreve batalhas, e o processo que pôs fim à sociedade cortesã um século e meio depois.
E de leituras? Bem, hoje falo só de um livro “A história de Genji” (Genji Monogatari). Foi escrito no Japão em princípios do séc. XI (apogeu do período Heian), por uma mulher membro da corte imperial. É conhecida por Murasaki (o nome de uma personagem do livro já que se ignora o seu real nome), sabe-se que pertencia a um ramo menor da família Fujiwara (toda poderosa na época).
A sociedade nada tem de parecido com a que nos é familiar dos filmes de samurais. É uma sociedade palaciana, que se dedica à poesia, música e outros prazeres da vida. Quem domina o país são os Kuge, aristocratas imperiais, descendentes longínquos de um imperador, ou dos clãs que a ele se aliaram quando se deu a centralização. Estão divididos em vários graus de nobreza (pode-se ser nobre de 1º, 2º, 3º, ou mais ordens); desempenha-se um cargo de acordo com a sua hierarquia, embora o favor imperial e as influências possam favorecer um indivíduo ou uma linhagem... até certo ponto. Mesmo para se ser uma humilde concubina (já não falo de esposa) de personagens ilustres, não estava ao alcance de qualquer uma (as restantes esposas, concubinas e sobretudo as que dessem herdeiros podiam dificultar a escolha do interessado, dado que um filho de uma concubina de humilde proveniência -leia-se, nobreza pobre ou rural que um século depois seriam samurais- tinha os mesmo direitos se reconhecido ao filho de uma primeira esposa. A poligamia era de facto algo complicada.
Os que desempenham cargos administrativos, governadores e militares são vistos com um desprezo mal disfarçado: se deixam as mulheres na corte, elas enganam-nos (depois de oferecer uma certa resistência claro), se vão acompanhados, as mulheres são lamentadas por irem para o desterro em territórios longínquos fora dos encantos da capital). Os maridos são assim descritos como boçais, gordos, velhos.
O herói é um filho do imperador (e de uma mulher de baixa extracção, isto é baixa nobreza e não de uma poderosa família): os seus passatempos são tentar conquistar belas mulheres por quem se vai interessando (algumas casadas), arranjar esquemas para entrar nos seus aposentos sem ser apanhado (numa das aventuras, ele é rejeitado, e para se consolar dorme com o irmão mais novo dela que é uma criança ainda, até nova tentativa). As personagens descritas são muito sensíveis, entrando em melancolia, depressão e morte com desgostos amorosos. À medida que o tempo vai passando, é descrito a mudança nas flores, o chilrear dos pássaros, o evoluir das estações.
Completamente oposto assim ao “Heike Monogatari”, que descreve batalhas, e o processo que pôs fim à sociedade cortesã um século e meio depois.
quarta-feira, julho 28, 2004
FALLUJAH E O TALMUDE
Por incrível que pareça, Fallujah, um dos principais centros da guerrilha iraquiana, poderá muito bem ter sido o local onde foi escrito o Talmude, o principal texto jurídico e consuetudinário judaico.
Quem o diz é Hershel Shanks, editor da "Biblical Archaelogical Review", uma das mais reputadas publicações dedicadas à história e arqueologia do Médio Oriente (infelizmente, o artigo em causa não foi aí publicado).
Parece que há 1500 anos a actual Fallujah se chamava Pumbedita, e era a sede de uma das mais importantes academias rabínicas da antiga Babilónia.
A evolução do nome da cidade é assaz interessante: em aramaico seria Pum-Bedita; daí passou para a Pallughtha do sírio antigo; e em árabe transformou-se em Falluga ou Fallujah.
Quem o diz é Hershel Shanks, editor da "Biblical Archaelogical Review", uma das mais reputadas publicações dedicadas à história e arqueologia do Médio Oriente (infelizmente, o artigo em causa não foi aí publicado).
Parece que há 1500 anos a actual Fallujah se chamava Pumbedita, e era a sede de uma das mais importantes academias rabínicas da antiga Babilónia.
A evolução do nome da cidade é assaz interessante: em aramaico seria Pum-Bedita; daí passou para a Pallughtha do sírio antigo; e em árabe transformou-se em Falluga ou Fallujah.
O ZEPELLIN DE VOLTA?
Bem, não propriamente...
A DARPA, a agência do Pentágono que está encarregue dos projectos científicos e tecnológicos loucos (como a Internet, por exemplo), está a planear construir um dirígivel gigantesco, capaz de transportar uma das novas "unidades de acção" do exército norte-americano para qualquer parte do mundo, em quatro dias. São 1800 homens e o respectivo equipamento de apoio. Imaginem o tamanho da coisa!
Para ter uma ideia do aspecto do "bicho" e saber mais alguma coisa, ver aqui, aqui e aqui.
Desde o desastre do "Hindenburg", em 1937, que há esforços periódicos para recuperar o dirígivel como meio de transporte de uso comum. Até agora não têm tido muito sucesso, mas pode ser que o "Walrus" (assim se chama o projecto da DARPA) possa mudar a situação.
Já agora, se quiser ouvir a famosa reportagem radiofónica do incêndio do "Hindenburg", pode encontrá-la aqui (basta clicar no link que aparece no meio da página).
A DARPA, a agência do Pentágono que está encarregue dos projectos científicos e tecnológicos loucos (como a Internet, por exemplo), está a planear construir um dirígivel gigantesco, capaz de transportar uma das novas "unidades de acção" do exército norte-americano para qualquer parte do mundo, em quatro dias. São 1800 homens e o respectivo equipamento de apoio. Imaginem o tamanho da coisa!
Para ter uma ideia do aspecto do "bicho" e saber mais alguma coisa, ver aqui, aqui e aqui.
Desde o desastre do "Hindenburg", em 1937, que há esforços periódicos para recuperar o dirígivel como meio de transporte de uso comum. Até agora não têm tido muito sucesso, mas pode ser que o "Walrus" (assim se chama o projecto da DARPA) possa mudar a situação.
Já agora, se quiser ouvir a famosa reportagem radiofónica do incêndio do "Hindenburg", pode encontrá-la aqui (basta clicar no link que aparece no meio da página).
segunda-feira, julho 19, 2004
NAGASAKI
Morreu Charles W. Sweeney, o homem que pilotou o bombardeiro que lançou a bomba atómica sobre Nagasaki. Tinha 84 anos e nunca se arrependeu.
Nos últimos anos, uma série de historiadores mais ou menos políticamente motivados têm acusado a administração norte-americana da altura, liderada pelo presidente Harry Truman, de ter usado a bomba atómica contra um país que já estava derrotado.
Baseando-se numa enorme quantidade de informação que era desconhecida ou inacessível para os decisores políticos e militares da altura, estes autores passam um duro julgamento sobre a decisão de usar a bomba. Para eles, o Japão estava prester a render-se. Bastava manter os bombardeamentos convencionais (que, por sinal, eram quase tão mortíferos como os atómicos) e invadir as principais ilhas do arquipélago japonês. Ou seja: usar as bombas atómicas foi não só desnecessário, como criminoso.
Isto é o que dá olhar o passado com as lentes (bastante deformadas) do presente. Isto é o que dá ignorar ou desmentir a previsão, feita na altura, de que a invasão do Japão ia matar um milhão de pessoas. Isto é o que dá preferir não ver que o teatro do Pacífico foi o mais cruel e brutal (com excepção de algumas áreas da frente Leste) de toda a 2ª Guerra Mundial. Em mais parte nenhuma se viram exércitos a lutar até ao último homem, como em Iwo Jima, Tarawa e Okinawa. Em Tarawa, por exemplo, dos 4800 defensores japoneses e coreanos, só 17 é que foram feitos prisioneiros no final da batalha. Todos os outros foram mortos pelos marines ou suicidaram-se. Em Okinawa, os civis japoneses lançaram-se do alto das falésias da ilha para evitarem a captura.
Ignorar tudo isto é a pior das cegueiras. É não perceber que, no Verão de 1945, o cansaço provocado pela guerra era enorme. O fim estava à vista, mas ninguém estava disposto a adiá-lo um dia mais para além do necessário. A invasão do Japão iria prolongar os combates pelo menos mais um ano. Um ano de carnificina.
Imaginem o que aconteceria se Truman tivesse decidido não usar a bomba? Por muito que custe aceitar aos revisionistas, a grande responsabilidade do presidente era ganhar a guerra, gastando o menor número possível de vidas americanas. Não usar uma arma tão decisiva como a bomba atómica era pura e simplesmente impensável.
Nos dias de hoje, a ideia da guerra total repugna-nos. Em 1945, os líderes e a população dos países aliados não tinham esse luxo. Todos sabiam que era matar ou morrrer. O nazismo e o imperialismo japonês não teriam qualquer piedade caso vencessem.
Cinquenta anos depois de ter largado a bomba em Nagasaki, Charles Sweeney foi a uma comissão do Senado dos Estados Unidos lembrar que, às vezes, é preciso tomar decisões duras e assumi-las. Era bom que as suas palavras não fossem esquecidas:
«Não estou aqui a celebrar o uso de armas atómicas. Bem pelo contrário. Espero que a minha missão [atómica] seja a última deste tipo. Nós, como nação, devemos abominar a existência de armas nucleares. Essa é, aliás, a minha opinião».
«No entanto, isso não significa que, em Agosto de 1945, dados os acontecimentos da guerra e a recalcitrância do nosso inimigo, o presidente Truman não estivesse obrigado a usar todas as armas ao seu dispôr para acabar com a guerra. Concordei com Harry Truman na altura, e ainda concordo com ele hoje».
Nos últimos anos, uma série de historiadores mais ou menos políticamente motivados têm acusado a administração norte-americana da altura, liderada pelo presidente Harry Truman, de ter usado a bomba atómica contra um país que já estava derrotado.
Baseando-se numa enorme quantidade de informação que era desconhecida ou inacessível para os decisores políticos e militares da altura, estes autores passam um duro julgamento sobre a decisão de usar a bomba. Para eles, o Japão estava prester a render-se. Bastava manter os bombardeamentos convencionais (que, por sinal, eram quase tão mortíferos como os atómicos) e invadir as principais ilhas do arquipélago japonês. Ou seja: usar as bombas atómicas foi não só desnecessário, como criminoso.
Isto é o que dá olhar o passado com as lentes (bastante deformadas) do presente. Isto é o que dá ignorar ou desmentir a previsão, feita na altura, de que a invasão do Japão ia matar um milhão de pessoas. Isto é o que dá preferir não ver que o teatro do Pacífico foi o mais cruel e brutal (com excepção de algumas áreas da frente Leste) de toda a 2ª Guerra Mundial. Em mais parte nenhuma se viram exércitos a lutar até ao último homem, como em Iwo Jima, Tarawa e Okinawa. Em Tarawa, por exemplo, dos 4800 defensores japoneses e coreanos, só 17 é que foram feitos prisioneiros no final da batalha. Todos os outros foram mortos pelos marines ou suicidaram-se. Em Okinawa, os civis japoneses lançaram-se do alto das falésias da ilha para evitarem a captura.
Ignorar tudo isto é a pior das cegueiras. É não perceber que, no Verão de 1945, o cansaço provocado pela guerra era enorme. O fim estava à vista, mas ninguém estava disposto a adiá-lo um dia mais para além do necessário. A invasão do Japão iria prolongar os combates pelo menos mais um ano. Um ano de carnificina.
Imaginem o que aconteceria se Truman tivesse decidido não usar a bomba? Por muito que custe aceitar aos revisionistas, a grande responsabilidade do presidente era ganhar a guerra, gastando o menor número possível de vidas americanas. Não usar uma arma tão decisiva como a bomba atómica era pura e simplesmente impensável.
Nos dias de hoje, a ideia da guerra total repugna-nos. Em 1945, os líderes e a população dos países aliados não tinham esse luxo. Todos sabiam que era matar ou morrrer. O nazismo e o imperialismo japonês não teriam qualquer piedade caso vencessem.
Cinquenta anos depois de ter largado a bomba em Nagasaki, Charles Sweeney foi a uma comissão do Senado dos Estados Unidos lembrar que, às vezes, é preciso tomar decisões duras e assumi-las. Era bom que as suas palavras não fossem esquecidas:
«Não estou aqui a celebrar o uso de armas atómicas. Bem pelo contrário. Espero que a minha missão [atómica] seja a última deste tipo. Nós, como nação, devemos abominar a existência de armas nucleares. Essa é, aliás, a minha opinião».
«No entanto, isso não significa que, em Agosto de 1945, dados os acontecimentos da guerra e a recalcitrância do nosso inimigo, o presidente Truman não estivesse obrigado a usar todas as armas ao seu dispôr para acabar com a guerra. Concordei com Harry Truman na altura, e ainda concordo com ele hoje».
sexta-feira, julho 16, 2004
VOZES DO PASSADO
E se fosse possível restaurar gravações áudio julgadas perdidas para sempre? E se esses cilindros de cera e discos, gravados em finais do século XIX e inícios do século XX, contivessem as vozes nunca escutadas de figuras como a raínha Vitória, o kaiser Guilherme ou Florence Nightingale? Ficção científica? Nem por isso. Basta ir aqui e ler. E digam lá que a ciência não é maravilhosa...
sexta-feira, julho 09, 2004
partida
Vou estar ausente por uma temporada (umas 3 semanas), portanto será complicado actualizar o blog até o meu regresso. Como despedida, coloco este link da Biblioteca Nacional.
quarta-feira, julho 07, 2004
Justiça nazi
Um prisioneiro num campo de concentração é seleccionado para ser gaseado no dia seguinte. Tem direito por isso a receber uma ração dupla de sopa. Quando chega com a malga, o cozinheiro recusa-se, diz que ele não tem direito, que ninguém lhe disse nada; o prisioneiro insiste, diz que foi escolhido para as câmaras de gaz, que o cozinheiro verifique; este de mau grado vai confirmar e ao aperceber-se que de facto o prisioneiro tem razão, dá-lhe a dose regulamentar; o prisioneiro vai comer a sua dose e no dia seguinte é enviado para as câmaras de gaz.
A estória retirei-a do livro de Primo de Levi “Se isto é um homem”. Muito bom para as pessoas terem uma noção do que era o regime.
A estória retirei-a do livro de Primo de Levi “Se isto é um homem”. Muito bom para as pessoas terem uma noção do que era o regime.
segunda-feira, julho 05, 2004
Afrika Korps-III
Uma das maiores desvantagens dos alemães vinha dos seus aliados: os italianos. Mal equipados (a maioria dos seus tanques e artilharia não tinham possibilidade de competir com armamento inglês), mal comandados, desmotivados, as tropas italianas tinham uma tendência para se render mal as coisas corressem mal (do género, uma unidade de infantaria italiana ter de enfrentar blindados sem apoio, mas quem os pode criticar?). O mau exemplo vinha de cima: os oficiais exigiam refeições com vários pratos e raramente combatiam, enquanto que os soldados por vezes tinham de mendigar a alimentação aos alemães (Rommel estabelecera que os oficiais germanos comessem os mesmo que os soldados, aumentando a solidariedade do Afrika Korps). Sem possuírem tranportes, eram obrigados a caminhar pelo deserto muitas vezes a pé para a frente de batalha; a maioria dos oficiais não serviam para uma guerra moderna com grandes iniciativa e rapidez. Em itália, uma intensa burocracia travava o envio de reforços ou qualquer modificação que se tentasse impôr (mesmo que fosse o envio de reforços ou a adopção de armamento mais moderno). É certo que existiam excepções: um comandante de artilharia era tão apreciado por Rommel (pois colaborava com as suas peças em unidade com os alemães em perfeita sintonia), que este foi visita-lo na enfermaria onde jazia ferido de morte. Em combate corpo-a-corpo, os italianos saiam-se razoavelmente, e algumas unidades lutavam ferozmente como os paraquedistas da Folgore ou a divisão blindada Ariete que combateu em El Alamein para proteger a retirada dos DAK, resistindo até ao fim (por outras palavras, ardendo com os seus tanques). Algumas armas (em pequena quantidade é certo) ainda provocavam sustos aos aliados (como o semovente 75/18, um canhão de assalto). Mas tudo isto era muito pouco, e os alemães eram obrigados a vir constantemente em auxílio dos seus aliados para evitar que sectores da frente se desmoronassem.
sexta-feira, julho 02, 2004
Afrika Korps-II
Quais as razões para o Afrika Korps (DAK) não ter sido bem sucedido na conquista do Egipto? Algumas são óbvias: nunca receberam os abastecimentos (comida, combustível, munições, reforços, armas) que necessitavam em pleno, o que condicionava os planos de batalhas (necessitando mensalmente 150.000 toneladas recebiam em média 100.000, embora em ocasiões de maior eficiência inglesa podiam apenas receber 30.000). Tendo os seus reforços de vir de Itália estavam à mercê da RAF e Royal Navy (a partir de Malta), nem sequer tendo bons portos de desembarque. Pelo contrário, os ingleses tratavam de que nada faltasse ao 8º exército, de modo que após cada grande vitória de Rommel, poucas semanas depois os seus adversários tinham as forças refeitas (e os seus reforços vinham pelo Egipto que estava fora do alcance do eixo).
O facto do DAK ser visto pelo alto comando alemão (OKW) como uma expedição de ajuda aos italianos que apenas desviava recursos do que interessava (a frente russa), garantia toda a má vontade para o reforçar (mesmo Hitler que apreciava Rommel, acabava por não poder fazer muito); acrescentamos que Rommel não era um aristocrata prussiano mas um plebeu oriundo de Wurtemberg o que o tornava mal visto pelo comando alemão (daí a preferência que Hitler lhe dava), o que tornava a sua posição algo insegura com tentativas de o desacreditar (um enviado para estudar o DAK, concluiu que não tendo recursos suficientes, Rommel devia limitar-se à defesa sem atacar mais- o enviado era Von Paulus o futuro marechal alemão de Estalinegrado- ironias da história). Outro elemento a favor dos ingleses foi terem descodificado o código alemão de comunicação dando-lhes informações vitais (embora por vezes desastradamente interpretadas como foi no caso dos comunicados de Von Paulus, pois Rommel atacou os ingleses desprevenidos fazendo tábua rasa das considerações dos seus superiores).
O facto do DAK ser visto pelo alto comando alemão (OKW) como uma expedição de ajuda aos italianos que apenas desviava recursos do que interessava (a frente russa), garantia toda a má vontade para o reforçar (mesmo Hitler que apreciava Rommel, acabava por não poder fazer muito); acrescentamos que Rommel não era um aristocrata prussiano mas um plebeu oriundo de Wurtemberg o que o tornava mal visto pelo comando alemão (daí a preferência que Hitler lhe dava), o que tornava a sua posição algo insegura com tentativas de o desacreditar (um enviado para estudar o DAK, concluiu que não tendo recursos suficientes, Rommel devia limitar-se à defesa sem atacar mais- o enviado era Von Paulus o futuro marechal alemão de Estalinegrado- ironias da história). Outro elemento a favor dos ingleses foi terem descodificado o código alemão de comunicação dando-lhes informações vitais (embora por vezes desastradamente interpretadas como foi no caso dos comunicados de Von Paulus, pois Rommel atacou os ingleses desprevenidos fazendo tábua rasa das considerações dos seus superiores).
quinta-feira, julho 01, 2004
Afrika Korps-I
Estou a acabar de ler um livro sobre o Afrika korps; este conseguiu obter uma fama admirável para os “fãs” da segunda grande guerra. Composto pela 5ª ligeira, as 15ª e 21ª divisões panzer tendo um cenário de guerra único (os desertos do norte de africa), e colocando por 2 anos em cheque exércitos bastante superiores, obtiveram uma fama de cavalheirismo pouco comum nos alemães (recordados sobretudo pelas sua eficiência... e extrema brutalidade).
Tudo começou em 1941 quando os italianos depois de sofrerem uma série de derrotas na Líbia contra os britânicos (rendiam-se aos milhares) foram obrigados a pedir ajuda aos alemães: Hitler enviou 3 divisões e Rommel. Nos 2 anos seguintes cobriu-se de glória, na vitória e na derrota. Não vou fazer uma cronologia desse exército prestigiado, mas apresentar algumas ideias do livro.
O afrika korps combateu num meio privilegiado para fazer a guerra: o deserto. Logo, nunca sofreu o problema de provocar vítimas civis (dado de que estes viviam nas poucas cidades que existiam e não viam combates ocorrer dentro delas). O facto de não terem unidades das SS, Gestapos, e outras unidades do género, reduzia o perigo de contaminação dos ideais nazis; a estadia num local tão remoto, sem grandes contactos e com raras licenças contribuiu para lhes dar valores e uma cultura próprios (e desenvolvendo uma identidade que os levaria 30 anos depois a continuarem a reunir-se); e sobretudo a influencia de Rommel que ignorava as ordens que considerava que violavam o espírito militar (fuzilamentos de comandos, retaliações contra actos de sabotagem): num incidente em que soldados italianos tentaram violar mulheres árabes e foram mal sucedidos (alguns deles sendo mortos), pediram a Rommel que fosse feita uma expedição punitiva para castiga-los; ele recusou e disse que não se insistisse mais no assunto.
Tudo começou em 1941 quando os italianos depois de sofrerem uma série de derrotas na Líbia contra os britânicos (rendiam-se aos milhares) foram obrigados a pedir ajuda aos alemães: Hitler enviou 3 divisões e Rommel. Nos 2 anos seguintes cobriu-se de glória, na vitória e na derrota. Não vou fazer uma cronologia desse exército prestigiado, mas apresentar algumas ideias do livro.
O afrika korps combateu num meio privilegiado para fazer a guerra: o deserto. Logo, nunca sofreu o problema de provocar vítimas civis (dado de que estes viviam nas poucas cidades que existiam e não viam combates ocorrer dentro delas). O facto de não terem unidades das SS, Gestapos, e outras unidades do género, reduzia o perigo de contaminação dos ideais nazis; a estadia num local tão remoto, sem grandes contactos e com raras licenças contribuiu para lhes dar valores e uma cultura próprios (e desenvolvendo uma identidade que os levaria 30 anos depois a continuarem a reunir-se); e sobretudo a influencia de Rommel que ignorava as ordens que considerava que violavam o espírito militar (fuzilamentos de comandos, retaliações contra actos de sabotagem): num incidente em que soldados italianos tentaram violar mulheres árabes e foram mal sucedidos (alguns deles sendo mortos), pediram a Rommel que fosse feita uma expedição punitiva para castiga-los; ele recusou e disse que não se insistisse mais no assunto.
terça-feira, junho 29, 2004
Regresso
Voltei depois de uma ausência de 2 semanas de férias. Aproveitei para ler mas ainda não tive tempo de escrever nada de substancial. Fica só então uma pequena anedota: O Marechal Kesselring da força aérea alemã na segunda guerra mundial (notabilizou-se curiosamente no comando das forças alemãs terrestres em itália), estava a sobrevoar Túnis num velho biplano; a Flak (defesa anti-aérea alemã)fez confusão e tentou destrui-lo; quando ele pousou, deu uma descompostura à flak... por ter falhado um alvo tão fácil como o seu avião!
Já agora, no domingo fizemos um ano de existência. Toda a equipa do tempore agradece aos nossos leitores e sobretudo ao J do Cruzes, que sempre nos apoiou (literalmente foi ele que criou o blog do ponto de vista informático).
Já agora, no domingo fizemos um ano de existência. Toda a equipa do tempore agradece aos nossos leitores e sobretudo ao J do Cruzes, que sempre nos apoiou (literalmente foi ele que criou o blog do ponto de vista informático).
terça-feira, junho 08, 2004
Tróia- I
Fui no sábado ao cinema ver o filme Tróia. Tinham-me avisado de que para gostar teria de esquecer o livro e ir sem preconceitos; ainda por cima cheguei 30 minutos atrasado (já só apanhei a viagem de Heitor e Paris). Deste modo, comparando o filme com outros épicos históricos recentes (gladiador), o filme faz boa figura (o filme foi consideravelmente mais curto para mim e não tive tempo de me aborrecer).
Não é histórico, nem o poderia ser, pois os acontecimentos reportam-se a uma mítica guerra do período micénico final (séc. XII a.c.), mas a sociedade que Homero descreve na Ilíada corresponde a uma amálgama de recordações dos séculos posteriores (sobretudo aquilo que é convencional chamar a “Idade das trevas grega” – séc. X a VIII a.c.. de uma sociedade dominada por heróis que rivalizam no campo de batalha para aumentarem a sua glória e fama individual. Como é complicado reproduzir na exactidão as indumentárias e cenários, fez-se uma mistura: os soldados são hoplitas, na recepção que Priámo faz aos filhos aparecem 2 popes; não é muito realista, mas também não é grave em si, dado que a Ilíada sendo um poema também não pretenderia ser realista nesses detalhes.
Passando à história em si, foi feita uma condensação dos acontecimentos (o poema em si, só tem mesmo a desavença de Aquiles com Aganémnon, o massacre dos gregos e o duelo final entre Aquiles e Heitor, com numerosas acções secundárias e intervenções de deuses), o que é normal, pois assim os espectadores ficam a perceber a história.
Tem acção, algumas cenas de batalha como é de esperar bem feitas embora nada de extraordinário (mas desde a cena inicial do soldado Ryan que é difícil fazer melhor), as reproduções em computador são habituais; os diálogos não são nada por aí além, mas também não se tornam ridículos. Fica-se com a ideia de que os diálogos servem para cortar o que seria um filme excessivamente monótono se fossem apenas batalhas (para mim, resultou, mas é uma opinião pessoal).
Quanto à representação das personagens (que foi o que deu mais controvérsia), a critica é bastante mais delicada: até que ponto a caracterização das personagens resulta da visão do realizador ou pelo contrário, da própria interpretação do próprio actor? Falando no caso mais óbvio: o Aquiles de Brad Pitt tem pouco a ver com o da Ilíada, funcionando mais como um mercenário implacável no momento da acção, apreciando poucas coisas (além de ter sido claramente inferior a Peter O’Toole no diálogo entre os dois), enquanto o da obra era sujeito a violentas paixões (e não só pelo Patróclo), preocupado com a sua glória e honra, mas bastante caprichoso. Heitor sempre foi um favorito das sociedades que se pretendem estáveis: alguém que cumpre o seu papel de forma obediente, luta e está disposto a morrer pela sua comunidade (claro que na Ilíada as coisas são um pouquinho diferente: ele vai combater contra Aquiles sabendo que vai morrer e deixar a sua comunidade, mulher e filho desamparados mas combate na mesma dado que a sua honra a tal o impele).
Os restantes personagens estão razoavelmente caracterizados (Páris, Menelau, Ulisses), mesmo que nem sempre muito fiel ao livro, não estando lá apenas para fazer número. O cinema épico actualmente adquiriu certos tiques de que não se livra: a morte de um herói, filmada lentamente (a flecha a atingir o calcanhar de Aquiles).
O filme é assim um bom entretenimento como filme ligeiro e se comparado com outros bem piores. Então qual é o problema? É que a Ilíada não é texto qualquer, é uma obra-prima e uma das obras fundadoras da literatura ocidental, e embora a realização e interpretação embora fossem razoáveis não passaram disso; daí a desilusão.
Não é histórico, nem o poderia ser, pois os acontecimentos reportam-se a uma mítica guerra do período micénico final (séc. XII a.c.), mas a sociedade que Homero descreve na Ilíada corresponde a uma amálgama de recordações dos séculos posteriores (sobretudo aquilo que é convencional chamar a “Idade das trevas grega” – séc. X a VIII a.c.. de uma sociedade dominada por heróis que rivalizam no campo de batalha para aumentarem a sua glória e fama individual. Como é complicado reproduzir na exactidão as indumentárias e cenários, fez-se uma mistura: os soldados são hoplitas, na recepção que Priámo faz aos filhos aparecem 2 popes; não é muito realista, mas também não é grave em si, dado que a Ilíada sendo um poema também não pretenderia ser realista nesses detalhes.
Passando à história em si, foi feita uma condensação dos acontecimentos (o poema em si, só tem mesmo a desavença de Aquiles com Aganémnon, o massacre dos gregos e o duelo final entre Aquiles e Heitor, com numerosas acções secundárias e intervenções de deuses), o que é normal, pois assim os espectadores ficam a perceber a história.
Tem acção, algumas cenas de batalha como é de esperar bem feitas embora nada de extraordinário (mas desde a cena inicial do soldado Ryan que é difícil fazer melhor), as reproduções em computador são habituais; os diálogos não são nada por aí além, mas também não se tornam ridículos. Fica-se com a ideia de que os diálogos servem para cortar o que seria um filme excessivamente monótono se fossem apenas batalhas (para mim, resultou, mas é uma opinião pessoal).
Quanto à representação das personagens (que foi o que deu mais controvérsia), a critica é bastante mais delicada: até que ponto a caracterização das personagens resulta da visão do realizador ou pelo contrário, da própria interpretação do próprio actor? Falando no caso mais óbvio: o Aquiles de Brad Pitt tem pouco a ver com o da Ilíada, funcionando mais como um mercenário implacável no momento da acção, apreciando poucas coisas (além de ter sido claramente inferior a Peter O’Toole no diálogo entre os dois), enquanto o da obra era sujeito a violentas paixões (e não só pelo Patróclo), preocupado com a sua glória e honra, mas bastante caprichoso. Heitor sempre foi um favorito das sociedades que se pretendem estáveis: alguém que cumpre o seu papel de forma obediente, luta e está disposto a morrer pela sua comunidade (claro que na Ilíada as coisas são um pouquinho diferente: ele vai combater contra Aquiles sabendo que vai morrer e deixar a sua comunidade, mulher e filho desamparados mas combate na mesma dado que a sua honra a tal o impele).
Os restantes personagens estão razoavelmente caracterizados (Páris, Menelau, Ulisses), mesmo que nem sempre muito fiel ao livro, não estando lá apenas para fazer número. O cinema épico actualmente adquiriu certos tiques de que não se livra: a morte de um herói, filmada lentamente (a flecha a atingir o calcanhar de Aquiles).
O filme é assim um bom entretenimento como filme ligeiro e se comparado com outros bem piores. Então qual é o problema? É que a Ilíada não é texto qualquer, é uma obra-prima e uma das obras fundadoras da literatura ocidental, e embora a realização e interpretação embora fossem razoáveis não passaram disso; daí a desilusão.
sexta-feira, junho 04, 2004
Suicídio
Algures na primeira metade do séc. XX, é pedido que um grupo de voluntários leve uma carga de explosivos até próximo de um bunquer inimigo e a faça detonar. Apresentam-se voluntários que são abatidos; novos voluntários desta vez conseguem fazê-lo, mas o inimigo apaga a mecha. Outro grupo de voluntários repete a tarefa e o mesmo sucede. O comandante dá uma ordem aos voluntários seguintes: eles terão de se certificar de que o inimigo não apague a mecha, ficando junto próximo a ela até explodir: basicamente, pede-lhes o suicídio; eles aceitam perfeitamente. A missão é levada em diante com sucesso.
Este episódio decorreu na guerra russo-japonesa de 1901, e os soldados eram claro, nipónicos. O oficial em situação normal deveria ser levado a tribunal marcial, pois não é aceitável a exigência de suicídio a soldados (situação apesar de tudo subtilmente diversa de ordens do género “corram para a trincheira inimiga com um ninho de metralhadoras”, ou “resistam às forças esmagadoras que vem na vossa direcção”, pois por vezes o imprevisto sucede), mas o caso foi abafado. Pior: os soldados foram apresentados como modelo de patriotismo e espírito marcial (busho), digno dos antigos samurais. O que é de espantar neste caso, é que eles eram de origem humilde (camponeses) e foram promovidos post-mortem, contando-se a sua história nas escolas para servir de exemplo às crianças, sendo-lhes mesmo erigidas estátuas. Aos poucos, os ideias que tinham sido apanágio de uma classe, foram sendo inculcados a toda a população, resultando em parte na tragédia que foi a participação japonesa na II guerra.
Este episódio decorreu na guerra russo-japonesa de 1901, e os soldados eram claro, nipónicos. O oficial em situação normal deveria ser levado a tribunal marcial, pois não é aceitável a exigência de suicídio a soldados (situação apesar de tudo subtilmente diversa de ordens do género “corram para a trincheira inimiga com um ninho de metralhadoras”, ou “resistam às forças esmagadoras que vem na vossa direcção”, pois por vezes o imprevisto sucede), mas o caso foi abafado. Pior: os soldados foram apresentados como modelo de patriotismo e espírito marcial (busho), digno dos antigos samurais. O que é de espantar neste caso, é que eles eram de origem humilde (camponeses) e foram promovidos post-mortem, contando-se a sua história nas escolas para servir de exemplo às crianças, sendo-lhes mesmo erigidas estátuas. Aos poucos, os ideias que tinham sido apanágio de uma classe, foram sendo inculcados a toda a população, resultando em parte na tragédia que foi a participação japonesa na II guerra.
segunda-feira, maio 31, 2004
Perseguições
Li recentemente ums artigo sobre a ascensão dos nazis. São referidos alguns pontos importantes sobre o anti-semitismo, embora não propriamente originais.
Embora os nazis fossem claramente racistas e anti-semitas, para a maioria dos alemães (que variariam entre o não racistas e o moderadamente racistas em situação normal, tal como a restante população europeia da época), isso não seria um obstáculo para votar neles: era considerada uma componente secundária do seu programa (tirar o país da crise, dar uma liderança forte). Os ataques que efectuavam contra outros grupos (comunistas, sociais-democratas, sindicatos), em vez de serem vistos como desordens, eram pelo contrário a demonstração que alguém estava a restabelecer a ordem. Ora, enquanto que os ataques contra os adversários políticos, eram um meio para atingir um fim (aterrorizar e quebrar a oposição), a violência contra os judeus representava um “bónus”, para as S.A., que davam largas à sua fúria (vandalizando lojas e espancando pessoas) contra um povo visto como inimigo e em que tudo valia (dado que não existia uma ideia concreta do que se devia fazer com eles). Mais, ao subirem ao poder isso permitiu com a erradicação dos cargos e funções que os judeus ocupavam, que numerosos nazis ou simples alemães ocupassem esse lugares. A própria educação da sociedade alemã que apelava a uma obediência à autoridade e uma tácita aceitação de que certas pessoas são mais adequadas que outras ao governo, facilitava essa tarefa (embora a posição nazi fosse extrema e não aceitável pela maioria das pessoas- em situação normal). Assim, por oportunismo, comodismo ou ódio sincero, poucas pessoas estavam dispostas a discutir uma situação que se tornava própria do ambiente (curiosamente, o velho Hindemburg exigiu que os veteranos de guerra fossem livres das discriminações, o Kaiser no seu exílio protestou contra essa política, e o exército conseguiu proteger com um par de excepções todos os oficiais com sangue judeu que eram numerosos
Embora os nazis fossem claramente racistas e anti-semitas, para a maioria dos alemães (que variariam entre o não racistas e o moderadamente racistas em situação normal, tal como a restante população europeia da época), isso não seria um obstáculo para votar neles: era considerada uma componente secundária do seu programa (tirar o país da crise, dar uma liderança forte). Os ataques que efectuavam contra outros grupos (comunistas, sociais-democratas, sindicatos), em vez de serem vistos como desordens, eram pelo contrário a demonstração que alguém estava a restabelecer a ordem. Ora, enquanto que os ataques contra os adversários políticos, eram um meio para atingir um fim (aterrorizar e quebrar a oposição), a violência contra os judeus representava um “bónus”, para as S.A., que davam largas à sua fúria (vandalizando lojas e espancando pessoas) contra um povo visto como inimigo e em que tudo valia (dado que não existia uma ideia concreta do que se devia fazer com eles). Mais, ao subirem ao poder isso permitiu com a erradicação dos cargos e funções que os judeus ocupavam, que numerosos nazis ou simples alemães ocupassem esse lugares. A própria educação da sociedade alemã que apelava a uma obediência à autoridade e uma tácita aceitação de que certas pessoas são mais adequadas que outras ao governo, facilitava essa tarefa (embora a posição nazi fosse extrema e não aceitável pela maioria das pessoas- em situação normal). Assim, por oportunismo, comodismo ou ódio sincero, poucas pessoas estavam dispostas a discutir uma situação que se tornava própria do ambiente (curiosamente, o velho Hindemburg exigiu que os veteranos de guerra fossem livres das discriminações, o Kaiser no seu exílio protestou contra essa política, e o exército conseguiu proteger com um par de excepções todos os oficiais com sangue judeu que eram numerosos
terça-feira, maio 25, 2004
Jogo musical-V
Os princípios do séc. XX representam um corte com a música com a tradição musical europeia (é certo que autores como Wagner, Mussorgsky e Mahler já tinham empregue na sua linguagem musical, recursos extremamente inovadores), mas neste período procurou-se criar deliberadamente novas expressões. A música atonal, o dodecafonismo e a experiência utilizando um sem número de timbres e gamas de sons de forma original deram à música erudita um carácter fragmentário e claramente original, que nunca mais parou até à actualidade. Diversos nomes se salientaram: Schoenberg como iniciador, Alban Berg e Webern (mais recentemente com o serialismo e minimalismo e autores como Boulez, Cage e Reich para referir só os mais famosos). Se o autor passa a ter uma liberdade sem precedentes, é no entanto de notar que em grande parte essa nova música erudita não beneficiou com a divulgação feita pelos meios modernos de comunicação, devido à sua natureza muito experimental e afastada das sonoridades mais tradicionais a que o publico está habituado.
Uma obra? Microcosmos de Bela Bartok (1881-1845). Interessou-se pela música popular de leste (era Húngaro) que recolheu, compilou e utilizou como material de base para as suas próprias composições (apesar de ser considerado imaginativo, cheio de recursos, a sua sonoridade não me agrada minimamente, questão de gostos). Incorporando muitas das inovações do seu tempo, fez uma síntese com a música do passado.
Uma obra? Microcosmos de Bela Bartok (1881-1845). Interessou-se pela música popular de leste (era Húngaro) que recolheu, compilou e utilizou como material de base para as suas próprias composições (apesar de ser considerado imaginativo, cheio de recursos, a sua sonoridade não me agrada minimamente, questão de gostos). Incorporando muitas das inovações do seu tempo, fez uma síntese com a música do passado.
quinta-feira, maio 13, 2004
A Paixão de Cristo
Este post deveria aparentemente pertencer ao Roma Antiga, mas dado que são dúvidas e reflexões minhas, coloco-o no tempore.
Vi recentemente um filme que foi polémico “A paixão de Cristo”. Vou discutir alguns erros ou incorrecções históricas que notei (não, não vou discutir o anti-semitismo, a crueldade, a suposta historicidade ou não dos acontecimentos ou outros elementos que foram debatidos há uns tempos atrás).
A primeira é inofensiva (por comparação com o que se discutiu) e quase passa despercebida: um oficial chama a Pilatos de Cônsul. É um erro algo grosseiro. Era o cargo mais prestigiado da república e como tal se mantinha no império; existiam 2 cônsules em Roma, um normalmente o imperador, e outro uma pessoa que tivesse cumprido o cursus honorum e o seu favor (de boas famílias). Terminado esse período, podia-se tornar procônsul (governador de uma província senatorial), o que não era o caso de Pilatos que era um legado (nomeado directamente pelo imperador e não pelo senado, sendo comandante das tropas locais e saído de uma família equestre). Ou seja, é um erro algo básico para quem teve tantos cuidados de reconstituição (bastava consultar um daqueles esquemas hierárquicos sobre a administração romana que se encontra numa história universal para evitar esse erro) do período.
O outro é uma questão de opinião: Pilatos a falar em aramaico? Em Itália aprendia-se latim como língua mãe (os outros dialectos e línguas como o celta, osco, etrusco e afins tinham desaparecido ou estavam em vias de extinção reduzidas às populações camponesas de zonas isoladas); quem tivesse pretensões a ser culto aprendia o grego que era a língua literária (e para cargos nas zona oriental do império dava jeito, dado ser a língua franca, tal como o inglês actualmente). Ora o aramaico era a língua usada pelas populações semitas do próximo oriente (palestina, síria), mas quem vivesse em zonas urbanas também acabava por aprender o grego que se espalhara com os reinos helenísticos; quais as probabilidades de um governador romano dar-se ao trabalho de aprender uma língua de gente que desprezaria como bárbara (aramaico), se bastava usar outra que seria em princípio compreendida (grego). Poderia quanto muito usar um intérprete; além de que os legados eram normalmente rotativos; estaria num período numa província, terminado o seu mandato iria para outra e dar-se ao trabalho de aprender a nova língua (digamos o celta, o púnico)? Dá-me ideia de que não estiveram foi para filmar numa terceira língua e ficaram-se pelas duas (que já era complicado suficiente para os actores).
Outra dúvida: no filme, Jesus fala com Pilatos em latim (que era completamente ignorado no oriente fora das casernas). Duvido muito que soubesse latim; poderia saber como pequeno artesão o grego, o que não era invulgar (e comunicar com judeus vindos da diáspora) e comunicar com Pilatos nessa língua, mas isto é apenas uma suposição.
Vi recentemente um filme que foi polémico “A paixão de Cristo”. Vou discutir alguns erros ou incorrecções históricas que notei (não, não vou discutir o anti-semitismo, a crueldade, a suposta historicidade ou não dos acontecimentos ou outros elementos que foram debatidos há uns tempos atrás).
A primeira é inofensiva (por comparação com o que se discutiu) e quase passa despercebida: um oficial chama a Pilatos de Cônsul. É um erro algo grosseiro. Era o cargo mais prestigiado da república e como tal se mantinha no império; existiam 2 cônsules em Roma, um normalmente o imperador, e outro uma pessoa que tivesse cumprido o cursus honorum e o seu favor (de boas famílias). Terminado esse período, podia-se tornar procônsul (governador de uma província senatorial), o que não era o caso de Pilatos que era um legado (nomeado directamente pelo imperador e não pelo senado, sendo comandante das tropas locais e saído de uma família equestre). Ou seja, é um erro algo básico para quem teve tantos cuidados de reconstituição (bastava consultar um daqueles esquemas hierárquicos sobre a administração romana que se encontra numa história universal para evitar esse erro) do período.
O outro é uma questão de opinião: Pilatos a falar em aramaico? Em Itália aprendia-se latim como língua mãe (os outros dialectos e línguas como o celta, osco, etrusco e afins tinham desaparecido ou estavam em vias de extinção reduzidas às populações camponesas de zonas isoladas); quem tivesse pretensões a ser culto aprendia o grego que era a língua literária (e para cargos nas zona oriental do império dava jeito, dado ser a língua franca, tal como o inglês actualmente). Ora o aramaico era a língua usada pelas populações semitas do próximo oriente (palestina, síria), mas quem vivesse em zonas urbanas também acabava por aprender o grego que se espalhara com os reinos helenísticos; quais as probabilidades de um governador romano dar-se ao trabalho de aprender uma língua de gente que desprezaria como bárbara (aramaico), se bastava usar outra que seria em princípio compreendida (grego). Poderia quanto muito usar um intérprete; além de que os legados eram normalmente rotativos; estaria num período numa província, terminado o seu mandato iria para outra e dar-se ao trabalho de aprender a nova língua (digamos o celta, o púnico)? Dá-me ideia de que não estiveram foi para filmar numa terceira língua e ficaram-se pelas duas (que já era complicado suficiente para os actores).
Outra dúvida: no filme, Jesus fala com Pilatos em latim (que era completamente ignorado no oriente fora das casernas). Duvido muito que soubesse latim; poderia saber como pequeno artesão o grego, o que não era invulgar (e comunicar com judeus vindos da diáspora) e comunicar com Pilatos nessa língua, mas isto é apenas uma suposição.
terça-feira, maio 11, 2004
Viagens
Bem, voltei do meu périplo pelas beiras. Vou só fazer um breve resumo.
Estive em Viseu: passei pela Sé e Igreja da Misericórdia; o museu Grão Vasco estava fechado (abriu poucos dias depois de sair de lá, foi mesmo azar). Aproveitei para ver várias aldeias abandonadas (algumas recentemente, nos anos 80) e mete dó ver o interior do nosso país reduzir-se a algumas cidades que tudo concentram. Estive na Sé da Guarda, um edifício verdadeiramente imponente (românico), e andei a cirandar pela zona histórica (embora estivesse um frio de rachar). Fui a Sortelha, Mangualde, Gouveia, Celorico da Beira e numerosas outras povoações. A gastronomia é excelente, e fica-se com a ilusão de que cada vila e aldeia têm o seu castelo em ruínas (bem, eu sei, o que sucede é que foram povoações importante que pararam no tempo). Pois, ruínas. As igrejas são conservadas (dado que ainda são usadas para o culto), alguns dos solares vão-se mantendo como residências particulares ou estalagens, mas os castelos estão na maioria dos casos num estado lastimoso.
Estive em Viseu: passei pela Sé e Igreja da Misericórdia; o museu Grão Vasco estava fechado (abriu poucos dias depois de sair de lá, foi mesmo azar). Aproveitei para ver várias aldeias abandonadas (algumas recentemente, nos anos 80) e mete dó ver o interior do nosso país reduzir-se a algumas cidades que tudo concentram. Estive na Sé da Guarda, um edifício verdadeiramente imponente (românico), e andei a cirandar pela zona histórica (embora estivesse um frio de rachar). Fui a Sortelha, Mangualde, Gouveia, Celorico da Beira e numerosas outras povoações. A gastronomia é excelente, e fica-se com a ilusão de que cada vila e aldeia têm o seu castelo em ruínas (bem, eu sei, o que sucede é que foram povoações importante que pararam no tempo). Pois, ruínas. As igrejas são conservadas (dado que ainda são usadas para o culto), alguns dos solares vão-se mantendo como residências particulares ou estalagens, mas os castelos estão na maioria dos casos num estado lastimoso.
sábado, maio 01, 2004
711 - O Fim do Reino Visigodo (?)
É do conhecimento geral que o Reino Visigodo terminou com a derrota de Roderico ou Rodrigo na batalha de Guadalete. Mas segundo Juan António Cebrián, o último rei visigodo pode ter mantido uma resistência activa, que resultaria num estranho túmulo na antiga província da Lusitnia, mais precisamente nos arredores de Viseu, com a seguinte inscrição: Rodericus Rex.
Segundo o mesmo autor, a sua mulher, Egilona, morreu em 712, deixando uma filha de nome Egilón, que se converteu ao Islamismo com o nome de Umm `Asim e se casou com o governador do Al-Andalus, Abd Al Aziz. Desse casamento nasceu Ben Abd Al Aziz Omar ou Umar ibn Abd al-Aziz, que chegou a ser califa de Damasco entre 712 e 720.
Paradoxalmente, o neto do rei cristão visigodo tornou-se califa Omaída de Damasco.
Segundo o mesmo autor, a sua mulher, Egilona, morreu em 712, deixando uma filha de nome Egilón, que se converteu ao Islamismo com o nome de Umm `Asim e se casou com o governador do Al-Andalus, Abd Al Aziz. Desse casamento nasceu Ben Abd Al Aziz Omar ou Umar ibn Abd al-Aziz, que chegou a ser califa de Damasco entre 712 e 720.
Paradoxalmente, o neto do rei cristão visigodo tornou-se califa Omaída de Damasco.
quarta-feira, abril 28, 2004
Jogo musical-IV
Bem, cá vai outra decisão difícil: para meados do séc. XIX, quem escolher? Faria mais sentido ter um top-10 só nesse período. Wagner é fundamental na evolução na ópera (a marcha fúnebre de Siegfried é verdadeiramente espantosa, assim como o prelúdio de Tristão e Isolda), Verdi conseguiu ser popular como só em Itália um artista de qualidade consegue ser (actualmente as coisas modificaram-se, mas até há duas gerações atrás as suas músicas eram cantadas pela população como êxitos de pop), Strauss fez uma música que para muitos simboliza o séc. XIX- o Danúbio azul- com as suas valsas dançadas por todas as cortes europeias (embora o abomine), Liszt um virtuoso no piano, Schuman que tornou as suas música verdadeiros poemas, e tantos outros que marcaram a história da música.
Qualquer um destes autores serve para exemplificar o espírito romântico. Mas só pode ser uma obra. Bom, então decidi escolher uma obra que passa completamente ao lado: os “Quadro de uma exposição” de Mussorgsky (1839-1881), compositor russo. É uma série de peças para piano (que teve uma fantástica adaptação para orquestra por Ravel), baseada em temas do folclore russo. Baba Yaga (a bruxa temível da mitologia russa), a grande porta de Kiev, o mercado, e sobretudo a música mais solene de todas- Gopak (ou o poleiro das galinhas segundo o que me disse uma vez uma amiga checa). A sonoridade comparada com o que se fazia na época era bastante agreste (mesmo com os compositores russos que faziam música de acordo com os cânones europeus); a noite no monte calvo é outra do mesmo género.
Um nota: por razões de motivo pessoal só poderei voltar a escrever neste blogue dentro de duas semanas; os meus colegas irão assegurar a continuidade.
Qualquer um destes autores serve para exemplificar o espírito romântico. Mas só pode ser uma obra. Bom, então decidi escolher uma obra que passa completamente ao lado: os “Quadro de uma exposição” de Mussorgsky (1839-1881), compositor russo. É uma série de peças para piano (que teve uma fantástica adaptação para orquestra por Ravel), baseada em temas do folclore russo. Baba Yaga (a bruxa temível da mitologia russa), a grande porta de Kiev, o mercado, e sobretudo a música mais solene de todas- Gopak (ou o poleiro das galinhas segundo o que me disse uma vez uma amiga checa). A sonoridade comparada com o que se fazia na época era bastante agreste (mesmo com os compositores russos que faziam música de acordo com os cânones europeus); a noite no monte calvo é outra do mesmo género.
Um nota: por razões de motivo pessoal só poderei voltar a escrever neste blogue dentro de duas semanas; os meus colegas irão assegurar a continuidade.
segunda-feira, abril 26, 2004
25 de Abril
Nesta data caiu o fascismo depois de 20 anos de poder. 20 anos diz o leitor? Sim, porque estou a comemorar a queda do fascimo em Itália que foi a 25 de Abril de 1945. A República de Saló (de que já fiz um post numa outra ocasião), fora um regime sustentado unicamente pelos alemães, em que a nomeação de cada alto dignatário (muito mais radicais do que o regime fascista derrubado por uma cabala composta pelos membros do Grande Conselho Fascista em 1943) teria de ser aprovado pelos nazis, o exército servia unicamente para apoiar as forças alemães, os Judeus e grupos de indesejados eram activamente procurados, presos e deportados. Ora desprovidos de qualquer apoio popular, profundamente odiados, com o avanço dos aliados e o recuo dos alemães, deu-se uma insurreição geral dos movimentos de partisans (que tinha agrupado todas as tendências políticas) que derrubou a sombra de poder que os fascistas tinham.
domingo, abril 25, 2004
quarta-feira, abril 21, 2004
Estórias pitorescas
Vou contar duas histórias que considero interessantes.
No século III A.C. um grupo de gauleses (as crónicas diziam que eram 800) foi exilado e decidiu servir as cidades gregas da Magna Grécia; traíram os vários senhores e acabaram por ser contratados por Roma; ao serviço desta, saquearam templos de aliados e Roma rapidamente os despediu pelos protestos. Depois de mais umas aventuras, foram contratados pelos epirotas que os colocaram como guarnição da sua capital; estes mercenários traíram mais uma vez os seus senhores e venderam a população a um grupo de piratas Ilírios que estavam de passagem; depois a História não fala mais deste grupo.
A segunda estória é ainda mais curiosa. Quando os americanos desembarcaram na Normandia, do exército eclético que os alemães lhes opuseram, estava uma unidade coreana. Ora pergunta o leitor, como chegaram coreanos até aí? Bem, recuando um década, o território estava em mãos dos japoneses; estes tiveram uma curta guerra contra a URSS nas vésperas da II Guerra, chamada o “Incidente Manchu” (em que Jukov os deixou muito mal-tratados, fazendo com que evitassem declarar-lhes a guerra quando Hitler lhes pediu). Ora uma unidade de Coreanos recrutada pelos Japoneses foi assim aprisionada pelos soviéticos. Estando nos campos de concentração, quando se deu a invasão da URSS pela Alemanha, estes homens foram remobilizados mas rapidamente se renderam aos nazis, dado o fraco estímulo que tinham para combater por um país que nada lhes dizia. Ora se a Alemanha era muito exigente em termos de pureza de raça para detalhes administrativos, era-o muito menos quando se tratava de recrutar soldados para as SS (que eram os únicos que podiam recrutar estrangeiros, dado que o exército só aceitava alemães), levando a que a unidade de elite alemã, aceitasse todos os “sub-humanos” possíveis e imaginários, que eram reclassificados para serem aceites (mongóis, bálticos, asiáticos, latinos), considerando-se que se estavam afinal a combater pelo Reich; foram colocados na Normandia e claro que quando puderam, renderam-se imediatamente aos americanos; não sei o que lhes sucedeu de seguida, mas imagino que tenham ido parar a um campo de concentração americano e com um bocado de sorte tenham ficado a trabalhar nos E.U.A.; seja como for, acabaram por sobreviver a uma série de guerras que não eram a deles, de exército em exército, e de campo de concentração em campo de concentração, o que já não é mau.
No século III A.C. um grupo de gauleses (as crónicas diziam que eram 800) foi exilado e decidiu servir as cidades gregas da Magna Grécia; traíram os vários senhores e acabaram por ser contratados por Roma; ao serviço desta, saquearam templos de aliados e Roma rapidamente os despediu pelos protestos. Depois de mais umas aventuras, foram contratados pelos epirotas que os colocaram como guarnição da sua capital; estes mercenários traíram mais uma vez os seus senhores e venderam a população a um grupo de piratas Ilírios que estavam de passagem; depois a História não fala mais deste grupo.
A segunda estória é ainda mais curiosa. Quando os americanos desembarcaram na Normandia, do exército eclético que os alemães lhes opuseram, estava uma unidade coreana. Ora pergunta o leitor, como chegaram coreanos até aí? Bem, recuando um década, o território estava em mãos dos japoneses; estes tiveram uma curta guerra contra a URSS nas vésperas da II Guerra, chamada o “Incidente Manchu” (em que Jukov os deixou muito mal-tratados, fazendo com que evitassem declarar-lhes a guerra quando Hitler lhes pediu). Ora uma unidade de Coreanos recrutada pelos Japoneses foi assim aprisionada pelos soviéticos. Estando nos campos de concentração, quando se deu a invasão da URSS pela Alemanha, estes homens foram remobilizados mas rapidamente se renderam aos nazis, dado o fraco estímulo que tinham para combater por um país que nada lhes dizia. Ora se a Alemanha era muito exigente em termos de pureza de raça para detalhes administrativos, era-o muito menos quando se tratava de recrutar soldados para as SS (que eram os únicos que podiam recrutar estrangeiros, dado que o exército só aceitava alemães), levando a que a unidade de elite alemã, aceitasse todos os “sub-humanos” possíveis e imaginários, que eram reclassificados para serem aceites (mongóis, bálticos, asiáticos, latinos), considerando-se que se estavam afinal a combater pelo Reich; foram colocados na Normandia e claro que quando puderam, renderam-se imediatamente aos americanos; não sei o que lhes sucedeu de seguida, mas imagino que tenham ido parar a um campo de concentração americano e com um bocado de sorte tenham ficado a trabalhar nos E.U.A.; seja como for, acabaram por sobreviver a uma série de guerras que não eram a deles, de exército em exército, e de campo de concentração em campo de concentração, o que já não é mau.
domingo, abril 18, 2004
Pioneiro da Estatística
Lutero, o grande reformador do cristianismo, casou-se aos 42 anos com uma monja de 26. Sabemos que teve 104 relações sexuais durante o primeiro ano de casamento porque anotava todos os factos importantes da sua vida num diário que que constitui a primeira estatística sobre frequência de relações sexuais. Não tece é comentários acerca do grau de satisfação de cada um!
sexta-feira, abril 16, 2004
Jogo musical-III
A escolha seguinte é terrivelmente complicada: se excluirmos alguns dos génios maiores do séc. XVIII como Bach, Mozart, todos eles com obras importantíssimas, ainda ficam autores fundamentais como Haendel, Haydn, Vivaldi, os Scarlatti pai e filho; creio que se pode dizer que este é um dos períodos mais fecundos da música. Logo, a escolha seguinte é quase aleatória e vai para... as peças de cravo bem temperado de Bach.
A escolha justifica-se porque corresponde a um tipo de obras representativa da época, que eram bastante apreciadas (embora estas na época tivessem passado relativamente despercebidas); a sua carreira também é semelhante à de numerosos músicos seus contemporâneos: pertencente a uma família de músicos luteranos, deambulou pela Alemanha servindo diversos patronos, e ocupando vários cargos: podemos destacar na sua vida que foi organista em Arnstadt, músico de corte em Weimar, director musical em Leipzig (chegou mesmo a compor uma missa para um eleitor católico). Sei que existem outras obras mais geniais quer no domínio profano quer religioso (concertos de Brandemburgo, as cantatas, as paixões ou as variações de Goldberg no seu caso; diversas sinfonias, concertos e óperas no caso de Mozart, só para falar dos casos mais famosos), mas essas peças mais humildes não representando a genialidade ou a revolução, espelham melhor o espírito da época.
Uma chamada de atenção: os links de música que eu faço, tem samples das músicas que escolhi e que podem ser ouvidas, não os coloco para fazer publicidade à amazon; digo isto, porque já me foi perguntado porque é que eu não punha exemplos das músicas.
A escolha justifica-se porque corresponde a um tipo de obras representativa da época, que eram bastante apreciadas (embora estas na época tivessem passado relativamente despercebidas); a sua carreira também é semelhante à de numerosos músicos seus contemporâneos: pertencente a uma família de músicos luteranos, deambulou pela Alemanha servindo diversos patronos, e ocupando vários cargos: podemos destacar na sua vida que foi organista em Arnstadt, músico de corte em Weimar, director musical em Leipzig (chegou mesmo a compor uma missa para um eleitor católico). Sei que existem outras obras mais geniais quer no domínio profano quer religioso (concertos de Brandemburgo, as cantatas, as paixões ou as variações de Goldberg no seu caso; diversas sinfonias, concertos e óperas no caso de Mozart, só para falar dos casos mais famosos), mas essas peças mais humildes não representando a genialidade ou a revolução, espelham melhor o espírito da época.
Uma chamada de atenção: os links de música que eu faço, tem samples das músicas que escolhi e que podem ser ouvidas, não os coloco para fazer publicidade à amazon; digo isto, porque já me foi perguntado porque é que eu não punha exemplos das músicas.
terça-feira, abril 13, 2004
Veneza-IV
Não vou colocar hoje os links relacionados com os artistas em questão; qualquer busca na Internet ou numa enciclopédia de arte permitirá encontrá-los sem qualquer dificuldade.
A basílica de São Marcos é sem dúvida o monumento mais conhecido de Veneza. Construída seguindo o modelo Bizantino, as cores, os mosaicos, os dourados, as cúpulas, tudo lhe dá um ar bem diferente das Igrejas ocidentais; as pilhagens de Constantinopla em 1204 iriam acrescentar com peças do modelo original, a magnifica igreja. Claro que outras influências artísticas ocidentais se notam; mas a marca do original ficou lá; aliás, até muito tarde, na pintura continuaram a seguir a paleta de cores bizantinas. O palácio dos doges é outra obra arquitectónica notável; construído em estilo gótico, sofreu vários incêndios e remodelações. Multiplicam-se os palácios e Igrejas num estilo muito próprio; Palladio, mais tarde iria mostrar como as suas fachadas adaptavam-se maravilhosamente nesta cidade. Com o renascimento, a pintura veneziana revelou grande originalidade, pois dava primazia à cor (sobretudo quentes) em vez do desenho como em Florença; os seus temas eram também mais exuberantes (com roupas e paisagens sumptuosas). Quadros como “As bodas de Canaa” de Veroneso ou “A apresentação da Virgem ao Templo” de Tintoretto ilustram isso perfeitamente. Muitos outros autores se destacaram em Veneza: Titiano, Giorgione, depois deste verdadeiro brilho artístico, contemporâneo dos últimos tempos de glória de Veneza, a cidade parece entrar em letargia. É certo que ainda faltava Tiepolo, Guardi e Canaletto retratarem a cidade, mas esta já tinha os seus dias de glória passados. Ela começa então a viver da sua imagem, das suas festas, do Carnaval mascarado, mistura de luxo e requinte, onde estrangeiros procuram os seus divertimentos, as suas cortesãs, o anonimato que lhes garante uma máscara e uma bolsa recheada. Figuras do mundo artístico dirigem-se para lá como Byron, Wagner. Mesmo actualmente a cidade mantém o seu atractivo: Visconti no “Morte em Veneza” baseada na obra de Thomas Mann (e a música belíssima de Mahler), ou na banda desenhada de Pratt com o “Fábula de Veneza”. Todos os anos, passam na época do Carnaval ainda imagens da sua festa; a bienal de Veneza e o seu festival de cinema são elementos incontornáveis da arte, pois a cidade é sinónimo de cultura.
A basílica de São Marcos é sem dúvida o monumento mais conhecido de Veneza. Construída seguindo o modelo Bizantino, as cores, os mosaicos, os dourados, as cúpulas, tudo lhe dá um ar bem diferente das Igrejas ocidentais; as pilhagens de Constantinopla em 1204 iriam acrescentar com peças do modelo original, a magnifica igreja. Claro que outras influências artísticas ocidentais se notam; mas a marca do original ficou lá; aliás, até muito tarde, na pintura continuaram a seguir a paleta de cores bizantinas. O palácio dos doges é outra obra arquitectónica notável; construído em estilo gótico, sofreu vários incêndios e remodelações. Multiplicam-se os palácios e Igrejas num estilo muito próprio; Palladio, mais tarde iria mostrar como as suas fachadas adaptavam-se maravilhosamente nesta cidade. Com o renascimento, a pintura veneziana revelou grande originalidade, pois dava primazia à cor (sobretudo quentes) em vez do desenho como em Florença; os seus temas eram também mais exuberantes (com roupas e paisagens sumptuosas). Quadros como “As bodas de Canaa” de Veroneso ou “A apresentação da Virgem ao Templo” de Tintoretto ilustram isso perfeitamente. Muitos outros autores se destacaram em Veneza: Titiano, Giorgione, depois deste verdadeiro brilho artístico, contemporâneo dos últimos tempos de glória de Veneza, a cidade parece entrar em letargia. É certo que ainda faltava Tiepolo, Guardi e Canaletto retratarem a cidade, mas esta já tinha os seus dias de glória passados. Ela começa então a viver da sua imagem, das suas festas, do Carnaval mascarado, mistura de luxo e requinte, onde estrangeiros procuram os seus divertimentos, as suas cortesãs, o anonimato que lhes garante uma máscara e uma bolsa recheada. Figuras do mundo artístico dirigem-se para lá como Byron, Wagner. Mesmo actualmente a cidade mantém o seu atractivo: Visconti no “Morte em Veneza” baseada na obra de Thomas Mann (e a música belíssima de Mahler), ou na banda desenhada de Pratt com o “Fábula de Veneza”. Todos os anos, passam na época do Carnaval ainda imagens da sua festa; a bienal de Veneza e o seu festival de cinema são elementos incontornáveis da arte, pois a cidade é sinónimo de cultura.
domingo, abril 04, 2004
"VITAMINAS" DOS GUERREIROS SAXÕES
O afã de vitória levou os homens de todas as épocas a fazer coisas surpreendentes. Loga após a queda do Império Romano do Ocidente, os guerreiros saxões, antes de entrarem em batalha, preparavam algumas ovelhas e cabras com as quais copulavam. Depois matavam-nas e devoravam-nas. Consideravam que estes rituais os tornavam invulneráveis.
quarta-feira, março 31, 2004
Jogo musical-II
A nossa segunda peça é o Orfeu (1607) de Cláudio Monteverdi (1567-1643): foi durante anos considerada a primeira ópera e embora agora se saiba que não foi assim, continua a ser considerada importante. Vários elementos estiveram por base desse novo género musical: o teatro medieval (que por vezes era cantado), as pastorelas e madrigais que eram compostos de forma a contar uma história e um esforço deliberado de tentar imitar o antigo teatro grego; tudo isso deu origem a uma nova forma de arte, no qual um libretista escrevia a estória (nós diríamos o argumento) com as falas que era musicada pelo compositor. Monteverdi adaptou o modelo, incluiu uma verdadeira orquestra e não alguns músicos de acompanhamento (tinha recursos para isso na corte de Mântua), e a sua popularidade adquirida em outros géneros permitiu-lhe fazer mais algumas (já em Veneza). Orfeo conta a estória do mito grego de Orfeo e Eurídice: ela morrera e ele um mestre da música desce aos infernos onde consegue comover Hades (senhor dos infernos) a deixá-la partir embora o senhor dos mortos põem como condição de que ele não olhe para trás a confirmar que ela o segue; ele concorda mas mais tarde por não ouvir os seus passos, não resiste e ela desaparece de vez .
Entretanto o género (que surgira em Florença) foi-se difundindo nos anos seguintes em Roma onde os eclesiásticos patrocinavam o novo estilo. Nesses primeiros anos, as óperas eram pagas por um mecenas que encomendavam a peça para comemorar um acontecimento importante (subida ao trono, casamento, etc) que podia ser aberto ao público ou unicamente representado perante um pequena assembleia; uns anos depois os Venezianos pragmaticamente resolveram o problema dos mecenas, permitindo o acesso do público ao teatro onde seria representada a ópera em troca de um pagamento. As óperas variavam de acordo com as tradições culturais: maior importância à música e subordinação do libreto (que era um mero pretexto para efeitos líricos) ou pelo contrário era realçada a estória, sendo a música apenas um acompanhamento; quando existissem meios, era utilizadas máquinas para fazer efeitos cénicos e encenações que espantassem os espectadores (efeitos especiais como agora se diz).
Entretanto o género (que surgira em Florença) foi-se difundindo nos anos seguintes em Roma onde os eclesiásticos patrocinavam o novo estilo. Nesses primeiros anos, as óperas eram pagas por um mecenas que encomendavam a peça para comemorar um acontecimento importante (subida ao trono, casamento, etc) que podia ser aberto ao público ou unicamente representado perante um pequena assembleia; uns anos depois os Venezianos pragmaticamente resolveram o problema dos mecenas, permitindo o acesso do público ao teatro onde seria representada a ópera em troca de um pagamento. As óperas variavam de acordo com as tradições culturais: maior importância à música e subordinação do libreto (que era um mero pretexto para efeitos líricos) ou pelo contrário era realçada a estória, sendo a música apenas um acompanhamento; quando existissem meios, era utilizadas máquinas para fazer efeitos cénicos e encenações que espantassem os espectadores (efeitos especiais como agora se diz).
segunda-feira, março 29, 2004
Veneza-III
Quando chegamos ao séc. XI, Veneza já é uma potência com que é preciso contar no Mediterrâneo; as cruzadas ampliaram enormemente a sua esfera de acção: só Veneza podia dispor de uma frota consistente para transportar homens e víveres (sendo paga com privilégios nos novos estados, ditando a política desses reinos ou recebendo territórios). A IV cruzada, que se pode considerar um terrível crime contra a cultura (uma cruzada desviada para atacar uma cidade cristã que fora um baluarte do cristianismo como pagamento de dívida), representou para Veneza uma fantástica benesse: livraram-se de um rival, apanharam partes do seu império e embelezaram a sua cidade (os cavalos da Basílica de S. Marcos vieram de Constantinopla), dando-lhe o toque oriental e exótico em relação às outras cidades italianas (pronto, a influência já vinha de trás e manteve-se); ficaram também com uma fama de traiçoeiros de que nunca se livraram. Em rivalidade com Génova, espoliaram o novo Império restaurado, contribuindo para a ascensão dos turcos; quando estes transformaram a cidade milenar em Istambul, Veneza começa a preparar a retirada: combatendo a cada passo, vai aumentando o seu território na terra ferma (entre vitórias e derrotas), competindo com outros estado italianos, com o Papado, o Império, a França... Se não consegue fazer a unificação (mas provavelmente nunca esteve nos seus planos), perdendo o seu império comercial e colonial, obtém uma última esplêndida vitória em Lepanto em 1571; provavelmente inútil, e apenas simbólica, pois os turcos estavam a perder o fôlego das conquistas devido a transformações sociais e mentais no seu império que estavam a provocar uma estagnação), mas que deu um enorme alívio e orgulho à Europa da época (pois já não podemos falar de Cristandade). A perca da Cândia em 1669 representa o último estertor do estado marítimo. E no entanto, dois séculos depois, quando as tropas de Napoleão invadem o Veneto, as tropas recrutadas combatem ao grito de “Marco, Marco” e a população recebe silenciosa os anúncios de libertação com a igualdade e liberdade e fraternidade, sinal de que o patriotismo Veneziano mantinha-se. Em 1849, depois de um longo cerco, a recém formada república Veneziana, rendia-se depois de meses de cerco às tropas austríacas; em 1866 entrava para o reino de Itália.
sexta-feira, março 26, 2004
Solução para o despovoamento do interior!
(Foi-me enviado por e-mail)
Do Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo
SENTENÇA PROFERIDA EM 1487 NO PROCESSO CONTRA O PRIOR DE TRANCOSO
(Autos arquivados na Torre do Tombo, armário 5.o,maço 7)
Padre Francisco da Costa, prior de Trancoso, de idade de sessenta e dois anos, será degredado de suas ordens e arrastado pelas ruas públicas nos rabos dos cavalos, esquartejado o seu corpo e postos os quartos, cabeça e mãos em diferentes distritos, pelo crime que foi arguido e que ele mesmo não contrariou, sendo acusado de ter dormido com vinte e nove afilhadas e tendo delas noventa e sete filhas e trinta e sete filhos; de cinco irmãs teve bdezoito filhas; de nove comadres trinta e oito filhos e dezoito filhas; de sete amas teve vinte e nove filhos e cinco filhas; de duas escravas teve vinte e um filhos e sete filhas; dormiu com uma tia, chamada Ana da Cunha, de quem teve três filhas, da própria mãe teve dois filhos.
Total: duzentos e noventa e nove, sendo duzentos e catorze do sexo feminino e oitenta e cinco do sexo masculino, tendo concebido em cinquenta e três mulheres.
Agora vem a melhor:
El-Rei D. João II lhe perdoou a morte e o mandou por em liberdade aos dezassete dias do mês de Março de 1487, com o fundamento de ajudar a povoar aquela região da Beira Alta, tão despovoada ao tempo e guardar no Real Arquivo da Torre do Tombo esta sentença, devassa e mais papéis que formaram o processo.
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