segunda-feira, agosto 28, 2006
O império Holandês-I
De uma forma resumida: na década de 1560, as províncias do sul (habitualmente chamada de Flandres), viram uma parte importante converter-se ao calvinismo. A repressão espanhola não tardou e muitos dos calvinistas fugiram para as províncias do norte (que se tinham mantido católicas). Expulsando os padres da igreja católica (ao contrário do que sucedera no sul, em que os padres se tinham convertidos em ministros protestantes), sem poder impor à população a nova religião, conseguiram pelo menos apropriar-se do governo das 7 províncias. A província da Holanda começou (com o afluxo de refugiados do sul) a dedicar-se à pirataria, e ao fechar a entrada do rio escalda ao porto de Antuérpia (o grande porto do sul), liquidou o comércio das províncias do sul, tendo Amesterdão no norte substituído Antuérpia. Grupos de mercadores associavam-se (para minimizar as perdas) e começaram a enviar pequenas frotas para o oriente (até então monopólio dos portugueses): apesar de por vezes as perdas incluírem ¾ dos barcos, os lucros chegavam aos 400 %. O dinheiro era em parte investido noutros negócios (como seguro no caso das coisas correrem mal), mas a maior parte era reinvestido em novas frotas. Ao fim de alguns anos, os mercadores começaram a associar-se em companhias que se disputavam (havia uma média uma companhia por província); para evitar as rivalidades, essas companhias fundiram-se, criando a companhia das índias ocidentais, e a companhia das ilhas orientais. Assim formava-se uma forte e rica classe de mercadores com espírito de iniciativa, que contrastava com as monarquias ibéricas, em que a Coroa detinha o monopólio dos comércios mais lucrativos, com pesadas burocracias.
À medida que os anos passando, as 2 companhias deixaram de ter um carácter estritamente comercial, e começaram a conquistar territórios (sobretudo aos portugueses), ocupando parte do Brasil, Angola, etc. A ocupação de territórios exigia a manutenção de guarnições e frotas de defesa ao mesmo tempo que os inimigos europeus aumentavam (e mesmo os indígenas que deixavam de os ver como libertadores para meros novos ocupantes), perdendo boa parte dos seus territórios e da sua parte do comércio. Acabaram por ficar apenas com alguns enclaves nas Antilhas, Suriname, Indonésia, e uma colónia no cabo destinada a ter um curioso destino.
sexta-feira, agosto 18, 2006
Satyricon
Comprei há uns tempos o filme de Felini; tinha-o visto há uns bons 10 anos e agora pude revê-lo.
A história é uma adaptação livre da obra de Petrónio, relatando as aventuras de 2 libertos (Encolpio e Ascilto) que disputam os favores de um escravo (Giton) na época de Nero. O ambiente é algo surrealista, muito diferente das obras de Hollywood, com cenários e cores muito fortes; o ambiente de decadência que se normalmente associa a Roma está bem representado, com toda uma galeria de personagens depravadas (heterossexuais e homosexuais) e pitorescas. A história não é contínua, sendo por episódios que se sucedem sem grande relação entre si (o que de algum modo acontece no livro, dado que este nos chegou mutilado).
O início começa com uma disputa entre os libertos sobre o escravo num bordel (de ambiente grandioso e escuro). Vemos depois uma arenga de um poeta (Aganemnon) sobre a decadência das artes numa galeria /museu (existindo o episódio no livro, parece-me que foi plenamente adaptado aos tempos modernos). Segue-se o banquete de Trimalquião (o cenário é ao ar livre embora representando uma villa): um liberto milionário que se gaba da sua fortuna e vemos os seus amigos (com menos posses) a elogia-lo e a apresentarem as suas vidas (acho que a cena do cozinheiro tem mais impacto no livro, com tantos pormenores visuais, o filme perde bastante). A partir daqui o filme vai-se afastando cada vez mais do livro (e de qualquer cronologia coerente). Capturam um semi-deus hermafrodita (matando os seus companheiros) para obter um resgate mas ele acaba por morrer por falta de cuidados; são mais tarde feitos prisioneiros num navio e explorados sexualmente (embora isso não os desagradasse). Numa casa de patrícios em que os donos foram ordenados que cometessem suicídio (só fugindo os filhos), dois dos companheiros divertem-se com uma escrava que ficou. Um deles é obrigado noutro episódio a combater numa arena a imitar o labirinto de Cnossos, descobrindo no final que está impotente; numa espécie de bordel tenta recuperar a sua virilidade mas falha, parte em busca de uma feiticeira que acaba por cura-lo.
Ok, o que se segue é a minha impressão pessoal.
O filme não é para todos os estômagos, mas eu gostei muito e é visualmente belíssimo. Todo o ambiente é cínico e bem disposto, embora se fique com uma certa sensação de vazio (sobretudo no fim): aqueles personagens apenas seguem os seus prazeres, estão dispostas a qualquer intriga, mentira, calúnia ou assassínio para obterem o que querem (gratificação imediata), mas limitando-se a isso sem qualquer objectivo formando um maior contraste com o casal suicida (episódio introduzido por Felini, precisamente creio eu para marcar a diferença).
segunda-feira, agosto 14, 2006
Desenhos pré-dinásticos no Egipto
Público 11.08.2006 - 16h55 Lusa
Os desenhos representam cabras, camurças, carneiros, coelhos, gatos selvagens, escorpiões e répteis, para além de animais semelhantes a girafas e elefantes.
"Entre essas figuras, parecendo inspirado num combate, destaca-se a de dois homens lutando com bastões, um deles montado num animal semelhante a um camelo e o outro defendendo-se do primeiro com um escudo circular", adiantou Hawass.
Na mesma zona foram descobertos vestígios de duas habitações.
O plano de rastreio de vestígios arqueológicos pré-históricos está a ser realizado em todo o país pelo Conselho Supremo de Antiguidades.
quinta-feira, agosto 10, 2006
Herodes o grande
O seu pai Antipater, um idumeu (uma etnia que fora conquistada pelos judeus e obrigada a converter-se ao judaísmo), era amigo do rei Hircanio da Judeia. Este foi destronado pelo seu irmão (bastante mais competente), mas Antipater conseguiu com intervenções estrangeiras (árabes e romanos) devolver o trono a Hircanio. Antipater foi colocando os seus filhos e parentes em lugares chave, enquanto que a guerra civil entre os reis irmãos continuava. Com o assassínio de Antipater, Herodes sucedeu na direcção do reino. Tendo comandado os exércitos do pai (e combatendo mesmo na frente), continuou a faze-lo. Marco António decidiu que entre Hircanio (incompetente) e Antígono (anti-romano), dar a realeza a Herodes que sempre lhe fora fiel era o melhor. Quando Octávio venceu, Herodes decidiu jogar de forma franca: em vez de dizer que fora obrigado a apoiar Marco António e dizer que este fora um mau líder, assumiu que sempre lhe fora fiel e amigo e que se não tivesse sido desviado por outros motivo, teria combatido contra Octávio em Actium. Devolvia portanto a coroa ao vencedor. Octávio apreciou a franqueza e manteve-o no poder; nos anos seguintes iria até aumentar o território de Herodes pela ajuda que lhe iria prestar.
Herodes passaria numerosos anos a pacificar o território que passara anos em guerra civil e sofrera com o banditismo, utilizando uma repressão brutal. As tensões religiosas (pois muitos viam com maus olhos a submissão a romanos que eram pagãos), aliava-se a um problema dinástico: Herodes continuava a ser visto como usurpador estrangeiro que destronara com o apoio romano a dinastia legítima. Esta rapidamente se extinguiu, pois Herodes eliminou sucessivamente todos os representantes masculinos. Só sobreviveram 2 mulheres com quem ele casou (e mandou matar depois) de quem teve filhos. Na sua própria família as coisas não correram bem: sofreu diversas conspirações de familiares, mandou matar 3 filhos, várias esposas, parentes e amigos.
Pelo menos uma coisa não lhe pode imputado: não há nenhuma descrição de mandar matar bebés como é dito no novo testamento (se bem que ordenou imensas outras execuções igualmente repugnantes).
Mandou construir palácios, monumentos e restaurar o Templo de Jerusalém. Basicamente teve uma vida semelhante a numerosos soberanos helenísticos, com a diferença de que sendo plebeu, continuou a ascensão ao trono começada pelo pai, criando uma dinastia que durou um século.
segunda-feira, agosto 07, 2006
Ordens idiotas
sexta-feira, agosto 04, 2006
Arquimedes
terça-feira, agosto 01, 2006
Fim das férias
Voltei de férias. Aproveitei para ler um pouco de tudo. No entanto, vou continuar a descrever o que li da vida de Genji.
O velho imperador pai de Genji decidiu tornar Fujitsubo a sua imperatriz (em detrimento de Kokidem, sua concubina de há anos, mãe do próximo herdeiro e filha do ministro da direita), mas passado pouco tempo faleceu.. Ora isso provocou imensas alterações na corte. O novo imperador, meio-irmão de Genji (e filho de Kokidem) deixou-se facilmente dominar pela sua família materna. Tornou o seu avó ( o ministro da direita) todo poderoso, em detrimento do ministro da esquerda (sogro de Genji). Ainda por cima Kokidem tinha um ressentimento pessoal contra Genji, que se recusara a casar com uma irmã sua, em favor da filha do ministro da esquerda. Genji e todos familiares membros e aliados do ministro da esquerda vão sendo progressivamente afastados dos seus cargos. Mas Genji dá o golpe final: teve um “caso” com uma irmã de Kokidem e foi apanha do na cama com ela. Ora a agravar a situação, essa irmã costumava ser “visitada” pelo novo imperador. Este ficou desgostoso e terminou a relação com ela: esta percebeu a asneira que cometera, pois se Genji era amável, ela nunca passaria com ele de mais uma das numerosas conquistas, enquanto que com o imperador, ela poderia quem sabe chegar a imperatriz… Agora com o escândalo, dificilmente conseguiria ter um marido decente. O ambiente na corte acabou por ficar insuportável, e Genji acabou por ser exilado (embora não de forma oficial), levando um pequeno número de companheiros. A facção do ministro da direita era totalmente vencedora. Fujutsubo morre. E é aí que Genji vê com quem pode contar. Várias pessoas propõem-se a partir para exílio com ele mas ele recusa: não tem recursos para sustenta-las, e precisa de olhos na corte. Tono seu rival/amigo, desafia a corte e vai visitá-lo; alguns escrevem-lhe mas outros fazem de conta que nada se passa. Curiosamente, um antigo governador que se tornou monge e é vizinho deGenji, vê a oportunidade de ouro: embora seja de baixa categoria (era “apenas” um governador residente na província e não um cortesão) quer apresentar a sua filha a Genji pois sabe que um dia a situação deste irá mudar e ela terá uma vida melhor e decerto que ficará grato a quem o apoiou nos maus dias. A rapariga era extraordinariamente tímida (dado o desnível de origem social), mas Genji lá a engravida (e adquire mais uma esposa).
Entretanto o ministro da direita morre, Kokidem e o imperador adoecem; este acha que é por ter exilado Genji e acaba por chama-lo de volta. Lentamente as coisas compõem-se. Quando o imperador abdica em favor do suposto meio-irmão (que na realidade era filho de Genji e que rapidamente é posto ao corrente de que este era o seu pai), as coisas mudam radicalmente. Genji torna o seu antigo sogro (o ministro da esquerda) chanceler (o governo prático do país), Tono é tornado ministro do centro, enquanto que ele trata de tudo o que é relacionado com a corte (cerimónias, nomeações, festas). Casa com Murasaki, a sua grande paixão (sobrinha de Fujutsubo, a sua outra grande paixão). E começa a época da retribuição. Não tanto contra a facção do ministro da direita (afinal eles apenas trataram de se governar), embora percam a maior parte dos cargos e poder, mas sobretudo contra os que lhe devendo favores, o ignoraram quando as coisas lhe correram mal. A começar por Hyobu, pai de Murasaki e irmão de Fujutsubo. De facto, estando tão próximo de Genji, ele “colou-se” à facção de Kokidem, contra a sua própria família. Ora tendo Hyobu uma outra filha que ele pretendia que fosse nomeada aia imperial, Genji veta essa nomeação em favor de uma filha de Tono; sem nunca lhe fazer má cara (afinal era o sogro), Genji paralisa-lhe qualquer hipótese de progressão. Com o tempo, Genji volta a ter uma certa rivalidade com Tono e a sua família, tudo dentro de limites muito estritos: hoje é um que ganha, amanhã é o outro (para escolha de concubinas e vitórias em concursos artísticos), pois uma divisão mais forte poderia ser aproveitada por outro clã.
Mas Genji também recompensa as mulheres que lhe foram fieis.
Uma princesa com quem ele tivera um romance tornara-se pobre (tão pobre, que o porteiro tinha de abrir a porta sozinho, não tendo ajudante); ele ajudou-a financeiramente. Outra ficou mesmo numa situação extrema (o nome dado em inglês é sawflower): sendo de sangue imperial, não podia casar com quem quer que fosse (nos velhos tempos, Genji tentara ter um relacionamento com ela, mas ao ver-lhe a cara desistiu (por ser feia), mas tendo pena, manteve-se amigo), mas ao morrer o pai, ficou sem fonte de rendimento. Não podia casar abaixo da sua condição, ninguém do seu estatuto queria casar com ela, e se fora fei em jovem, a idade não a favorecia. Foi sendo abandonada por criados e amigos até ficar sozinha no palácio em ruínas, tendo de procurar comida e apanhar lenha para sobreviver, esquecida pela corte e vivendo com a recordação da amizade que teve com Genji (que não passou disso). Só uma pessoa se lembrou dela: uma sobrinha, que fugira de casa quando a família começara na sua decadência para casar com um governador causando um escândalo sendo assim excluída dos círculos imperiais (o mesmo que sucedeu à sua tia, sem ter de passar fome). Ofereceu o cargo de governadora em sua casa, o que era uma humilhação para a tia que recusou. Por sorte, um dia Genji passou por lá (depois de voltar a brilhar na corte), e ao saber da história levou-a para o seu palácio, instalando-a numa das alas. Ela acaba por tratar dos assuntos da casa de Genji como governadora oficiosa) pois ele tem imensa confiança nela), mas de forma gradual e com tacto, para não chocar com Murasaki.
Genji acaba por encher o palácio de antigas amantes que caíram em dias difíceis (já não sendo jovens, sendo viúvas ou solteiras elas ficam em situação muito complicada); Murasaki tolera isto melhor do que as suas escapadelas actuais (tornando-se na realidade amiga de algumas delas). Mas no entanto, um novo romance irá complicar tudo.
Genji encontrou a filha de uma velha paixão (essa filha era de Tono mas morrera de desgosto do seu não romance com Genji). Apesar de criada na província, e ter 20 anos Genji enviou-a a sawflower para ser educada rapidamente nas maneiras da corte, pois pretendia adopta-la (ele só tinha uma filha e Tono tinha várias) e usa-la para um casamento que o favorecesse. Mas com o tempo começou a achar um desperdício entrega-la a outros e decide tornar-se seu amante. A rapariga fica destroçada: livrara-se de complicações na província, achava que finalmente a sua vida ia ter um rumo, quando é o seu próprio benfeitor que tenta aproveitar-se! E sabe que desta vez ninguém a poderá ajudar (se bem que conseguiu manter Genji à distância em 2 capítulos; verei depois como se safa).
Conclusões destes capítulos: os governadores das províncias, são senhores absolutos nas terras que governam, mas são humilhados e troçados pela corte como incultos; a escolha dos governadores é rotativa e dependente do patrocínio de cortesão a quem enviam presentes (mas dentro de um século eles conseguirão fixar-se nas terras e livrar-se da dependência da corte). As mulheres por mais bem nascidas que sejam, se não tiverem um pai, irmão ou marido que as mantenha, estarão numa situação verdadeiramente aflitiva se estiveram por sua conta.
Passado um momento de certa austeridade sobre o regime dos Fujiwara do ministro da direita, com os Fujiwara do ministro da esquerda, a vida volta ao que era: concursos de pintura, de poesia, declamação de versos (japoneses ou chineses), e muita música. A mulher que dá um filho a Genji, tem como principal dote saber usar o Koto (uma espécie de guitarra) de forma exímia; o mesmo com sawflower. Murasaki não tem qualquer capacidade especial mas é bonita. A nova imperatriz é escolhida num concurso de pintura, entre facções rivais. Outras amadas de Genji sabem bem escrever quer na forma (a caligrafia em si é uma arte para os japoneses), quer no conteúdo (as missivas nunca são feitas descrevendo algo directamente, mas sempre com recurso a poemas).