Voltei depois de uma ausência de 2 semanas de férias. Aproveitei para ler mas ainda não tive tempo de escrever nada de substancial. Fica só então uma pequena anedota: O Marechal Kesselring da força aérea alemã na segunda guerra mundial (notabilizou-se curiosamente no comando das forças alemãs terrestres em itália), estava a sobrevoar Túnis num velho biplano; a Flak (defesa anti-aérea alemã)fez confusão e tentou destrui-lo; quando ele pousou, deu uma descompostura à flak... por ter falhado um alvo tão fácil como o seu avião!
Já agora, no domingo fizemos um ano de existência. Toda a equipa do tempore agradece aos nossos leitores e sobretudo ao J do Cruzes, que sempre nos apoiou (literalmente foi ele que criou o blog do ponto de vista informático).
terça-feira, junho 29, 2004
terça-feira, junho 08, 2004
Tróia- I
Fui no sábado ao cinema ver o filme Tróia. Tinham-me avisado de que para gostar teria de esquecer o livro e ir sem preconceitos; ainda por cima cheguei 30 minutos atrasado (já só apanhei a viagem de Heitor e Paris). Deste modo, comparando o filme com outros épicos históricos recentes (gladiador), o filme faz boa figura (o filme foi consideravelmente mais curto para mim e não tive tempo de me aborrecer).
Não é histórico, nem o poderia ser, pois os acontecimentos reportam-se a uma mítica guerra do período micénico final (séc. XII a.c.), mas a sociedade que Homero descreve na Ilíada corresponde a uma amálgama de recordações dos séculos posteriores (sobretudo aquilo que é convencional chamar a “Idade das trevas grega” – séc. X a VIII a.c.. de uma sociedade dominada por heróis que rivalizam no campo de batalha para aumentarem a sua glória e fama individual. Como é complicado reproduzir na exactidão as indumentárias e cenários, fez-se uma mistura: os soldados são hoplitas, na recepção que Priámo faz aos filhos aparecem 2 popes; não é muito realista, mas também não é grave em si, dado que a Ilíada sendo um poema também não pretenderia ser realista nesses detalhes.
Passando à história em si, foi feita uma condensação dos acontecimentos (o poema em si, só tem mesmo a desavença de Aquiles com Aganémnon, o massacre dos gregos e o duelo final entre Aquiles e Heitor, com numerosas acções secundárias e intervenções de deuses), o que é normal, pois assim os espectadores ficam a perceber a história.
Tem acção, algumas cenas de batalha como é de esperar bem feitas embora nada de extraordinário (mas desde a cena inicial do soldado Ryan que é difícil fazer melhor), as reproduções em computador são habituais; os diálogos não são nada por aí além, mas também não se tornam ridículos. Fica-se com a ideia de que os diálogos servem para cortar o que seria um filme excessivamente monótono se fossem apenas batalhas (para mim, resultou, mas é uma opinião pessoal).
Quanto à representação das personagens (que foi o que deu mais controvérsia), a critica é bastante mais delicada: até que ponto a caracterização das personagens resulta da visão do realizador ou pelo contrário, da própria interpretação do próprio actor? Falando no caso mais óbvio: o Aquiles de Brad Pitt tem pouco a ver com o da Ilíada, funcionando mais como um mercenário implacável no momento da acção, apreciando poucas coisas (além de ter sido claramente inferior a Peter O’Toole no diálogo entre os dois), enquanto o da obra era sujeito a violentas paixões (e não só pelo Patróclo), preocupado com a sua glória e honra, mas bastante caprichoso. Heitor sempre foi um favorito das sociedades que se pretendem estáveis: alguém que cumpre o seu papel de forma obediente, luta e está disposto a morrer pela sua comunidade (claro que na Ilíada as coisas são um pouquinho diferente: ele vai combater contra Aquiles sabendo que vai morrer e deixar a sua comunidade, mulher e filho desamparados mas combate na mesma dado que a sua honra a tal o impele).
Os restantes personagens estão razoavelmente caracterizados (Páris, Menelau, Ulisses), mesmo que nem sempre muito fiel ao livro, não estando lá apenas para fazer número. O cinema épico actualmente adquiriu certos tiques de que não se livra: a morte de um herói, filmada lentamente (a flecha a atingir o calcanhar de Aquiles).
O filme é assim um bom entretenimento como filme ligeiro e se comparado com outros bem piores. Então qual é o problema? É que a Ilíada não é texto qualquer, é uma obra-prima e uma das obras fundadoras da literatura ocidental, e embora a realização e interpretação embora fossem razoáveis não passaram disso; daí a desilusão.
Não é histórico, nem o poderia ser, pois os acontecimentos reportam-se a uma mítica guerra do período micénico final (séc. XII a.c.), mas a sociedade que Homero descreve na Ilíada corresponde a uma amálgama de recordações dos séculos posteriores (sobretudo aquilo que é convencional chamar a “Idade das trevas grega” – séc. X a VIII a.c.. de uma sociedade dominada por heróis que rivalizam no campo de batalha para aumentarem a sua glória e fama individual. Como é complicado reproduzir na exactidão as indumentárias e cenários, fez-se uma mistura: os soldados são hoplitas, na recepção que Priámo faz aos filhos aparecem 2 popes; não é muito realista, mas também não é grave em si, dado que a Ilíada sendo um poema também não pretenderia ser realista nesses detalhes.
Passando à história em si, foi feita uma condensação dos acontecimentos (o poema em si, só tem mesmo a desavença de Aquiles com Aganémnon, o massacre dos gregos e o duelo final entre Aquiles e Heitor, com numerosas acções secundárias e intervenções de deuses), o que é normal, pois assim os espectadores ficam a perceber a história.
Tem acção, algumas cenas de batalha como é de esperar bem feitas embora nada de extraordinário (mas desde a cena inicial do soldado Ryan que é difícil fazer melhor), as reproduções em computador são habituais; os diálogos não são nada por aí além, mas também não se tornam ridículos. Fica-se com a ideia de que os diálogos servem para cortar o que seria um filme excessivamente monótono se fossem apenas batalhas (para mim, resultou, mas é uma opinião pessoal).
Quanto à representação das personagens (que foi o que deu mais controvérsia), a critica é bastante mais delicada: até que ponto a caracterização das personagens resulta da visão do realizador ou pelo contrário, da própria interpretação do próprio actor? Falando no caso mais óbvio: o Aquiles de Brad Pitt tem pouco a ver com o da Ilíada, funcionando mais como um mercenário implacável no momento da acção, apreciando poucas coisas (além de ter sido claramente inferior a Peter O’Toole no diálogo entre os dois), enquanto o da obra era sujeito a violentas paixões (e não só pelo Patróclo), preocupado com a sua glória e honra, mas bastante caprichoso. Heitor sempre foi um favorito das sociedades que se pretendem estáveis: alguém que cumpre o seu papel de forma obediente, luta e está disposto a morrer pela sua comunidade (claro que na Ilíada as coisas são um pouquinho diferente: ele vai combater contra Aquiles sabendo que vai morrer e deixar a sua comunidade, mulher e filho desamparados mas combate na mesma dado que a sua honra a tal o impele).
Os restantes personagens estão razoavelmente caracterizados (Páris, Menelau, Ulisses), mesmo que nem sempre muito fiel ao livro, não estando lá apenas para fazer número. O cinema épico actualmente adquiriu certos tiques de que não se livra: a morte de um herói, filmada lentamente (a flecha a atingir o calcanhar de Aquiles).
O filme é assim um bom entretenimento como filme ligeiro e se comparado com outros bem piores. Então qual é o problema? É que a Ilíada não é texto qualquer, é uma obra-prima e uma das obras fundadoras da literatura ocidental, e embora a realização e interpretação embora fossem razoáveis não passaram disso; daí a desilusão.
sexta-feira, junho 04, 2004
Suicídio
Algures na primeira metade do séc. XX, é pedido que um grupo de voluntários leve uma carga de explosivos até próximo de um bunquer inimigo e a faça detonar. Apresentam-se voluntários que são abatidos; novos voluntários desta vez conseguem fazê-lo, mas o inimigo apaga a mecha. Outro grupo de voluntários repete a tarefa e o mesmo sucede. O comandante dá uma ordem aos voluntários seguintes: eles terão de se certificar de que o inimigo não apague a mecha, ficando junto próximo a ela até explodir: basicamente, pede-lhes o suicídio; eles aceitam perfeitamente. A missão é levada em diante com sucesso.
Este episódio decorreu na guerra russo-japonesa de 1901, e os soldados eram claro, nipónicos. O oficial em situação normal deveria ser levado a tribunal marcial, pois não é aceitável a exigência de suicídio a soldados (situação apesar de tudo subtilmente diversa de ordens do género “corram para a trincheira inimiga com um ninho de metralhadoras”, ou “resistam às forças esmagadoras que vem na vossa direcção”, pois por vezes o imprevisto sucede), mas o caso foi abafado. Pior: os soldados foram apresentados como modelo de patriotismo e espírito marcial (busho), digno dos antigos samurais. O que é de espantar neste caso, é que eles eram de origem humilde (camponeses) e foram promovidos post-mortem, contando-se a sua história nas escolas para servir de exemplo às crianças, sendo-lhes mesmo erigidas estátuas. Aos poucos, os ideias que tinham sido apanágio de uma classe, foram sendo inculcados a toda a população, resultando em parte na tragédia que foi a participação japonesa na II guerra.
Este episódio decorreu na guerra russo-japonesa de 1901, e os soldados eram claro, nipónicos. O oficial em situação normal deveria ser levado a tribunal marcial, pois não é aceitável a exigência de suicídio a soldados (situação apesar de tudo subtilmente diversa de ordens do género “corram para a trincheira inimiga com um ninho de metralhadoras”, ou “resistam às forças esmagadoras que vem na vossa direcção”, pois por vezes o imprevisto sucede), mas o caso foi abafado. Pior: os soldados foram apresentados como modelo de patriotismo e espírito marcial (busho), digno dos antigos samurais. O que é de espantar neste caso, é que eles eram de origem humilde (camponeses) e foram promovidos post-mortem, contando-se a sua história nas escolas para servir de exemplo às crianças, sendo-lhes mesmo erigidas estátuas. Aos poucos, os ideias que tinham sido apanágio de uma classe, foram sendo inculcados a toda a população, resultando em parte na tragédia que foi a participação japonesa na II guerra.
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